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Uma histórica manhã no Harlem

Reprodução -
Harlem
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Era uma bela manhã de terça-feira, dia 12 de agosto de 1958. Art Kane, na época um fotógrafo de apenas 33 anos, fazia sua primeira foto para a revista “Esquire”, no Harlem, mais precisamente na 17 East 126th street, entre a Madison e a 5a avenida. Até hoje ninguém sabe como ele conseguiu a façanha de reunir 57 músicos às 10h (horário considerado madrugada para os artistas que vivem da noite) para o momento que ficou conhecido como “Um grande dia no Harlem”, um dos mais emblemáticos registros fotográficos da história do jazz.

O time de músicos é de arrepiar: Thelonious Monk, Coleman Hawkins, Count Basie, Dizzy Gillespie, Charles Mingus, Gerry Mulligan, Sonny Rollins e Art Blakey foram alguns dos gênios presentes. A foto inspirou imagens semelhantes de diversos gêneros musicais nos anos seguintes. Foi tema também de um documentário de Jean Bach (que concorreu a um Oscar em 1994) e virou o eixo central do blockbuster “O terminal”, de Steven Spielberg (na história, o personagem vivido por Tom Hanks segue em busca de um autógrafo de Benny Golson para completar a coleção de seu falecido pai, que já tinha as assinaturas de 56 dos músicos retratados na foto).

Benny Golson, inclusive, junto a Sonny Rollins, são os dois músicos vivos até hoje que fizeram parte daquela manhã especial. Tive o privilégio de assistir ao saxofonista (que completa 90 anos em janeiro e foi homenageado recentemente pelos críticos da revista “Downbeat”) há dois anos em Paris, no Duc des Lombards. Entre uma música e outra, ele comentou a emoção de fazer parte daquele momento: “Eu era um recém-chegado a Nova York e estava ali posando ao lado de grandes músicos”.

Histórias e curiosidades marcam o dia da foto, como a dificuldade que Kane teve de reunir os músicos simultaneamente, já que todos estavam bebendo em um bar a poucos metros de distância enquanto esperavam. Foi por isso que Willie “the Lion” Smith não apareceu na foto. Embora estivesse no local, se atrasou entre um drinque e outro... Outra curiosidade foi o não comparecimento de Quincy Jones (que morava, na época, no mesmo prédio de Golson), e a dúvida sobre o motivo de sua ausência.

Lançado em novembro deste ano, o livro “Art Kane Harlem 1958” comemora os 60 anos do registro histórico, com imagens inéditas daquele encontro, além de depoimentos de Quincy, Golson e do filho de Kane, Jonathan. O lançamento é acompanhado por uma série de eventos e exposições nos Estados Unidos e na Europa.

Se, infelizmente, não é mais possível assistir ao vivo todos os músicos daquela foto incrível, pelo menos uma visita à escadaria que serviu de palco para eles já está agendada na próxima ida a Nova York. Quem sabe não encontro Mr Golson por lá, e o convido para uma entrevista?

Macaque in the trees
Harlem (Foto: Reprodução)

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Bebop

“It Must Schwing!” Assim como os grandes músicos, existiram outros notáveis fotógrafos no universo jazzístico. Francis Wolff, por exemplo, foi uma dessas sumidades no assunto. Peça fundamental no crescimento e expansão da Blue Note Records (que, para quem não sabe, em nada tem a ver com o homônimo jazz club): além de fundador, atuou como executivo, produtor de discos e fotógrafo. Seus trabalhos renderam livros e documentários premiados no mundo inteiro, com imagens de tirar o fôlego. Este ano, inclusive, foi lançado “It must schwing!”, filme que conta a história de Wolff e Alfred Lion, judeus alemães que, para fugirem da perseguição nazista de Hitler, foram para os Estados Unidos e fundaram a gravadora.