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Na deflação, alimentos sofrem especulação

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É inacreditável como é distorcido no Brasil o “espírito animal” de empreendedor do Homem, no qual o grande economista John Maynard Keynes apostava como motor na recuperação da economia pelo setor privado, ao lado do indispensável empurrão do Estado utilizado à larga pelo presidente Roosevelt para a retomada da economia e do emprego nos Estados Unidos, com o New Deal, a partir de 1933, para vencer a profunda recessão de 1929.

Vejam o resultado da inflação de abril medida pelo IPCA anunciado sexta-feira, 8 de maio, pelo IBGE. No geral, houve deflação (queda de preços) de 0,31%, a menor taxa desde agosto de 1998. Em 12 meses, a alta recuou de 3,30% em março para 2,40%. A inflação do IPCA mede a cesta de consumo de famílias com renda até 40 salários mínimos (R$ 41.800) e é composto de 9 itens. Destes sete estiveram em queda, com destaque para a baixa de 2,66% no item Transportes. Mesmo com poucas vendas, mas estimulada pela mudança de estação, o item Vestuário subiu apenas 0,10%.

Mas o que espanta foi a escalada de 1,79% em Alimentação e Bebidas (que já tinha subido 1,13% em março), num claro indício de especulação com alimentos com boa parte da população confinada em casa se alimenta, para não se expor ao Covid-19. Sozinha, o impacto da alta de Alimentação e Bebidas (convertida a seu peso na formação do IPCA) produziu uma alta de 0,35 pontos percentuais. Neutralizada pela queda de 0,54% em transportes e os demais itens. Vestuário teve impacto zero no final.

Os números da alimentação mostram que o funcionamento irregular dos mercados abriu um campo propicio à especulação. Não faltam, efetivamente, alimentos nas centrais de abastecimento no atacado que irrigam as compras de supermercados, mercearias e feirantes, além de lanchonetes e restaurantes operando com pronta entrega. Mas enquanto em março, os alimentos subiam 1,12%, os produtos não alimentícios, segundo o IBGE, tiveram queda de 0,18% nos preços. Em abril, o abismo aumentou: alta de 1,79% nos alimentos e baixa de 0,82% nos produtos não alimentícios.

Cebola lidera as especulações

Macaque in the trees
Alimentos - Alta (Foto: IBGE)

Para mim, a única explicação para a alta acumulada de 48,95% na cebola este ano (34,83% só em abril) e de 42,10% na batata inglesa em 2020 (22,81% em abril) está ligada à especulação em cima da demanda do almoço da Páscoa. Estranha especulação que não foi acompanhada pela escalada de preços do bacalhau (mesmo como a disparada do dólar este ano). Os preços industrializados e as carnes processadas caíram 1,04% em abril.

O tomate, que entra no prato, acabou sendo o produto com maior queda no ano (61,82%). Em abril, mesmo com a pressão especulativa, o preço, que tinha subido mais de 15% em março, desceu 2,95%.

Outra estranha diferença de comportamento foi da carne de frango. O quilo do frango inteiro subiu, em média, 4,64%. Mas o frango em pedaços, que é o frango inteiro divididos em partes, teve alta menor, de 3,77%. É a primeira vez que a soma das partes não iguala o todo...

Macaque in the trees
Alimentos - Baixa (Foto: IBGE)

A queda de 2,01% na carne bovina segue a descendente após a escalada do último trimestre, com a especulação com a demanda da China turbinada pelos churrascos de fim de semana em comemorações às vitórias do Flamengo...

E o que dizer da escalada de 97,07% no quilo da cenoura este ano? A alta de 29,24% para o alho é até compreensível. O produto vem principalmente da China (onde a Covid-19 atuou firme no começo do ano) e tem seus valores regulados pela taxa do dólar, que subiu até mais que isso este ano.

Todos os empregos sob ameaça

Nos Estados Unidos, depois que o país atingiu 30,5 milhões de desempregados desde março, o “New York Times” sentencia: “Todos somos vulneráveis, quer trabalhemos em um escritório, fábrica ou canteiro de obras; se nosso empregador é público ou privado; se nosso trabalho pode ser facilmente migrado para um escritório em casa ou não”.

O jornal lista uma série de atividades em retração: o emprego na construção caiu 975.000. A produção caiu 1,3 milhão, com a interrupção das linhas de montagem. O emprego das lojas de roupas caiu 740.000. A indústria cinematográfica cortou 217.000 empregos e o transporte de caminhões 88.000.

O emprego em escritórios de advocacia caiu 64.000 posições e o design de sistemas de computadores em 93.000. Os governos locais cortaram 801.000 empregos, pouco mais da metade deles em educação. Na média, havia uma flutuação de 18 milhões de empregados temporários, passíveis de demissão. A enxurrada atingiu a todos.

Desemprego até na Saúde

Um dado surpreendentemente foi que, no meio da crise de saúde pública, o emprego nos serviços de saúde perdeu 1,4 milhão postos. A explicação, que se aplica também aqui: os americanos evitavam visitas a seus médicos e dentistas para todas as emergências, exceto as mais graves. Sobrou para as secretárias e auxiliares.

Lá, o que se discute, com base nos alarmantes números de abril é se haverá demanda suficiente na economia - seja por meio de gastos do governo federal ou de um setor privado voltar a entrar em ação - para garantir que setores distantes do epicentro dessa crise possam sobreviver se as 18 milhões de demissões temporárias se tornarem permanentes?

Lá, os empresários se queixam do governo e pedem cobertura, mas não vão à Suprema Corte. E os efeitos da pandemia são generalizados, mas tendem a afetar mais o setor de serviços, comparativamente à indústria.

OMS alerta para riscos do relaxament

Os países precisam voltar aos “princípios básicos” da vigilância da saúde pública para controlar o surto de coronavírus, disse nesta sexta-feira, Mike Ryan, o principal especialista de emergências sanitárias da Organização Mundial da Saúde (OMS).

“Parece que estamos... evitando a realidade desconfortável de que precisamos voltar à vigilância da saúde pública”, disse em briefing com a mídia. “Precisamos voltar para onde deveríamos estar meses atrás —encontrando casos, rastreando casos, testando casos, isolando pessoas com resultado positivo, fazendo quarentena de seus contatos

IBGE - Alimentos - Alta
IBGE - Alimentos - Baixa