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Imagine se o 03 fosse Embaixador

Foto: Reuters/Amanda Perobelli -
Deputado Eduardo Bolsonaro
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E como dissemos na semana passada, segue o baile de noivado. Enquanto a viúva Porcina corta seus laços antigos com Roque Santeiro (digo, a Rede Globo), a dança semanal das cadeiras desta vez provocou três mudanças e uma expulsão da festa: Onyx Lorenzoni - esvaziado desde meados de 2019, quando a atividade de articulação política da Casa Civil passou ao novo secretário de Governo, general Luiz Carlos Ramos, que substituiu o general Santos Cruz - assume a pasta da Cidadania (gestora do Bolsa Família), no lugar de Osmar Terra, que volta à Câmara como deputado federal (MDB-RS). Braga Neto e o vice-presidente Hamilton Mourão, recém nomeado coordenador das questões para a Amazônia, são companheiros de longa data na rede de vôlei do Posto 6, em Copacabana, Rio de Janeiro, quase colada ao Forte de Copacabana.

Em outro movimento, para reforçar o QG de militares em sua volta, o ex-capitão Jair Bolsonaro nomeou o almirante Flavio Augusto Viana Rocha para chefiar a Secretaria de Assuntos Estratégicos, que fica agora subordinada à Presidência da República. Entre as atribuições da SAE está o assessoramento do presidente para assuntos internacionais. Mas, como a bebida parece correr solta na festa, os desatinos se sucedem.

O Posto Ipiranga, em mais uma de suas ratas, ao falar demasiado, insinuou que o dólar estava caro e devia seguir assim, porque “era bom para todo o mundo” e aproveitou para criticar o populismo cambial de Dilma Roussef (em 30 de junho de 2011 o dólar teve a menor cotação em reais – R$ 1,512), lembrando que “quando o dólar estava em R$ 1,80, era uma festa, até empregada doméstica ia à Disney”.

Tanto bastou para despertar a reação das associações das empregadas domésticas (embora a fala do ministro da Economia insinuasse que a própria família pagasse as passagens das empregadas), e a disparada das cotações. O dólar que estava na faixa de R$ 4,30 saltou para a faixa de R$ 4,40 e forçou o Banco Central a intervir, vendendo contratos de dólar futuro. Nesta sexta-feira, 14 de fevereiro, a cotação voltava a R$ 4,31.

Paulo Guedes tem 70 anos. Deveria saber que ministro da Fazenda e presidente do Banco Central (ou seja, as chamadas autoridades monetárias) não devem falar em níveis de juros, câmbio e do mercado de ações, pois dão margens a movimentos especulativos nos mercados futuros, onde, como banqueiro, fez parte de sua fortuna. Estar à frente da pasta da Economia, que incorporou Fazenda, Planejamento, o MDIC e parte do Trabalho e Previdência, exige cautela ainda mais redobrada. Mas o “Posto Ipiranga”, que trabalhou em comércio exterior, quando era assistente do economista Affonso Celso Pastore na Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior, nos anos 70 e 80, tem a língua solta e arrependimentos tardios, após os estragos de suas falas...Vide AI-5 e outras.

Vale lembrar à turma do PT, que aproveitou para criticar duramente a alta de 12% do dólar desde a posse de Bolsonaro, que após as sucessivas valorizações do real frente ao dólar nos dois governos Lula, o saldo da balança comercial foi caindo ano a ano. De 2011 para 2012, já no governo Dilma, após baixar à mínima de R$ 1,512, o superávit encolheu US$ 10 bilhões, para US$ 19,4 bilhões e a situação só fez piorar, com saldo de apenas US$ 2,5 bilhões em 2013 e a volta do déficit em 2014, em US$ 3,9 bilhões.

Com a reeleição garantida, às custas de congelamento ou redução forçada de preços públicos, como combustíveis e energia elétrica, além do câmbio apreciado e juros contidos, Dilma iniciou as correções ainda em novembro de 2014, com aumento dos juros e dos combustíveis. O serviço sujo de impor realismo ao câmbio (contido na gestão Mantega) foi atribuído ao ministro da Fazenda Joaquim Levy, que pediu o boné em meados de 2016. Mas, ajudada pela recessão cavalar (queda de 3,5% do PIB em 2015) as importações encolheram e houve superávit de US$ 17,6 bilhões no 1º ano do 2º governo Dilma, nível ampliado para US$ 44 bilhões em 2016, quando o PIB caiu 3,3%. Na gestão Dilma o dólar subiu 137%.

