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Escultora compõe ambiente residencial para antepassados em galeria na Gamboa

Marco Antonio Teobaldo/Divulgação -
Angela Câmara Correa revê antepassados com instalações que vão de casas de caules de rosas a trabalho sobre fotos
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Com caules de 1.200 rosas, Angela Câmara Correa “construiu” 50 casas para seus antepassados e decorou a sala para eles receberem as visitas, que também participam da recomposição do ambiente na exposição até 1º de dezembro em cartaz na Galeria Pretos Novos de Arte Contemporânea, na Gamboa.

Aberta amanhã ao público, “Moradas” reúne instalações com as quais a artista plástica emula um espaço residencial para a memória dos escravos enterrados nos séculos 18 e 19 no Cemitério dos Pretos Novos.

Instalado em 1769 na Zona Portuária, o cemitério de escravos funcionou até 1830, sendo posteriormente tomado por construções e tendo sua localização esquecida. Só em 1996, moradores da Rua Pedro Ernesto descobriram suas ruínas durante uma reforma em sua residência, onde hoje funciona o IPN (Instituto dos Pretos Novos), que mantém a galeria e prossegue com os trabalhos de arqueologia – no ano passado, foi descoberto o primeiro esqueleto inteiro e articulado do sepulcrário.

Macaque in the trees
A artista explica como posicionou as moradas a escultura de seu rosto (Foto: João Pequeno)

“Quando visitei o IPN, há dois anos, tive uma sensação forte, por antepassados estarem ali, sob os meus pés”, recorda a artista paulistana, que há 20 anos vive na Alemanha – o chão da galeria tem uma parte de piso transparente, onde se vê parte das ruínas.

Ao lado dessa janela para o subsolo, Angela colocou uma das instalações. Feita a partir da modelagem de sua cabeça, “Sopro” é uma escultura em gesso do rosto de Angela enterrada em uma pilha de sal grosso disposto no chão da galeria.

O rosto esculpido olha para as “Moradas”, parte delas coladas na parede e outras penduradas à parede por fios de nylon, “fornecendo casas para eles morarem”.

Combinado culturas intercontinentais, “Toalha de viagem” é a primeira obra interativa da galeria, aberta em 2005. Concebida a partir de uma tradição da família alemã de Angela, ela foi posicionada no centro da sala de exposição, com novelos de linha vermelha e um conjunto de agulhas. Essas peças são oferecidas aos visitantes, convidados a bordarem a toalha com as inscrições que desejem deixar de recado. “Tomei como hábito. Sempre viajo com uma toalha, linha e agulhas. Se vou à sua casa, te convido a bordar sua mensagem no pano; quis reproduzir essa experiência aqui”, explica.

A partir da pergunta “O que nos une?”, mais de 500 convidados pela artista já responderam individualmente com bordados, motivo pelo qual a toalha já chegou com escritos – boa parte, em alemão.

Nas paredes ao lado, a ancestralidade mais próxima é integrada à linha do tempo com uma curta, mas bela, série de fotografias sobrepostas que incluem as três últimas gerações de mulheres – avó, mãe e ela mesma – e imagens do casal de avós maternos cobertas por um papel transparente, com impressões de sombras de flores e folhas.

No fundo da sala, “Ser em ser” faz outra homenagem à família, com o pequeno vestido de batizado de Angela em frente ao longo vestido de noiva de sua avó.

“Além do acervo arqueológico fixo, cuidamos de promover mostras temporárias que tenham relação com o Cemitério dos Pretos Novos”, aponta Marco Antonio Teobaldo, curador do exposição “Moradas” e do instituto em si. “Desta forma, atraímos o público para que ele volte, em vez de vir uma vez só. Visitantes que retornam contam que acabam até descobrindo novas informações da exposição permanente as quais não haviam notado antes”, ressalta Teobaldo.

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Serviço

MORADAS

Galeria dos Pretos Novos. Rua Pedro Ernesto, 32 - Gamboa, Zona Portuária. Acesso pelas estações Utopia (sentido Rodoviária) e Harmonia (sentido Santos Dumont) do VLT, linha 1. Tel.: 2516-7089. Terça a sexta, de 13h a 19h; sábado, de 10h a 14h. Até 1/12. Entrada gratuita.