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Rio tem mutirão contra dívidas

Procon Carioca reúne 30 empresas para negociar dívidas; telefonia e bancos são os mais procurados

Marcos Tristão -
A presença de concessionárias, como Light, Cedae e Ceg, é novidade
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O alto grau de endividamento dos brasileiros foi uma das pautas centrais da última eleição presidencial. Com 62,89 milhões, ou 44% da população em idade ativa, com o nome sujo na praça e nenhuma solução estrutural no horizonte do novo governo, a saída é recorrer à defesa do consumidor e acompanhar feirões de negociação de dívidas, como o organizado todos os anos no Rio de Janeiro pelo Procon Carioca. O evento, que acontece no Bangu Shopping, Zona Oeste da cidade, reúne 30 grandes empresas e espera solucionar mais de 2 mil débitos. Nos dois primeiros dias, houve 1.634 atendimentos.

As empresas mais procuradas pelos devedores são as de telefonia e os bancos. Além destas, estão no evento o varejo de eletrodomésticos e concessionárias de serviços públicos. A presença das últimas são novidade no mutirão deste ano, que traz representantes da Light, Cedae e Ceg. Logo no primeiro dia de atendimentos, uma das maiores renegociações envolveu a distribuidora de água e saneamento básico da cidade.

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A presença de concessionárias, como Light, Cedae e Ceg, é novidade (Foto: Marcos Tristão)

A assistente administrativa Jane Guedes (58) tinha uma dívida de R$ 52 mil reais, relativa à 19 anos de contas d’ água de um antigo casarão no Cachambi, que herdou dos pais. Finalmente, Jane pagará R$ 5 mil em 60 parcelas a serem integradas à nova conta da casa, que terá a medição por pena d’água substituída por um hidrômetro. “Já tinha tentado resolver no ano passado, quando o mutirão foi no Centro, mas a fila estava muito grande e acabei desistindo. Desta vez, vim bem cedinho e fui a senha nº 5. Foi o melhor para as duas partes, porque assim consigo pagar e a empresa recebe parte da conta abandonada”, diz satisfeita.

Mas nem toda negociação tem final feliz. O taxista André Rodrigues (34) tentava resolver um débito de apenas R$ 651 no estande da operadora de telefonia Oi. Os dois atendentes da empresa, entretanto, atuavam como meros intermediários, acionando uma central de atendimento por celular para verificar caso a caso. André, que mora em Cavalcanti, na Zona Norte, terá de esperar que a operadora entre em contato em até cinco dias úteis, quando receberá uma espécie de “carta desconto” para ser paga à vista ou um parcelamento do valor integral. “Esperava sair daqui com isso resolvido. Eles podiam ter um computador para tentar solucionar tudo aqui de uma vez”, reclamou.

“O único jeito de resolver uma dívida, é pagar. Aqui tentamos reunir as melhores condições”, resume o presidente do Procon Carioca, Jorge Braz. “A dívida em si costuma ser uma pequena parte do débito que, na verdade, cresce com a rolagem dos juros, muitas vezes absurdos. Na prática, o que acontece neste tipo de evento é o cancelamento dessa rolagem”, explica. Embora ajude, opina, o evento não resolve o problema porque age na consequência e não na causa. “Muito tem melhorado, mas ainda é pouco. Hoje, o cancelamento do cartão de crédito é uma regra se o pagamento não vem em 30 dias. Isso ajuda, mas não resolve. Precisamos de educação financeira, uma disciplina no ensino básico para que os jovens não caiam em armadilhas desde cedo”, diz.

Uma das armadilhas é, justamente, o cheque especial ou as taxas abusivas de operadoras de crédito. No evento, três instituições financeiras abriram estandes: Caixa, Santander e Crefisa. A última tem a segunda maior taxa de juros para crédito não-consignado: 824,38% ao ano. O músico Luiz Marcelo Ferreira (26) tropeçou nos juros altos. Junto a um grupo de amigos, resolveu montar uma revendedora de cestas básicas e, para tanto, pegou R$ 6 mil no Itaú. Após perder a carteira assinada, as parcelas de R$ 350 começaram a atrasar. Foi uma bola de neve. “Cheguei a receber cartas de cobrança no valor de R$ 38 mil, mas, ao perceberem que eu não pagaria, passaram a pedir bem menos. Agora estou aqui para resolver isso e limpar meu nome”, explicou. Aprovado para a Polícia Militar, ele tem de sair do SPC até 14 de dezembro em função do processo de investigação social do concurso. Como a dívida foi assumida por outra empresa (SP Work), que não integra o mutirão, o Procon ajuda no contato e busca uma solução dentro de 30 dias. Segundo a autarquia, a taxa de resolução de débitos com as empresas presentes no evento chega a 90%, contra 75% para as de fora.

Antes de tentar a negociação, é importante saber se este é o melhor caminho. “Muitas vezes o consumidor não conhece seus direitos, muitas vezes a dívida está prescrita. Para telefonia, por exemplo, após cinco anos a empresa perde o direito de cobrar uma dívida ou colocar o nome do cliente em cadastros restritivos de crédito (Serasa, SPC)”, explica Fabiane Nascimento, advogada do Proteste. Junto a um representante da OAB-RJ, ela verifica a validade das negociações e orienta os consumidores em casos de litígio.

Este ano, o Procon espera resolver cerca de 3 mil casos. Na edição de 2017, o mutirão terminou com um total de 1.930 atendimentos em três dias de trabalho. Para o atendimento que acontece até amanhã, de 10h às 16h, é necessário levar documento de identidade e CPF, além do contrato ou comprovante da dívida.