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XXIII Bienal de Música Brasileira Contemporânea

Marcus Veras -
O clarinetista José Batista Junior e o regente Ricardo Bologna
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Hoje (13/11) e amanhã são os últimos dias para prestigiar a Bienal de Música (ver programação abaixo). Prestigiar porque é um milagre que a Bienal aconteça este ano sob o signo de tantos desmantelamentos na cultura. É imaginável e extremamente louvável o esforço que tantos empenham para que a Bienal chegue no seu vigésimo terceiro ano!

No entanto, o evento que é de importância relevante para os compositores brasileiros, como um espaço de renovação e para divulgação de suas obras, peca em alguns quesitos.

Ano após ano, observamos uma repetição dos compositores selecionados. Verdade seja dita que há exceções, e alguns compositores conseguem furar esta tendência. No entanto, o que poderia parecer simpático à primeira vista - um evento entre amigos que se reúnem de dois em dois anos - não é, sobretudo para os que são Coringas. E isso limita o crescimento do que pareceria ser a intenção da Bienal em apresentar novos compositores e o que há de mais inovador na música contemporânea brasileira. De cara, chama a atenção o fato de que, das 47 obras selecionadas, apenas três sejam de compositoras. Alguns responderão: “Houve muito menos mulheres inscritas!”. Como não temos a informação de quantas mulheres se inscreveram, fica a desconfiança sobre a comissão de seleção, que num universo com tantas excelentes compositoras, selecionou apenas três peças de mulheres: 6% de compositoras selecionadas é uma percentagem muito baixa, mesmo imaginando um número de inscrições desigual.

No entanto, a Bienal ainda é um evento interessante para os compositores e o primeiro dia (domingo, dia 10/11) apresentou excelentes obras, que compensaram outras não tão interessantes, como é de se esperar num evento com diversidade (faço aqui uma ressalva: minha opinião sobre as peças, apesar de algumas análises mais teóricas, é sempre subjetiva e guiada por linguagens musicais com que mais me identifico).

Na Abertura, pela manhã, no Centro de Artes UFF, foram apresentadas as seis obras sinfônicas selecionadas para serem tocadas pela Orquestra Sinfônica UFF, sob a regência de Ricardo Bologna. O nível dos intérpretes foi de tirar o chapéu, o hour concours violinista Daniel Guedes à frente da bela e melodiosa As Estações Brasileiras, de Dimitri Cervo, foi um dos pontos altos, peça que destoou, no bom sentido, com a linguagem algumas vezes forçada para o vanguardismo, tão presente em Bienais, ou simplesmente com atonalismos gratuitos que nem sempre são apreciados pelo público menos habituado à música moderna. O clarinetista José Batista Júnior teve uma brilhante interpretação em Pseudodivertimento para clarineta e orquestra, de Roberto Macedo. Gostei bastante de Levantando do Chão, de Alexandre Avellar. A obra inspirada no romance de José Saramago é descritiva e se ouve realmente como uma narração de cenas, é quase cinematográfica.

Macaque in the trees
O clarinetista José Batista Júnior e o regente Ricardo Bologna (Foto: Marcus Veras)

A peça homenageada na manhã de domingo foi Sacre du Sacre, de Marlos Nobre, em que o compositor homenageia o Sacre du Printemps, de Stravinsky, e faz uma citação ao final, com humor, sobre a obra do compositor russo, após mais de 15 minutos desenvolvendo uma textura de intensidade orquestral e tensões notáveis (sempre me pergunto o quanto um compositor consegue manter a tensão sem fazer um contraponto com contrastes mais serenos). Sacre du Sacre é de tirar o fôlego.

As apresentações continuaram no mesmo domingo à tarde na Sala Cecília Meireles, com a seleção das obras para Música de Câmara. Não há como não se surpreender - bela surpresa - com a peça de Vicente Alexim: utilizando efeitos simples para construir seu Quinteto para clarineta e quarteto de cordas, desenvolve uma textura baseada em harmônicos nas cordas, em que a clarineta se infiltra de tal forma que algumas vezes não identificamos o instrumento. Da descrição do compositor sobre sua peça: “Gradualmente, violinos, viola e violoncelo se libertam dessa homogeneidade sonora e encontram suas vozes individuais, como um novelo de lã que aos poucos se desfaz.”

