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Crítica - O peso do passado: Um thriller nu, cru e guiado pela dor

Divulgação -
Nicole Kidman desconstrói seu arquétipo de beldade
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Exibido na seleção competitiva do BFI London Film Festival, em outubro, onde roubou o fôlego de uma plateia com dezenas de críticas, “O peso do passado” se impõe na tela numa amarga mistura de melancolia, adrenalina e a autodesconstrução de uma estrela em estado de graça, Nicole Kidman. Sua potência vem do domínio pleno de sua diretora, a nipo-americana Karyn Kiyoko Kusama (de “Aeon Flux”), sobre a cartilha das narrativas policiais, com brilho especial nas lições físicas (perseguições, tiroteios, prenúncio de violência). Há em sua obra uma tensão contínua em torno das viradas de roteiro, um nervosismo nas movimentações de câmera, um desdém com as sutilezas – é cinema do pathos, da brutalidade. Seus filmes têm algo de Don Siegel (realizador de “Madigan – Os impiedosos” e “Perseguidor implacável”) em seu ethos de aspereza absoluta. Revelada na seara indie há 19 anos, com o cult “Boa de briga”, Karyn se especializou em narrativas de ação com personagens femininas que carregam feridas afetivas.

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Nicole Kidman desconstrói seu arquétipo de beldade (Foto: Divulgação)

O afeto é o combustível de “Destroyer”, título original deste thriller orçado em US$ 9 milhões, narrado em dois tempos paralelos, que acompanhamos de modo consecutivo: fica a memória de um lado, gloriosa; fica o presente, devastado do outro. Nicole caminha entre eles no papel da detetive Erin Bell. Seu pretérito era perfeito: no auge da forma física e do desejo, ela se infiltra numa gangue de criminosas. Seus dias atuais são de ressaca: alcoólatra, incapaz de lidar com a filha adolescente, ela carrega correntes de um erro cometido há cerca de 16 anos. Um erro com perfume de amor, a única força capaz de desafiar seu senso de dever nesta trama fotografada com uma luz sem saturações, crua, como se fazia nos bons policiais dos EUA dos anos 1970... como Siegel fazia. 

Bom - ***

* Especial para o JB