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Música em movimento

Sarah Higino -
Sarah Higino
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Macaque in the trees
Sarah Higino (Foto: Sarah Higino)

Interessada em conhecer mais sobre orquestras e professores de música que se dedicam a projetos de formação de crianças e adolescentes, ouvi falar que Volta Redonda era O Lugar! Volta Redonda? Como assim? Fiquei então sabendo que havia uma mulher fazendo acontecer por lá: Sarah Higino, que é maestrina, pianista e superprofessora. Fiquei encantada já no primeiro contato por telefone: “Por que você não vem conhecer nosso trabalho aqui?” Fui e Sarah, com toda sua simpatia, foi me buscar na rodoviária. Fui na ignorância, a única coisa que sabia sobre Volta Redonda é que era a Cidade do Aço, com uma grande siderúrgica. Da rodoviária até as escolas que fui conhecer, tive uma aula sobre a cidade. Sarah nasceu em Volta Redonda. E, sim, Volta Redonda parece especial, não sei se por causa de Sarah, mas pareceu-me que, apesar de bairros humildes, há uma dignidade maior do que nas favelizações que acontecem pelas cidades no Brasil.

Sarah é responsável, junto ao idealizador do projeto, o maestro Nicolau Martins de Oliveira, e ao maestro José Sérgio Torres da Rocha pela iniciativa que começou há mais de 40 anos em Volta Redonda e hoje tem quatro mil alunos com idades entre a pré-escola e o ensino médio em 40 escolas do município. Perguntei como era financiado o projeto e se a troca de prefeitos não afetava a continuidade do trabalho, e aqui vai uma pequena “aula” de como os projetos culturais deveriam ser: “O projeto é de tal forma solidificado na comunidade, que todas as administrações têm entendido sua importância. É um projeto que tem décadas e isto só pode acontecer com apoio da comunidade”.

Chegamos a uma escola pública, entre as muitas em que Sarah dá aula, aparentemente igual a todas as escolas do município do Rio de Janeiro. Atravessamos um pátio com um monte de crianças berrando, em recreio, e fomos para as salas de música. Abriu-se um outro mundo. Primeiro, fui assistir a um ensaio de violinos. A aula dada para vários adolescentes em conjunto e ministrada pela violinista Greice Kelly Barras de Souza, formada no projeto, impressionou pela concentração dos jovens músicos. Nem todos os alunos se tornarão músicos, mas é como diz Sarah: “Esta participação permite que eles se desenvolvam com maior disciplina e percebam no meu exemplo e no de outros que a música pode levar a outros lugares e ambientes”.

Depois fui assistir ao ensaio de um dos corais. Coisa de arrepiar. Sarah entra e cerca de 100 crianças param a bagunça e a conversa, e se colocam de pé, prontas para obedecer à maestrina. O som que saiu dali foi magnífico, vozes de anjos com crianças afinadíssimas. Sei que estava ouvindo algo muito especial e que exigiu um trabalho de Hércules. Não se consegue um coral assim da noite para o dia.

Sarah é extraordinária em vários sentidos, além de exímia pianista (que ama tocar Ravel e Debussy), maestrina e pedagoga: sua energia e dedicação aos alunos são essenciais para o sucesso do projeto. Indagada sobre as peculiaridades de ser mulher e negra, completa: “Não é simples ser mulher maestrina. Estamos tentando ainda encontrar um lugar ao sol nas grandes orquestras. A gente estuda nos mesmo bancos que homens, temos as mesmas habilidades artísticas, mas quantas mulheres se veem nos pódios? Não participo dos movimentos negros. Meu trabalho é educacional e social. Eu sempre digo que não preciso estar em um movimento, sou uma negra em movimento”.

Mais sucesso ainda para este projeto em 2019! Parabéns a todos envolvidos.