Com atmosfera “mais dramática” e 200 sapatos velhos formando um cenário minimalista como a música que inspira o espetáculo, o compositor americano Steve Reich ainda serve tão bem como inspiração à Focus Cia. de Dança, que empresta seu próprio nome à apresentação em que o grupo comemora 18 anos de vida.
Composições do nova-iorquino de 82 anos, considerado um dos mais importantes da música minimalista do século 20, calçam todas as quatro peças apresentadas pela companhia, duas delas construídas neste ano: “Keta”, apresentada inicialmente em agosto, no festival “Dança em trânsito”, e “Wooden steps”, que estreou nesta temporada em cartaz até o dia 16, no Teatro Cacilda Becker – hoje, a sessão é às 20h. No programa quádruplo “Still Reich”, a Focus ainda resgata “Pathways” (2008), “Trilhas” (2010).
Curiosamente, “Pathways”, que a companhia estreou há uma década em Stuttgart, na Alemanha, foi feita sobre uma composição para instrumentos de percussão de madeira, “Music for pieces of wood”.
Já “Trilhas” – extrato do espetáculo “Ímpar” – explora a tensão de “Different trains - After the war”, composta por Reich em 1989 para o quarteto de cordas Kronos Quartet.
Com três indicações ao Prêmio Cesgranrio de Dança, “Keta” se baseia no 1º movimento de “Drumming”, mais uma música para percussão, composta por Reich em uma viagem a Gana, na África. Pela peça, que significa “terreiro”, em iorubá, concorrem ao prêmio Marcio Jahú (Melhor bailarino), Carolina de Sá (melhor bailarino) e o diretor da Focus, Alex Neoral (melhor coreografia).
Sem madeiras, mas com sapatos, Neoral apresenta “Wooden steps” como um novo conceito, embora ainda na música de Reich, de acordo com a composição. Na contramão das batidas fortes que marcavam “Pathways” e “Keta”, ela se baseia na etérea “Proverb”, composta em 1995 para cinco vozes (duas sopranos e dois tenores), dois órgãos elétricos e dois vibrafones.
Neoral ressalta a diferença na forma de coreografar uma composição tão leve, cujo andamento – lento, em seus 14 minutos – atrai a atenção para os detalhes em cena, ao contrário da velocidade sugerida pelas trilhas anteriores.
“Eu diria que essa é a peça mais dramática – e menos vigorosa – e tem algo mais poético e dramático. Sempre faço minha pesquisa a partir do som e da fisicalidade do movimento, não a partir do assunto. Essa, por acaso, já tem um subtexto anterior”, explica o coreógrafo, referindo-se ao provérbio constantemente repetido pelos cantores – “How small a thought it takes to fill a whole life!” (“Quão pequeno um pensamento leva para preencher uma vida inteira!”).
Com sete dançarinos (quatro homens e três mulheres) em cena, “Wooden steps” retrata, segundo ele, “pessoas quase nômades, com os sapatos no caminho. Por isso, os elementos cênicos com quase 200 sapatos velhos, como metáfora da vida. Cada um deles diz muito da história de cada pessoa, a leva para lugares diferentes, envelhece junto com seu dono, mas acaba sendo jogado fora. É um paralelo do ser humano, que também envelhece. E somos jogados fora, também, quando nosso tempo acaba”, compara.
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SERVIÇO
STILL REICH – FOCUS CIA. DE DANÇA
Teatro Cacilda Becker (R. do Catete, 338 - Largo do Machado; Tel.: 2265-9933). De quinta a sábado, às 20h. Domingo, às 18h. Até 16/12. Entrada: 40 / R$ 20 (Pagamento somente em dinheiro. Bilheteria aberta de quarta a domingo, das 14h às 20h30). Duração: 65 minutos.