Mas não para por aí. O ex-futuro embaixador do Brasil em Washington, o filho 03 do presidente, Eduardo Bolsonaro, o deputado federal mais votado do país em 2018, pelo PSL, hoje sem partido, guindado a líder do governo na Câmara, como prêmio de consolação por não ter sido testado (e reprovado) na sabatina do Senado para a indicação como Embaixador, deu esta semana demonstração de subserviência inacreditável a Tio Sam. Poderia ser considerado crime de lesa pátria se estivesse à frente do principal posto diplomático do país. Mas é vexaminoso para o cargo que ocupa.

Em entrevista, o presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados afirmou que está prestando particular atenção no leilão das licenças da banda larga 5G e que mira particularmente o risco de a entrada da chinesa Huawei afetar a possibilidade, que defende junto com o pai, “de uma parceria militar com os Estados Unidos”. Fã declarado do presidente Donald Trump, o deputado considera que a participação da Huawei, uma das líderes mundiais em tecnologia de banda larga, pode ser uma ameaça à concretização da parceria. “Como é que [os Estados Unidos] vão poder confiar se houver interferência chinesa?” Eduardo acrescenta que a Huawei não é propriamente uma empresa privada e poderia ceder às pressões do governo chinês para transferir segredos militares.

Bobagem. Para começar, não é a Huawei que comprará licenças da banda 5G da Anatel. Quem vai disputar são as operadoras de telefonia: a Vivo, da espanhola Telefónica; a Claro, do bilionário mexicano Carlos Slim, radicado nos EUA; a italiana Telecom Itália Mobile, controlada pelo fundo de investimento americano Elliot e tendo a francesa Vivendi como sócio minoritário; e a brasileira Oi, em recuperação judicial, com menor poder. Hoje, nas tecnologias das bandas 4G, já predominam os equipamentos chineses, mais eficientes que americanos, coreanos, japoneses, alemães ou finlandeses. È verdade que o leque de serviços da 5G é bem maior.

Tiete do presidente americano Donald Trump, o parlamentar se alinha com ele e diz que preferiria que o Brasil não utilizasse a tecnologia da empresa (que o governo dos EUA quer evitar). Argumenta que não se trata de uma empresa privada. Não é bem verdade, a Huawei funciona em sistema de cooperativas, com mais de 99% de suas ações em mãos do sindicato dos funcionários. Parceiros militares dos EUA - a começar pelo mais antigo, o Reino Unido -, usam equipamentos da Huawei. Os ingleses impuseram cotas, limitando em 35% a participação dos equipamentos da gigante chinesa e tornaram algumas áreas secretas. O que a SAE sabe, pode se repetir aqui, perfeitamente.

A disposição de franquear o mercado brasileiro aos americanos, sem exigências de contrapartida, como na negociação do ingresso na OCDE, para a qual o Brasil aceitou perder o status de economia emergente, que lhe dava maior proteção nos painéis da Organização Mundial do Comércio, parece não ter limites. Além do nº 03, o próprio Guedes achou bom perder o status. Vamos entregar novas usinas nucleares à Westinghousen, que vendeu Angra I, a “usina vaga-lume”, tantas eram as interrupções nos primeiros anos. Coisa de US$ 1 bilhão cada.

Não se sabe, em meio ao acordo comercial China-EUA, se seremos prejudicados pelo Tio Sam na tomada de espaços no mercado chinês no fornecimento de farelo de soja e milho, e de carnes de frango, boi e suínos. Os EUA são os maiores produtores destes alimentos, mas o Brasil tomou a liderança nas exportações há mais de uma década, exceto em carne de porco, valendo-se, sobretudo, da penetração no mercado chinês.

Corremos o risco de levar um chega-prá-lá. A gripe suína africana dizimou 40% da criação de porcos do país (na China a carne de porco garantia cerca de 45% do mercado de proteína até 2018). O Brasil vem sofrendo fortes quedas nas exportações de farelo de soja para a China. Em 2019 a redução foi de 21%; em janeiro chegou a 40%. Não se sabe se há uma contração geral, que pode ser agravada pelos efeitos do coronavírus, só detectado na 2ª metade de janeiro, ou se os fazendeiros americanos (base do eleitorado de Trump) já estão ganhando mercado pós acordo.

P.S. Seguindo o conselho de Paulo Guedes, vou passar duas semanas no Nordeste. Volto a escrever em março.