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Reformas fora de ordem  

REUTERS/Paulo Whitaker -
Congresso Nacional
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A prática é antiga, da qual não conseguiram escapar, mais uma vez, as lideranças com assento nas duas casas do Congresso. Com a falta de coragem para cuidar de uma reforma política, verdadeira, profunda e substantiva, entrou em cena um conjunto de ajustes de providências eleitorais, às quais se ousa dar falso rótulo reformista. Um engodo, visto que aos parlamentares a nada mais preocupam que não facilidades para a reeleição. Suficientemente já se demonstrou que a inconsistência dos dispositivos que regem o processo eleitoral, aqui ou em qualquer outra parte do mundo, é resultado da fragilidade da estrutura política, que deve anteceder àquele. Tanto assim, que as mexidas praticadas nas regras têm de ser permanentemente renovadas. No Brasil não são capazes de resistir a duas eleições.

Onde já se viu maquiar o receituário eleitoral? se antes dele temos a reclamar a reforma política estruturante. Constatação que não podia ser ignorada por detentores de mandato; mas ela não consegue sobrepor-se à tentação da permissividade e do circunstancial. A novela se reprisou, sob o mesmo cenário, na semana passada, quando a Câmara dos Deputados cuidou de aprovar, altas horas, tão discretamente quanto possível, peças de uma legislação onde altera o sistema a ser trazido aos eleitores no ano seguinte. As mudanças tiveram foco na flexibilização das normas na prestação de contas de gastos com as campanhas normatizadas pelo TSE, começando pela destinação de mais recursos para o fundo de financiamento eleitoral, além de perversa falta de transparência nas relações dos partidos com a sociedade.

No Senado, a matéria procedente da Câmara enfrentou críticas da sociedade civil, em sua maioria originada das redes sociais. Diante do clima desfavorável, e considerando que os deputados deixaram tudo para undécima hora, os senadores, procurando escapar de inevitáveis desgastes, “pipocaram” e rejeitaram a maioria dos dispositivos polêmicos. Ficou, contudo, o que se referia à necessidade de constar na lei orçamentária anual um valor para o fundo daquele tipo de financiamento.

No jogo de empurra a que desde então a opinião teve de assistir, a matéria foi devolvida à câmara menor, onde se estabeleceu a corrida contra os ponteiros, com pouco tempo para deliberações, uma vez que, pelo princípio de anualidade da legislação eleitoral, o prazo se esgota no dia 4. Não ficaram faltando queixas de deputados, que deploram o fato de os colegas de cima, numa atitude pilatesca, lavarem as mãos, evitando subir o calvário onde sangra tema tão melindroso.

Outro aspecto a preocupar na discussão é a possibilidade de se ampliarem, sem controle severo, as quantias do fundo que financiará as eleições municipais seguintes. Uma vez que, ao não estimar um valor na legislação para tais recursos, fica a sensação de o Congresso conceder um 'cheque em branco' para custear a campanha dos partidos e dos candidatos.

Seja como for, cabe lembrar que a nova legislatura, tão recentemente inaugurada, está escancarando diante da nação e do eleitorado que nada mudou no comportamento dos políticos atualmente com mandato no Congresso Nacional, embora as duas casas tenham sido renovadas significativamente nas urnas. Estão assumindo e reafirmando a prática de velha política, onde o principal é garantir a reeleição imediata, mantendo-se o carreirismo tão criticado nos palanques de 2018. É a triste realidade com que temos de conviver.