Certa vez, numa entrevista com o genial economista Mário Henrique Simonsen, ministro da Fazenda do governo Geisel (1974-1979), um jovem jornalista não se conteve e disse: “Ministro, a economia é uma ciência (sic) fascinante. O que estraga são os números”. Sem alternativa, o professor Simonsen - que não fugia às conversas com os jornalistas de economia de sua época, pelo simples prazer do convencer o interlocutor no debate das ideias – riu, encabulado.
Este jovem repórter tinha apenas 25 anos. Hoje, com 70 anos, já vi muita maquiagem em economia. Que não passa de uma ciência mais ou menos exata. Com margens de erro maiores que as das pesquisas eleitorais. Basta fazer uma compilação do que economistas, ministros e instituições financeiras projetam para o desempenho da economia no começo do ano e o que acontece ao final do exercício.
Desde os anos de chumbo os releases eram pródigos em vender pílulas cor de rosa. Sempre destacavam o lado positivo. Como sempre há o “outro lado da moeda”, tema que adotei para esta coluna de economia na volta do JB às bancas, quando era pilotada pelo brilhante economista Renê Garcia Jr, hoje secretário de Fazenda do Paraná, de onde veio o novo 4º ministro da Educação de Jair Bolsonaro, Renato Feder, tratava de examinar as tabelas e dados para transmitir aos leitores uma versão mais verdadeira da realidade.
Não estava sozinho nessa cruzada. Há toda uma geração de jornalistas de economia que teve de se virar nos 30 nessa época, em que não se podia anotar ou gravar as declarações de autoridades que interessavam. Todos preferiam o “off”, não comprometedor e que podiam ser desmentidas por eles mesmo em “on”, depois (cansei de publicar informações em “off” no Informe Econômico do velho JORNAL DO BRASIL ou no Panorama Econômico de O Globo, hoje com Miriam Leitão à frente) que eram desmentidas na maior cara de pau pelo autor em entrevistas no dia seguinte nos microfones das TVs. Por isso, quando davam declarações em “on” eram cheias de platitudes que não podiam ser desmentidas, mas também só informavam parcialmente.
Estou fazendo todo esse preâmbulo para discutir a euforia que tomou conta da economia com o crescimento de 7% na produção industrial em maio frente ao mês anterior, após dois meses de contração (-9,2% em março e -18,8% em abril). Algumas autoridades, sentindo que o fundo do poço foi atingido em abril, porque a partir de maio muitas atividades foram sendo retomadas lentamente, apesar das ameaças latentes de recrudescimento do Covid-19 com a reabertura prematura (como ocorre nos Estados Unidos), afirmaram que se inicia uma recuperação em V. Acho prematuro garantir isso, e explico porque.
Em economia a base de comparação pode levar a conclusões enganosas. Qual a base de comparação para se assegurar que a retração vai ser abrupta e seguida de rápida recuperação. Isso aconteceu na greve dos caminhoneiros (maio e junho de 2018). Era um episódio passageiro. Foi superado, mas a paralisação de muitas atividades afetou o crescimento de 3018 (1,3%).
O IBGE adotou um estranho critério de medição da crise, que engana muita gente. As estatísticas tomam por base 100 o próprio ano de 2020. Um A.C. (antes Covid-19) e um D.C. (depois do Covid-19). Mas isso não dá para configurar uma recuperação em V e pode mascarar uma recuperação em L.
O Departamento Econômico do Itaú usa a mesma estatística que fui buscar no site do IBGE: as matrizes dos diversos setores industriais tendo como base 100 o ano de 2012. E aí se compreende que temos uma longa escalada para que o V se configure. O gráfico abaixo ajuda a perceber isso, mas vou dar números.
Em dezembro de 2019 a produção industrial do país, estava em 86,1 pontos. Ou seja, 13,9% abaixo do nível de 2012. Em março, caiu para 79,7 pontos e em abril desceu ao vértice (ou fundo do poço) do V (ou L) para 64,7 pontos do que era em 2012 (queda de 35,3%). Em maio, com a recuperação de 7% (sobre abril) escalou para 69,2 pontos. Pode ser uma promissora recuperação, mas ainda precisa escalar muito, pois está 30,8% abaixo de 2012 e 19,6% abaixo de dezembro de 2019.
