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De Rodrigues a Bolsonaro

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É possível que com este registro alguém concorde. Se a segunda quinzena de janeiro assinala o centenário de morte do presidente Rodrigues Alves, paulista de coração carioca, terceiro civil a assumir a primeira magistratura do país, talvez valesse breve reflexão sobre as preocupações que mais agitavam seu espírito; algumas delas, com certo esforço, permitindo afirmar que têm atualidade. Tendo sido a mais ilustre vítima da gripe espanhola, que havia desembarcado no Rio, em 1918, ele morreria em janeiro do ano seguinte, febril e delirante, na velha casa da Senador Vergueiro.

O que o traz à lembrança, um século depois, quando em sua cadeira assenta-se o presidente Jair Bolsonaro?, frente a alguns desafios e problemas que ensejam certas semelhanças. Nestas, os tempos cuidaram de promover mudanças, mas sem apagá-las totalmente, para confirmar que a História estima preservar suas experiências. Como, certa vez, neste JB, disse Wilson Figueiredo: a História mantém o pudor de não se repetir em vão.

O fato de, antes da República, ter sido conselheiro do Império, e como tal gostava de ser tratado, foi algumas vezes instado a depreciar ou perseguir monarquistas renitentes, que ele conhecia muito bem, jogados na orfandade política. Recusou-se a esse papel, como agora deve recusar o presidente Bolsonaro, a quem é sugerido degola impiedosa de petistas deserdados do poder. São eles hoje o que foram os saudosistas do Palácio São Cristóvão.

Reforma fiscal

Substancial reforma fiscal, como o atual presidente acaba de prometer em Davos, foi, com parecidos conteúdos, o que Rodrigues Alves havia garantido aos ingleses em 1905, quando as libras esterlinas comandavam a economia mundial; mesmo poder que hoje tem o dólar americano. Nesse mister, foi rigoroso, seguindo a cartilha de Campos Sales. Como? Atacando os gastos excessivos do governo, eliminando superficialidades e fechando portas ao empreguismo inspirado por interesses de amigos e parentes. Seria diferente o que tem de se fazer hoje?

Uma situação atual, com nossos estados falidos, pedindo socorro a Brasília, também guarda alguma semelhança: São Paulo, Minas e Rio de Janeiro, signatários do Acordo de Taubaté, queriam que Rodrigues assumisse o déficit das províncias, mas ele mandou que cada qual cuidasse da própria pele.

O enxugamento da máquina administrativa, incluindo a remoção de dificuldades aduaneiras, haveria de render bons negócios com outras nações. O país respondia, então, por 97% da produção de borracha, que teve, no câmbio, o papel que mais tarde seria do café. Se foi a época bem sucedida da austeridade, não é outra coisa que hoje está a reclamar o sonho do desenvolvimento. Com os rigores do erário, realizou obras importantes, além de se dar ao luxo de comprar o Acre aos bolivianos.

O Rio devedor

“Duas coisas que mais me preocupam: o saneamento e o porto do Rio de Janeiro”, disse Rodrigues; e tão disposto a isso, que na campanha de vacinação contra a febre amarela não ensaiou autorizar a polícia a invadir as casas e imunizar, à força, se preciso. Mesmo com violência e a revolta popular, os cariocas ficaram devendo a ele e a Oswaldo Cruz a vitoriosa guerra contra epidemias, a criação de redes de esgotos, saneamento da zona portuária e remoção de cortiços insalubres.

Seu governo, graças à probidade, com o apoio do prefeito Pereira Passos, aplicou recursos em várias obras na então capital da República, como a urbanização de avenidas, tornadas mais largas e arborizadas, para imitar Paris...

“Penso que jamais se deve colocar em plano inferior a necessidade de uma boa e sã organização político-eleitoral”

(Rodrigues Alves, discurso de posse, novembro de 1902)

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