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Bandeira vermelha 2 eleva inflação para 4,3% em 2020

MME, Aneel e ONS ampliam o fiasco do apagão do Amapá

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O festival de incompetência conjunta do Ministério de Minas e Energia (MME), da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e do Operador Nacional do Sistema (ONS, um órgão privado, com participação de representantes da Aneel e do MME) que deixou 800 mil pessoas sem energia no estado do Amapá por mais de três semanas em novembro, se amplia em escala nacional em dezembro. Em 30 de novembro, um dia após o 2º turno das eleições municipais (ainda não realizadas em Macapá), a Aneel anunciou a adoção, a partir de 1° de dezembro, da bandeira vermelha patamar 2.

Macaque in the trees
Moradores de Macapá fazem protesto contra o apagão (Foto: Folhapress / Maksuel Martins)

A medida contraria a decisão da própria Aneel, que em 26 de junho (em plena pandemia, quando houve forte queda do consumo, devido ao fechamento/redução de atividades nas fábricas e retração no comércio, principalmente nos shoppings, e serviços, devido ao distanciamento social), tinha decidido “manter a bandeira verde acionada até 31/12/2020”. A guinada de 180 graus, que vai elevar brutalmente as tarifas e pressionar a inflação, se deu “diante da deterioração do nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas”.

Choque para o bolso do consumidor

Para o consumidor que estava pagando a bandeira verde desde fevereiro, vai ser um choque o salto direto para a bandeira Vermelha 2. Na bandeira amarela, o segundo estágio, há um custo adicional de R$ 1,34 para cada 100 KW/H consumido. Na bandeira vermelha 1, o acréscimo é de R$ 4,146 para cada 100 KW/H de consumo. Mas na bandeira 2, o salto vai a R$ 6,24 para cada 100KW/H extra. Usar um ar condicionado de 12 mil BTU por uma hora gera gasto de 25 KW por mês. Se usar durante 4 horas, gera gasto de 100 KW mês. Com dois aparelhos ligados durante a noite, a conta pode quintuplicar.

O Departamento Econômico do Itaú, que havia previsto um IPCA de 3,5% este ano, reviu hoje as projeções deste ano para 4,3%, com alta de 0,80% no IPCA de novembro, e de 1,2% em dezembro, já com base no choque energético. O Itaú adverte que “a mudança trará uma pressão significativa para a inflação de curto prazo. Esperamos um impacto adicional de 45 bps no CPI de dezembro (portanto, a leitura de 2020 também será afetada). Para 2021, esperamos uma "bandeira amarela" – segundo grupo – no final do ano, aparando aproximadamente 30bps da leitura da inflação, sendo tudo constante”.

O banco adverte ainda para o impacto do “aumento nos preços de produtos e serviços administrados, como os seguros de saúde” [em janeiro, que estavam congelados desde setembro, quando não houve o reajuste anual]. “Devido a essas mudanças, esperamos agora inflação do IPCA em 4,3% em 2020 e 3,1% em 2021", assinala o banco.

“Com isso, a inflação do ano termina um pouco acima da meta de 4,0%. Projetamos alta de 2,5% em preços administrados em 2020 (com a bandeira de dezembro, a energia elétrica deve subir perto de 10% no ano) e esperamos alta de 4,9% em livres".

Alimentos vão subir 17%, estima Itaú

“Nesse grupo (preços livres), projetamos alta de 17% em alimentação no domicílio, seguindo o choque recente no preço de commodities agrícolas em reais. Entre os demais preços livres, projetamos alta de 2,8% em industriais e 1,8% em serviços. Projetamos alta de 2,4% no IPCA-EX3 (indicador subjacente de serviços e industriais). O pior é que estes gastos vão se acumular justamente com o fim do Auxílio Emergencial em janeiro de 2021 (há 30 dias de defasagem nos desembolsos, que caíram de R$ 600 para R$ 300 em setembro).