O maior desafio está para as montadoras de automóveis, caminhões, ônibus e tratores e máquinas agrícolas. Em abril o nível de produção estava 93,7% abaixo do patamar de 2012. Houve uma recuperação de 21,7% em maio, mas o nível ainda está abaixo 78,3% frente a 2012 e 70,8% abaixo do patamar de produção de dezembro de 2019.
Ou seja, para voltar a subir ao topo e configurar um V o setor mais atingido da economia (mas que tem enorme efeito multiplicador na gigantesca cadeia de fornecedores (siderurgia e metalurgia, borracha, plásticos, couro, autopeças, produtos eletrônicos, vidros, tintas, material elétrico, petroquímica, entre outros) vai ter de subir uma forte rampa em 1ª marcha. No caso das transmissões automáticas, também terá de pisar no acelerador para voltar ao topo.
E será praticamente impossível voltar ao outro lado do V de dezembro de 2019, porque a demanda do mercado interno vai demorar a recuperar metade do tônus e as perspectivas das exportações da indústria são as mais sombrias possíveis, pois a clientela da América Latina (Argentina, Chile, México, Paraguai, Peru e Colômbia) anda tão combalida quanto nós. O mais sensato, é esperar um v, mas fácil de ser escalado em 2ª ou 3ª marcha.
Diretor do BC não entende “volatilidade cambial”
O diretor de Política Econômica do Banco Central, Fabio Kanczuk, disse 6ª feira que o BC está tentando identificar a causa do aumento elevado da volatilidade do câmbio e se ela é eficiente ou não, reconhecendo que esse movimento destoa do nível de volatilidade visto em outros países emergentes.
“Infelizmente eu não tenho muito a adicionar. Só posso dizer que a gente está super de olho nisso aí tentando entender”, afirmou ele, em “live” promovida pelo Banco Safra. “É necessário entender exatamente o problema para daí poder pensar qual é o remédio possível”, acrescentou.
Caro Kanczuk, acho que o tempo em que você passou fora do país (ele foi até novembro de 2019 o representante do Brasil no Banco Mundial, vaga para a qual o Brasil indicou o ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub) lhe tirou um pouco da percepção qual o problema da economia brasileira.
Ele tem nome e sobrenome: Jair Bolsonaro. A.C. (antes do Covid-19) o Brasil era visto com desconfiança pelos investidores estrangeiros (no caso boa parte destes capitais estrangeiros é de brasileiros que mantêm offshores em paraísos fiscais e mudam o capital conforme os ventos sopram) pelas atitudes em relação ao meio ambiente e especial à Amazônia).
Durante a pandemia, JB fez tudo o que podia para desmobilizar o país pelo isolamento recomendado por dois médicos titulares do Ministério da Saúde e ainda insuflou seus seguidores a atacar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal com ameaças de golpes a serem apoiados pelas forças armadas. Quem há de confiar no Brasil D.C.?
Mercado segue previsão do governo para PIB: -6,5%
O Relatório Focus, divulgado hoje (06.07) pelo Banco Central mostrou o mercado seguindo a previsão do governo, semana passada, de queda de 6,50% no PIB em 2020 (há uma semana era -6,54%) e avanço de 3,50% no próximo ano. As TOP 5 (as cinco instituições que mais acertam as previsões, entre as 100 que respondem às consultas do BC) preveem a Selic em 1,75% este ano e em 2,50% ao ano em 2021.
A mediana das projeções para a taxa Selic em 2020 ficou em 2,00%, com previsão de queda de 0,25 ponto percentual na reunião do Copom em agosto, e manteve-se em 3,00% para 2021. Para o IPCA, o mercado espera 1,63% para 2020 e 3,00% para 2021.
Automóveis ensaiam a 2ª marcha
A produção de carros, comerciais leves, caminhões e ônibus no Brasil subiu em junho 129,1% frente a maio, para 98,7 mil unidades, segundo dados da Anfavea. Pelo o 2° mês seguido de aumento. Frente a junho de 2019, ainda há queda de 57,7%. Diante das 200.997 unidades produzidas em fevereiro, antes das paralisações devido à pandemia, a produção foi 33,9% menor.
As montadoras ainda estão com muitos estoques nos pátios. O dado alentador é que as vendas de veículos no mês subiram 113,6%, para 132,8 mil unidades. Mas ainda apresentam queda de 40,5% na comparação com junho de 2019.