ASSINE
search button

Da política até a polícia

Compartilhar

O seminário sobre as distribuidoras de energia privatizadas em 2018, dia 8, no auditório do BNDES, no Rio, deu ampla amostra do pensamento econômico-político-administrativo sobre o papel que segmento do ministério do governo Bolsonaro quer imprimir ao país. Extraio partes do pensamento de quatro presentes para tentar indicar a quinada de 180 graus na maneira de se ver o papel do Estado na vida brasileira.

O ministro da Economia, o ultra liberal Paulo Guedes, bateu duro em distorções do Estado e não poupou os militares por terem criado estatais que teriam fugido inteiramente ao controle. Dirigindo-se ao ministro Santos Cruz, da Secretaria de Governo, único militar presente, já que o ministro de Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, foi representado pela secretária-executiva Marisete Pereira, falou de sua disposição de extinguir as estatais.

"Eu por mim, acabaria com todas, mas o presidente e os generais têm apreço estratégico por algumas estatais. Digo a eles, que criaram algumas delas: "Seus filhos fugiram e estão drogados". Citou casos de empreguismo e corrupção em distribuidoras privatizadas pela Eletrobras em 2018 como exemplo do uso delas para corromper o processo político, com votos mercenários das estatais para favorecer empresários que se beneficiam da máquina do Estado.

"Essa era a velha política. Não sabemos como será a nova política. A velha política de conduzir o Estado criou uma falsa inclusão social que colapsou e foi reprovada pela população (...) Ficamos anos, como Saci Pererê, pulando numa perna só, a esquerda. O país estava cansado. Tem de pular agora do lado direito. Espera quatro anos, deixa um tempinho para a gente".

O general Santos Cruz, escolhido "por ser conhecido do presidente", considera que o papel do governo Bolsonaro é dar credibilidade aos negócios públicos. Para ele, as concessões não podem cheirar a irregularidade, porta de entrada para a "bandalheira e a corrupção". Por isso, justificou, seu ministério recorreu a técnicos do TCU, da Controladoria Geral da União e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional "pessoas de altíssima qualidade", para garantir a "segurança jurídica" das parcerias e concessões e a "honestidade da coisa pública".

Resumiu a sensação de pouco mais de um mês de governo: "parece que passamos por assaltos, gavetas reviradas". Disse que "não acredita na magnitude dos déficits fiscal e da previdência. Se fecharmos um pouquinho a torneira, resolve boa parte". Disse que muitos erros e déficits se acumularam por falta de "responsabilização". Citou a situação de alguns estados, criticou o próprio BNDES (palco do evento) por ter aplicado R$ 50 bilhões em financiamentos de projetos sem retorno, citando Copa do Mundo e Olimpíadas. Para ele, os governos têm de ser transparentes, valorizar o Ministério Público, TCU, Receita. Acrescentou que "a crise não é política, é mais de polícia". Um governo que valoriza a democracia não pode usar dinheiro para "comprar Judiciário ou Legislativo". E voltou a destacar a importância do papel investigativo da imprensa.

Ex-deputado, José Múcio Monteiro Filho, presidente do Tribunal de Contas da União, órgão do Legislativo que fiscaliza atos do Executivo, foi direto, mostrando que os planos dos diversos governos poderiam ir adiante, sem maiores problemas de contestação se passassem por consulta prévia junto ao TCU ou órgãos como CGU, PGR ou PGFN. Múcio fez paralelo entre o papel do TCU e o da polícia, com um recado aos gestores públicos: "se o cidadão procura a polícia, quer proteção; do contrário pode ir como testemunha ou suspeito".

Por fim, Salim Mattar, secretário da desestatização e do desinvestimento, foi mais radical. "Por que o empresário tem de levar concorrência com preço baixo, põe 10% do capital e vai buscar 80% a 90% em financiamento subsidiado no BNDES? Isso não é capitalismo. Empresário tem de correr riscos e disputar os US$ 1,5 trilhões que giram no mundo a juros baixos. É isso que queremos atrair para a infraestrutura do país", disse.

Tags:

polícia