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São demais os perigos dessa vida: confira crítica da peça 'Com amor, Vinícius'

Divulgação -
Textos deixados pelo Poetinha estão muito bem entrelaçados no espetáculo "Com amor, Vinicius"
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Ninguém cantou o amor como Vinicius de Moraes, o poeta que se definia como um arauto da beleza, mas apaixonado, e muito, nosso artista foi pelo Brasil. Por suas comidas, costumes, suas mulheres. E produziu uma obra fértil de poemas, canções e crônicas sobre a realidade política brasileira. São esses textos críticos, contundentes que estão muito bem entrelaçados em “Com amor, Vinicius”, em cartaz no Teatro Laura Alvim.

Escrito por Hugo Sukman e Marcos França, traz o ator Marcos França como o poeta, dividindo a cena com a cantora Luiza Borges e o excelente violonista André Siqueira, também diretor musical da montagem. A direção eficiente de Ana Paula Abreu leva Marcos a compor o jeito do Vinicius, sem recorrer ao recurso fácil do usual mimetismo.

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Textos deixados pelo Poetinha estão muito bem entrelaçados no espetáculo "Com amor, Vinicius" (Foto: Divulgação)

Os musicais biográficos vêm pecando por não conseguir compor o personagem, pela seleção de episódios. O acerto aqui é que se vai além do caricato, daquilo que se tem no imaginário da imagem do poeta. Um Vinicius plural, com ênfase na sua luta política, jamais de faca dos dentes. A poesia, as músicas, as parcerias vão moldando um homem corajoso, totalmente antenado no seu tempo. Sem a cronologia histórica, os episódios se encadeiam para mostrar de que forma Vinicius é de uma personalidade grandiosa.

O roteiro não é de mais um dos musicais biográficos. É, na verdade, uma oportuníssima chance de rever canções, mas, sobretudo, reencontrar Vinicius com o chapéu do protesto político. O recorte privilegia o período que vai de 1964 até 1973, com um bem armado quebra cabeça, no qual, para provocar a reflexão sobre a atualidade do que se vê e ouve, tudo está na medida equilibrada.

Ao lado das lindas canções, as vozes e os instrumentos alcançam o tom maior que o talento do homenageado exige. Eliminou-se do cenário o boteco, a banheira, o coqueiro. E as mulheres estão ausentes como coadjuvantes. O excesso de romantismo, os poemas, que aparentemente imortalizaram o poeta não compõem a força motriz do espetáculo. O copo na mão, a bata, os colares compõem o traço importante para se alcançar o significado: a revolução está na construção diária.

A escolha, tanto das músicas como dos escritos, trazem-nos um Vinicius que está ali, saído do palco, alguém que encontramos na rua, na fila do banco, no botequim, que, de forma doce mas firme, vai apresentando as angústias não apenas do coração mas também da mente, que se vê cerceada pela repressão da ditadura. Essa proximidade recriada do poeta/personagem, do que nos deixou como legado, é a força do amor que Vinicius soube tão bem cantar.

* Professora do Depto de Comunicação da PUC-Rio e doutora em Letras

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SERVIÇO

COM AMOR, VINICIUS

Casa de Cultura Laura Alvim (Av. Vieira Souto, 176, Ipanema. Tel: 2332-2016)

Sex. e sáb, às 20h, e dom., às 19h

Ingressos: R$ 50

Capacidade: 186 lugares

Duração: 80 minutos.