Macksen Luiz, JB Online
RIO - A Cia dos Atores, uma das poucas permanentes do Rio, comemora 20 anos com uma série de montagens dirigidas, a maior parte delas, pelos próprios atores. Numa seqüência de espetáculos, que se apresenta até dezembro, em salas do Espaço Sesc, os componentes desse inquieto grupo, capitaneado colaborativamente por Enrique Diaz, dirigem projetos pessoais , numa continuidade celebrativa de seu trabalho coletivo , em troca temporária de funções, definida como Auto-peças .
Esta semana podem ser assistidas Talvez, roteiro e atuação de Álamo Facó e direção de César Augusto, e Os vermes, adaptação do livro homônimo de Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta e direção de Marcelo Valle.
No monólogo de Facó, um homem se enclausura em seu apartamento à espera da volta improvável da mulher e, em processo crescente, vai aprofundando a sua distância do exterior, tendo o computador como o único e tênue elo com o mundo. O advérbio do título condiciona a certeza de uma constatação, que se apresenta como progressivo despregamento da realidade. Em encenação geométrica, em que os movimentos do ator se coordenam por projeções e imagens digitais, esse sufocamento existencial se mostra como asfixia definitiva.
O diretor conduz a montagem com simplicidade de meios e desenho bem demarcado, num traço fino que determina a ação, externa e interior. Álamo Facó assume a crescente dissociação do personagem numa mesma freqüência interpretativa, sem dramatismos ou tiques melodramáticos, dimensionando, assim, melhor as oscilações de sua angústia.
Já em Os vermes, o diretor Marcelo Valle demonstra identidade com o estilo dominante nas montagens da Cia dos Atores. Talvez essa tenha sido a melhor maneira de abordar o romance de origem, com seu paralelismo e metáforas, duplicação de personagens, imagens de opostos e atribuição de significados que se desmentem a cada situação. Nada fácil adaptar ao palco essa crítica a certa prática política e seu contraponto narrativo com a fisiologia intestinal.
A versão de Walter Daguerre e do diretor Marcelo Valle fragmenta o material inspirador, evidenciando o metafórico e conotando o paralelismo. Na agilidade e busca de ritmo que não deixe cair a atenção da platéia, o diretor revela maior empenho em valorizar as possibilidades do romance, bem maiores do que, verdadeiramente, possui. Nessa construção de carnavalesca anarquia, o elenco se distribui por esse ritual, superficialmente irreverente e explícito como demonstrativo.