Fiasco na gestão da energia e estoques de alimentos

Não é possível que o MME, a Aneel e o ONS, que acompanham o nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas, não soubessem que estavam em níveis críticos. E que o consumo de energia vinha crescendo fortemente desde agosto. Não era só a retomada da economia. Havia oportunismo das indústrias produtoras de bens industriais eletro-intensivos (de alto uso de energia) destinados à exportação, estimulados pela escalada do dólar (42% até outubro).

Algo semelhante ao que aconteceu com a soja. O produto, como outros, estimulados pela escalada do dólar, foi tão exportado que faltou matéria prima para a extração de óleo de soja (subiu mais de 70% no ano até outubro) e o Brasil teve de importar soja do Paraguai, Uruguai e Estados Unidos!

Como diz o economista Manuel Jeremias Leite Caldas, estudioso do setor elétrico: “A loucura da desvalorização cambial incentivou os exportadores intensivos em energia a produzir com energia barata em dólar. Consumiu ontem a energia de hoje para fazer lucro dos eletros intensivos. Os Reservatórios na região Sudeste estão com água abaixo de 18%. Cadê o MME para explicar? Rezemos para cair água, se não, janeiro de 2021 será o caos. Aqui se faz aqui se paga”, diz o economista.

E aqui pergunto eu: O que faz a pasta do almirante Bento Albuquerque? Isso pode acrescer em meio ponto a inflação até março.

Lembrando o estelionato de Dilma em 2014

O festival de incompetência atual lembra o estelionato eleitoral de Dilma Roussef na sua reeleição, em outubro de 2014. No final de 2012 ela tinha promovido mudança na regulação do setor elétrico, com redução de 18% nas contas de luz em 2013, mantidas em 2014. O dólar artificialmente baixo, também ajudou a manter inalteradas as tarifas de energia (a usina binacional de Itaipu, que responde por 1/3 da geração do país, tem suas tarifas atreladas ao dólar). Ao fim de 2015, o dólar subiu 48% (bem mais do que este ano),

Mas logo depois da reeleição, o Banco Central elevou os juros e Dilma autorizou a escalada da desvalorização cambial (dezembro) e o reajuste da energia elétrica (que subiu 45% em 2015), além do reajuste dos combustíveis da Petrobras, semicongelados há tempos (subiram 25% em 2015). O país entrou na maior recessão, que se estendeu até 2016, quando a ex-presidente sofreu “impeachment” e, 16 de abril. O

A perda do poder e o dízimo

Acho míope a interpretação de que o cacife eleitoral do PT murchou devido quase exclusivamente à lava-jato. Quem diz isso esquece dos 3 milhões de desempregados jogados na rua pela recessão de 2015-16 e pela escalada da inflação dos alimentos. A situação se repete agora em escala maior, com 30 milhões de pessoas à margem do mercado de trabalho.

No poder (no governo federal, nos estados e nas prefeituras) o PT repetia igrejas pentecostais que chegaram ao poder. Empregar fieis (aliados) na máquina pública rende mais contribuições (dízimo, que no PT ia até 13% nos cargos mais remunerados). Sem o poder da máquina, diminui o cacife eleitoral do PT e da IURD (representado pelo Partido Republicanos, do qual o prefeito do Rio, o bispo licenciado, Marcelo Crivella era um dos pontas de lança).

O mesmo se pode dizer de Jair Bolsonaro, que viu sua popularidade encolher com a redução de 50% no Auxílio Emergencial e se dissolver no 1º teste eleitoral. Os ganhos do fundo eleitoral de 2018 não se repetiram nem para Bolsonaro nem para o PT. Entretanto, como está sem partido, Jair Bolsonaro pode se valer da filiação a uma máquina partidária que resistiu na eleição municipal e pode ter cafife do fundo eleitoral para 2022. O PSD de Gilberto Kassab está com o cavalo arriado...

Folhapress / Maksuel Martins - Moradores de Macapá fazem protesto contra o apagão