Macaque in the trees
Luísa de Castro, Tomaz Soares, Daniel Silva Jessé Máximo Pereira com o compositor-clarinetista Vicente Alexim (Foto: Nina Martins)

Os intérpretes foram de alto nível e fizeram jus às difíceis peças, que demandavam texturas menos óbvias, como o Quarteto Kalimera, que se destacou nas peças de Alexim e de Nikolai Almeida Brucher. O quarteto de violões da peça Déjà-Vu, de Elodie Bouny, com Fábio Adour, Maria Haro, Marco Lima e Luiz Carlos Barbieri, também se destacou com sucesso no desafio da compositora de lidar com quatro timbres iguais. Compositores e músicos estão de parabéns, sem exceção, foram apresentações de alta qualidade, em que se mostrou um pouco da diversidade que há na música brasileira e do que se faz atualmente. Neste sentido, a Bienal é um sucesso.

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Luiz Carlos Barbieri. Fábio Adour, Marco lima e Maria Haro. O quarteto de violões de Elodie Bouny (Foto: Marcus Veras)

Programação de hoje e amanhã

Música eletroacústica/mista

Quarta-feira, 13 de novembro, 20h, Sala Cecília Meireles.

Jocy de Oliveira – Memória Para quatro vozes femininas e delas. Vozes - Gabriela Geluda, Doriana Mendes, Cintia Graton, Claudia Helena Alvarenga. Difusão e processamento em tempo real - Marcelo Carneiro

João Pedro Oliveira - N’vi’ah. Difusão: Guilherme Bertissolo.

Almeida-Ribeiro – Unruhe. Percussão - Ronni Kot Wanzel e Rodrigo Foti. Difusão - Marcelo Carneiro.

Marcelo Carneiro – Litosfera, obra eletroacústica acusmática.

Luciano Leite Barbosa - Vanishing Point. Laura Rónai – Traverso. Difusão - Marcelo Carneiro.

Indioney Rodrigues – Flegetonte. Cron Ensemble

Flauta - Lincoln Sena; Clarineta - Marcos dos Passos; Viola - Rúbia Siqueira; Percussão - Pedro Moita.

Eloy Fritsch – TSP Multipalco. Difusão: Guilherme Bertissolo.

César Traldi e Daniel Barreiro – Rastros#1

Vibrafone e sons eletroacústicos.

Tatiana Catanzaro – Palimpseste. Difusão: Marcelo Carneiro.

Gustavo Bonin – Famigerado. Cron Ensemble

Flauta e Flautim - Lincoln Sena; Clarineta e Clarone - Marcos dos Passos; Vibrafone - Pedro Moita; Violão - Marco Lima.

Guilherme Bertissolo - Cabelo (Fricotando).

ABSTRAI ensemble - Pedro Bittencourt (fundador e diretor artístico). Soprano - Doriana Mendes; Flauta - Pauxy Gentil-Nunes; Clarinete - Batista Jr; Bandolim - Paulo Sá; Violão - Fábio Adour; Violoncelo - Pablo de Sá; Percussão - Pedro Moita. Regente Leonardo Labrada.

Tim Rescala – Dodecafunk. Soprano - Doriana Mendes; Sampler e MC - Tim Rescala; Piano - Maria Teresa Madeira; Flauta - Sofia Ceccato; Fagote -Simon Béchemin.

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Música de Câmara

Quinta-feira, 14 de novembro, 19h, Teatro Dulcina.

R. Alcindo Guanabara, 17 - Centro, Rio de Janeiro

Alfredo Barros - Vanescens para vibrafone Solista - Leonardo Labrada.

Sergio Kafejian - Circulares VII. Oboé, Contrabaixo e Percussão Múltipla, Oboé - Jorge Postel; Contrabaixo - Claudio Alves; Percussão múltipla - Ronni Kot

Amaro Borges - Solofonia V para voz. Solista - Gabriela Geluda.

Francisco Silva – E agora?. Clarinete - César Bonan; Flauta - Rômulo Barbosa.

Mauricio Dottori - Taleré Phoné. ABSTRAI ensemble -

Saxofone - Paulo Vinícius Félix; Vibrafone e Percussão -Leonardo Labrada.

Marcílio Onofre - Quarteto de Cordas nº 3 - Oscura noche del alma. Quarteto Kalimera: 1º Violino - Luísa de Castro; 2º Violino - Tomaz Soares; Viola - Jessé Máximo Pereira; Violoncelo - Daniel Silva.

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Nina Martins - Luísa de Castro, Tomaz Soares, Daniel Silva Jessé Máximo Pereira com o compositor-clarinetista Vicente Alexim
Marcus Veras - Luiz Carlos Barbieri. Fábio Adour, Marco lima e Maria Haro. O quarteto de violões de Elodie Bouny
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