Daniel Schenker*, Jornal do Brasil
JOINVILLE - É curto o espaço que separa a delicadeza das sapatilhas da batida contundente do hip hop na 27ª edição do Festival de Dança de Joinville. No Centrevento Cau Hansen, os espectadores acompanham 228 coreografias, muitas filiadas ao rigor do balé clássico, e batem com os pés no chão a cada apresentação contagiante. Bem perto dali, no ginásio do Colégio Estadual Germano Timm, o chamado Encontro das Ruas reúne um público igualmente fervoroso que assiste às eletrizantes batalhas de MC's, praticadas, na maior parte das vezes, por jovens entre 16 e 24 anos.
No Centreventos Cau Hansen, a competição segue acirrada. Entre os 28 grupos programados para a noite do último sábado, diversos contagiaram a plateia. Um dos destaques foi a Cia. do Conservatório Brasileiro de Dança, do Rio de Janeiro, que tirou o primeiro lugar na categoria Balé Clássico/Estágio Avançado. Mas, apesar de filiado à gramática do balé, o grupo apresentou coreografia intitulada Sturm und drang, que significa Tempestade e ímpeto, expressão-símbolo da fase inicial do romantismo alemão, movimento em vigor ao longo do século 18, calcado na celebração do gênio criativo em detrimento das rígidas regras que ditavam a escrita no período do classicismo francês.
A parte superior do figurino dos bailarinos remete à época original, enquanto que a de baixo é influenciada pelo contemporâneo. Buscamos este mesmo contraponto na coreografia assinala Jorge Texeira, diretor do grupo.
Fundada há três anos, a companhia carioca vem conquistando vitórias consecutivas no Festival de Joinville nas categorias Balé Clássico Avançado e Balé Clássico de Repertório. Este ano também foram contemplados com o primeiro lugar na noite da última quinta-feira com La bayadere.
Não por acaso, não faltam compromissos na agenda. Em agosto, a Cia. Brasileira de Balé, que surgiu dentro da Cia. do Conservatório Brasileiro de Dança, mostrará Giselle, no Teatro João Caetano, em parceria com Thiago Soares, primeiro bailarino do Royal Ballet de Londres. Em setembro, farão espetáculo com o pianista Vitor Araujo no Teatro Carlos Gomes. Na esfera internacional, os convites se intensificam. Basta dizer que vão apresentar O quebra-nozes em dezembro, em Santiago do Chile, e representar o Brasil no Fórum de Dança de Mônaco e em Paris, a partir de janeiro de 2010.
O rigor clássico contrasta com a evoluções dos b-boys e dos MCs no Encontro das Ruas. A improvisação é um dos pilares da competição, que, em Joinville, foi avaliada por um júri composto por três legítimos representantes do hip hop Ken Swift, Buddha Stretch e Suga Pop e contou com a inclusão de um novo estilo, o house dance, marcado por movimentos rápidos e complexos dos pés.
Imagina ter apenas 40 segundos para improvisar. Não adianta ensaiar em casa. As baladas devem vir na sua boca na hora sublinha Kleber Gomes, que competiu com a alcunha de MC Criolo Doido. Mas nessa rinha ninguém perde, todo mundo ganha.
O valor social e comunitário da experiência é fundamental.
A molecada se sente especial. Muitos se descobrem aqui anuncia Cassiano Sena (DJ Dan Dan), morador de Diadema (SP), há 20 anos no hip hop e um dos encarregados de fazer a discotecagem de competições de MC's.
Kleber Gomes ressalta:
Todos nós temos necessidade de participar de um grupo. O importante é ser verdadeiro. E não se trata só da sua energia. Há 300 pessoas que jogam a energia delas para o meio da roda observa.
Kleber é um dos integrantes da comissão técnica do evento, ao lado de Frank Ejara, fundador da Cia. Discípulos do Ritmo, Andrew Iceman, vencedor da primeira Batalha de B-boys do Balneário Camboriú, Trampo, um dos grafiteiros mais respeitados do Brasil, e Tiago Super Star, primeiro lugar na batalha brasileira individual, realizada em Curitiba, em 2007. Junto com Cassiano Sena, Kleber criou um projeto de rinha de MC's, que acontece toda sexta, no Centro de São Paulo, com batalhas, shows e exposições de grafite.
Há batalhas de conhecimento a partir de temas que são lançados (por exemplo, direitos humanos); Outras impõem como regra principal a não-utilização de certas palavras (como o termo pode crer ). Em geral, os participantes têm de 30 a 40 segundos para improvisar explica Cassiano.
* Daniel Schenker viajou a convite do Festival de Dança de Joinville