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Um filho teu não foge à luta

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Bem dizia Vinícius de Moraes, em seu poema “Enjoadinho”: “Filhos? Melhor não tê-los, mas se não os temos, como sabê-los?”. Espero que meus pais tenham tido orgulho dos oito filhos e que tenhamos correspondido aos esforços para nos dar formação escolar (quando a escola pública não tinha perdido a qualidade) e de caráter para progredir na vida. E que o presidente Jair Bolsonaro e o vice, Hamilton Mourão, não colham dissabores que comprometam a confiança dos 57 milhões de eleitores, dez milhões a mais que Fernando Haddad, do PT.

Por ora, dos cinco filhos, só a pequena Laura, de oito anos, e o jovem Renan, de 20 anos, ainda não criaram incômodos ou se envolveram em episódios desgastantes para a imagem da família presidencial. Diante do empenho que tiveram na campanha para eleger o pai, os três mais velhos estão com crédito paterno. Mas isso não lhes assegura salvo conduto e plena liberdade. Muito ao contrário. Como detentores de mandatos públicos devem satisfação à opinião pública e a seus entusiasmados eleitores que acreditaram no discurso da ética e da probidade.

Como ensina a história, à mulher de Cesar não basta ser honesta. É preciso parecer honesta. As estrepulias de Fabrício Queiroz, assessor do filho mais velho, Flávio Bolsonaro deputado do PSL-RJ e senador eleito pelo RJ, podem criar embaraços futuros. O filho do vice-presidente, Antonio Rossel Mourão, funcionário graduado da diretoria de Agronegócios do Banco do Brasil, não recebeu promoção para R$ 36,3 mil mensais, quase o triplo do que recebia antes pelos seus belos olhos azuis, que aliás não os tem. O novo presidente do BB, Rubem Novaes, que ganha R$ 68,781 mil mensais, até poderia nomeá-lo para uma das vice-presidências (12 no governo Temer), ganhando R$ 61,564 mil, ou para uma das 27 diretorias, consumindo R$ 52,1 mil. Mas, mesmo com os 18 anos de experiência no banco, aí seria demais. Se o BB enxugar o número de diretores e vices, quem sabe, em dois anos, o filho dileto de Mourão ganhe uma promoção?

Em meus 69 anos incompletos já vi e ouvi histórias de muitos filhos ou parentes próximos que trouxeram aborrecimentos a presidentes. Getulio Vargas teve uma filha austera e exemplar, a Alzirinha, mas o irmão Benjamin, o Bejo, aumentou os dissabores no segundo mandato, que culminou com o gesto extremo. JK, que sucedeu a Vargas, apesar da ferrenha oposição, nada teve de desabonador da parte das duas filhas e genros. Jânio Quadros, que blefou numa renúncia em agosto de 1961, um autogolpe, para o qual contava com o apoio das Forças Armadas e da população, que o elegera dez meses antes, deu-se mal quando o presidente do Senado, Auro de Moura Andrade leu a carta de renúncia e declarou o cargo vago. As desavenças com a filha Tutu Quadros vieram à tona quando foi eleito prefeito de São Paulo. Seu sucessor, o vice, João Goulart, tinha filhos pequenos, que foram poupados. O jogo contra o ex-presidente que queria fazer várias reformas no país, era bem mais pesado, como se revelou em 1964.

No regime militar, o austero marechal Castelo Branco tinha a filha que acompanha o presidente viúvo. Não vale dizer que a censura e o temor dos anos de chumbo tenham tolhido as denúncias. Alcio Costa e Silva e depois, Roberto Médici, filho do general Garrastazu, foram alvos de denúncias logo sufocadas pelo poder de fogo da presidência. Geisel tinha uma filha, Amália Luci, discretíssima. O filho do general Figueiredo, Johnny entrou na área de risco quando se casou com a filha de um sócio do bicheiro Castor de Andrade, na Metalúrgica Castor.

Dos filhos de Sarney, melhor fala a frase que o presidente disparou quando a filha Roseana se separou certa feito de Jorge Murad: “ele se separou da Roseana, mas continua casado (sic) comigo”). Collor era jovem e impetuoso, agia como se um filho fosse e deu no que deu. FHC correu riscos com certas atitudes deslumbradas do filho Paulo Henrique que poderiam ter lhe valido muitas acusações de tráfico de influência. Cuidados que Lula não teve em relação ao filho Lulinha, da Gameccorp. Michelzinho era pequeno, mas a filha Maristela teve a reforma da casa paga pelo amigo coronel Lima. Todo cuidado é pouco.