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Perdido no Posto Ipiranga

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Na campanha eleitoral, em meio aos disparates que assombravam a nau dos sensatos, mas entusiasmavam os radicais de direita e os que estavam cansados da longa dinastia do PT e queriam mudar o comando, o deputado do PSL, Jair Messias Bolsonaro se escusava a entrar em assuntos que não estavam a seu alcance. Como os desafios da economia e saía-se sempre com o escudo: “isso é lá com o meu Posto Ipiranga”, o economista Paulo Guedes.

Eleito com uma falsa expectativa, expressa no Orçamento Geral da União (OGU) elaborado pela última equipe econômica de Michel Temer, de que o aumento de 2,2% no Produto Interno Bruto este ano e a inflação, estimada em 4,2% (a meta do Banco Central para o IPCA era de 4,25%), garantiriam uma razoável arrecadação, o presidente confiou que a própria vitória e a aprovação da reforma da Previdência (em curso favorável ao governo) instilariam a confiança dos consumidores e empresários, fazendo a economia deslanchar.

Nada disso ocorreu. As frustrações se sucedem. O PIB, que seria de 2,5% este ano e de 3% em 2020, está crescendo como rabo de cavalo. Depois do alívio da taxa de 1,1% em 2017 e 2017 (após a brutal recessão de 3,5%, em 2015, e de 3,3% em 2016, que dobrou o número de desempregados de 6,5 milhões para mais de 13 milhões de brasileiros), as projeções caem todo mês. A última previsão consensual era de que o PIB cresceria apenas 0,8% este ano e entre 1,7% a 2% em 2020.

Com as escaramuças globais promovidas por Donald Trump entre os Estados Unidos e a China, as projeções da economia mundial estão minguando e as do Brasil, mais ainda. Esta semana, o Bradesco, 2º maior banco privado do país, já admitiu colocar a última previsão de alta de 0,8% do PIB de 2019 em viés de baixa. E, para reverter a curva de declínio da produção e do emprego admite que a taxa básica de juros vai cair do piso de 5% que previra (como já fizera o Itaú em fins de junho) para este ano e para 2020. Em outras palavras, o Bradesco diagnostica que o país está estagnado. Liberar o FGTS vai ajudar quem está endividado. Mas antes pagar dívidas que fazer novas no crediário.

Não é de espantar o aparente espanto do presidente Jair Bolsonaro ao admitir esta semana, ao ser indagado sobre o risco de faltarem recursos para as universidades federais (o ensino médio é basicamente de responsabilidade dos estados e a educação básica compete aos municípios), que “não tem dinheiro” e que “os ministros estão apavorados com a falta de recursos”.

O governo não se preparou para enfrentar uma quadra econômica hostil (à parte as escaramuças comerciais sino-americanas, nosso vizinho portenho, maior comprador de automóveis e manufaturados brasileiros, vem em crise desde o fim do 1º semestre de 2018, o que resultou na expressiva derrota do presidente Macri nas prévias de agosto para a chapa Fernandez-Christina Kirchner, o que, se confirmada na eleição de outubro, pode gerar turbulências ao norte e ao sul das fronteiras do Brasil). Não adianta agora recorrer à retórica barata do “em casa em que falta pão, todo mundo grita e ninguém tem razão”.

Pior que isso, a história registra, só o desdém de Maria Antonieta que, ao ser informada que faltava trigo para fazer o famoso pão francês, acessível ao populacho, recomendou: “que se comam brioches”. Acabou com o pescoço na guilhotina após a queda da Bastilha, semanas depois.

Como diz o velho ditado, “para quem está perdido, qualquer direção serve”. Bolsonaro continua perdido em matéria de economia. Recebeu indicações no Posto Ipiranga, mas segue a indicação sem poder avaliar se está no rumo certo. Não só os ministros estão perdidos e “apavorados”. O presidente perdeu tempo tentando blindar as investigações contra o filho 01 e nomear o filho 03, embaixador do Brasil em Washington, enquanto a economia não engrenava.

O mês de agosto sempre foi considerado o “mês de desgosto”, porque o Executivo é obrigado a enviar ao Congresso a proposta do Orçamento Geral da União para o ano seguinte. E quando a realidade desmente sonhos e promessas, gera crises políticas. No passado inflacionário anterior ao Plano Real, errava-se muito nas previsões, mas a inflação, sempre maior do que a prevista, engordava a arrecadação mesmo quando o PIB não correspondia às expectativas. Agora, o PIB escorrega na ladeira e a inflação se comporta bem abaixo do centro da meta.

O OGU de 2019 previa crescimento de 2,2% no PIB e de 4,2% da inflação pelo IPCA. As projeções do Banco Central e do mercado para o IPCA estão abaixo do centro da meta. O Itaú está projetando em 3,6% a inflação para este ano e para 2020. Com a perda de 1,4 pontos percentual no PIB e de 0,6% na inflação, perde-se quase 2 pontos percentuais de PIB nominal. Ou de R$ 140 bilhões a R$ 170 bilhões na arrecadação.

Esse é o dinheiro que sumiu e está faltando para garantir verbas do MEC e para o rancho dos recrutas nas Forças Armadas. Não adianta culpar o secretário da Receita Federal, Marcos Cintra Cavalcanti pela fraca arrecadação, que não atende aos gastos que não param de crescer há duas décadas.

O quadro vai continuar difícil em 2020 e 2021. Não há mágica em economia que produza milagres a curto prazo.