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Ausências

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Se o presidente eleito este ano tivesse sido qualquer um dos candidatos que concorreram, inclusive o exótico cabo Daciolo, uma de suas prioridades seria, sem dúvida, a pacificação política do Brasil, tema do discurso de todos. Mas venceu Bolsonaro, que continuou no palanque depois de eleito, fustigando adversários. A ausência de partidos representativos em uma posse presidencial não é bom augúrio. Não o foi para Dilma, que teve a segunda posse boicotada pelo PSDB e o DEM em 2014. Mas foi Bolsonaro, com sua postura beligerante mesmo depois de eleito, que deu motivos justos ao PT e ao PSOL para não comparecerem.

Nas redes sociais, militantes bolsonaristas festejaram a ausência dos dois partidos, desejando que desapareçam de vez da cena política. Reproduzem falas de Bolsonaro, que no dia seguinte ao primeiro turno prometeu “varrer” os vermelhos, mandando-os para a prisão ou o exílio. Em setembro, no Acre, prometeu “fuzilar a petralhada”. A liquidação do adversário é própria dos golpes de Estado e das revoluções, mas Bolsonaro foi eleito dentro das regras democráticas, conquistando o poder pelo princípio da alternância. Na democracia, a posse e o juramento da Constituição diante do Congresso são um ritual de forte conteúdo simbólico: nele, os representantes do povo é que consagram o eleito, entregando-lhe o poder mediante compromisso solene, que inclui o de governar dentro do sistema político vigente. Ainda que na campanha o candidato o tenha combatido.

PT e PSOL, partidos de oposição com assento no Congresso, representam uma parcela do povo brasileiro, ainda que tenham sido derrotados na disputa presidencial. Tal condição se aplica ainda mais ao PT, que disputou o segundo turno com Bolsonaro e elegeu o maior número de representantes do povo na Câmara dos Deputados. A ausência PT e PSOL, na posse, é indicativa de que a polarização vai continuar e se agudizar e que Bolsonaro enfrentará oposição renhida. Para um governo que nem dispõe de uma base parlamentar orgânica, não é bom presságio. Como não foi para Dilma a ausência do DEM e do PSDB, já tendo este último pedido a impugnação de sua chapa. O filme ameaça repetir-se. Não se pode acusá-los de estar questionando a legitimidade do presidente eleito. Os dois partidos declaram respeito à vontade popular expressa nas urnas mas apontam fortes razões políticas para não comparecer. “O governo que se iniciará no próximo dia primeiro tem como princípios o ódio, o preconceito, a intolerância e a violência”, diz a nota do PSOL. Quem haverá de negar que tais elementos permeiam o discurso de Bolsonaro ainda hoje? A nota do PT é mais prolixa: “Participamos das eleições presidenciais no pressuposto de que o resultado das urnas deve ser respeitado, como sempre fizemos desde 1989, vencendo ou não. Mantemos o compromisso histórico com o voto popular, mas isso não nos impede de denunciar que a lisura do processo eleitoral de 2018 foi descaracterizada pelo golpe do impeachment, pela proibição ilegal da candidatura do ex-presidente Lula e pela manipulação criminosa das redes sociais para difundir mentiras contra o candidato Fernando Haddad.” Completa a justificativa afirmando: “O resultado das urnas é fato consumado, mas não representa aval a um governo autoritário, antipopular e antipatriótico, marcado por abertas posições racistas e misóginas, declaradamente vinculado a um programa de retrocessos civilizatórios. O ódio do presidente eleito contra o PT, os movimentos populares e o ex-presidente Lula é expressão de um projeto que, tomando de assalto as instituições, pretende impor um Estado policial e rasgar as conquistas históricas do povo brasileiro”. O fará Bolsonaro ninguém sabe mas quem poderá negar seu ódio a Lula e ao PT? Até na camiseta de sua mulher ele aparece.

Bolsonaro, inebriado pelo encontro com Netanyahu, ignorou o boicote. O filho Carlos criticou, mas foram eles que envenenaram o ambiente da posse.

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bolsonaro | coisa | lula | tereza