Para Rodrigo Fonseca: Espetáculo de sutilezas
Antes de ser um ganhador de Oscar (por “12 anos de escravidão”), Steven Rodney McQueen ganhou a notoriedade da mídia na Inglaterra, sua pátria, por experimentos de artes visuais em que o corpo era objeto de análise, na fricção de peles, na relação com a natureza, como se viu em “Bear” (1993) e “Deadpan” (1997) – ambos no Youtube hoje. O interesse pela estetização da fisiologia se estendeu a seus trabalhos como cineasta, em “Hunger” (2008) e no magnético “Shame” (2011). Mas o chamado político, ligado à indignação racial abriu uma nova porta para este artesão da imagem, engajando-o em narrativas mais contidas, formalmente, mas de tom piqueteiro. Eis que o romance “Widows”, da também inglesa Lynda La Plante, decalcado de uma minissérie escrita pela mesma (“As damas de ouro”, de 1983), caiu nas mãos de McQueen para conciliar seu olhar mais politizado sobre dilemas sociais com sua artesania narrativa nada interessada em convenções. Do livro, nasceu uma produção (eletrizante) de US$ 42 milhões, de peito aberto para a lógica do “cinema espetáculo”, arrancando o que a cartilha do thriller tem de mais inusitado. Tudo se resumiria ao plot “quatro mulheres e um assalto”: e ele está lá, em uma execução tecnicamente irreparável, com cenas de ação febris, uma aspirante a criminosa em destaque (a cabelereira e motorista Belle, vivida pela brilhante Cynthia Erivo) e um vilão memorável: Jatemme (Daniel Kaluuya, de “Corra!”). Mas um plot bom nas mãos de artistas inquietos como McQueen viram algo mais: o cineasta fragmenta a narrativa em múltiplas metonímias (a parte pelo todo, ou seja, um fragmento de cena sintetiza uma situação), dá torcidas na moral aparente de seus personagens e aposta em viradas bruscas, salpicando críticas ao racismo e à violência contra a mulher com sutileza. E Viola Davis (como viúva que bola um crime) faz o pênalti decisivo contra a obviedade, que perde de lavada pra McQueen.
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As viúvas: **** (Muito Bom)
Cotações: o Péssimo; * Ruim; ** Regular; *** Bom; **** Muito Bom
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Para Frank Carbone: E a estrutura ruiu...
Steve McQueen não precisaria provar nada na América do Norte, porque sua filmografia britânica já era exemplar, ainda assim ele conseguiu conquistar bem mais do que os americanos com “12 Anos de escravidão”. Era de se imaginar que o cineasta quisesse relaxar e, cinco anos depois, ele aparece com adaptação cinematográfica de uma série da sua Inglaterra sobre um grupo de mulheres cujos maridos criminosos mortos durante um golpe resolve executar seu último assalto, já esquematizado. Ou seja, McQueen queria se divertir.
Talvez de fato a exigência pela densidade de seu currículo tenha criado uma expectativa indevida, para além do escapismo. Mas independente do que se esperava, o longa deixa a desejar com o manancial de tipos e personagens que apresenta ao longo de sua duração. São tramas, subtramas e desenhos demais para uma produção só, e o desenvolvimento do roteiro não consegue dar conta de tantos arcos quanto deveria, terminando com uma boa parte deles enfraquecidos e rasos.
Tecnicamente, a montagem impressiona e, no gigantesco elenco, chamam a atenção Elizabeth Debicki, Bryan Tyree Henry, o veterano Robert Duvall e o casal protagonista Viola Davis e Liam Neeson, ela transmitindo a dor da perda e ele como o homem que foi um marido perfeito. Com cenas bem escritas e interpretadas, mas com alguns personagens sem base de sustentação e um igual excesso de temas, “Viúvas” talvez sobressaísse se fosse ainda mais simples e ligeiro. Da forma encorpada que tenta ter, conseguimos infelizmente sentir sua estrutura ruir.
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As viúvas: ** (Regular)
Cotações: o Péssimo; * Ruim; ** Regular; *** Bom; **** Muito Bom
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