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Vice esvaziado

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Anunciado ontem pelo presidente eleito como ministro-chefe da Secretaria de Governo, o general Carlos Alberto Santos Cruz acreditou que, apesar do inusitado, seria encarregado da coordenação política, atribuição atual da Secretaria. Fora do país, não chegou a discutir sua missão com Bolsonaro. A equipe de transição esclareceu depois que ele fará a coordenação de governo e isso parece significar que o vice-presidente eleito, general Mourão, não exercerá mais esta função, como chegou a ser ventilado. Resta saber se a mudança de planos tem relação com recentes declarações do vice, em clara divergência com Bolsonaro.

Santos Cruz já havia aceitado o convite do futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, para chefiar a Secretaria Nacional de Segurança Pública, e ontem foi surpreendido, em Bangladesh, pelo convite de Bolsonaro, numa evidência de que o novo arranjo palaciano foi coisa repentina. “O presidente tem prioridade”, justificou o general.

Até então, esperava-se que, dentro do esforço de enxugamento dos ministérios, a Secretaria de Governo fosse extinta. A Casa Civil de Onyx Lorenzoni cuidaria tanto da coordenação política como do monitoramento das ações de governo. Na semana passada, fontes da equipe de transição informaram que estava sendo estudada a transferência, para a vice-presidência, das tarefas de coordenação dos ministérios e das ações de governo. Neste desenho, Mourão comandaria duas das atuais subchefias da Casa Civil – a de análise e acompanhamento de políticas governamentais e a de articulação e monitoramento. Os projetos vinculados ao PPI (Programa de Parcerias para Investimentos) e ao PAC também ficariam sob sua gerência. Com tais atribuições executivas, seria um vice fortíssimo.

Depois das declarações polêmicas que deu no curso da campanha, e do silêncio imposto por Bolsonaro, o vice havia recuperado a desenvoltura e vinha cumprindo missões importantes, inclusive a de conversar com investidores. Mas em entrevista à colunista Mônica Bérgamo, publicada pela Folha de S. Paulo na última sexta-feira, Mourão externou discordâncias importantes com Bolsonaro, sobretudo em política externa, passando a ser apontado como contraponto aos excessos ideológicos.

Falando sobre as relações com os EUA, pontuou que “não podemos nos descuidar do relacionamento com a China”. Admitindo a semelhança entre Trump e Bolsonaro, emendou: “Nós podemos comprar as brigas que podemos vencer. As que a gente não pode, não é o caso de comprar. Uma briga com a China não é uma boa briga, certo? Tenho certeza absoluta de que nós não vamos brigar —34% das nossas exportações são para a China. Não podemos fechar esse caminho pois tem outros loucos para chegarem nele.” Disse ainda que a transferência da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, “é uma decisão que não pode ser tomada de afogadilho, de orelhada. E que, “antes de pensarmos em extinguir, derrubar, boicotar” o Mercosul, é preciso “fazer os esforços ainda necessários para que atinja os seus objetivos.” Ao Financial Times, havia dito que “às vezes o presidente tem uma retórica que não combina com a realidade”.

Com a entrega da coordenação de governo ao outro general, não é Lorenzoni que se enfraquece, pois já havia perdido a coordenação de governo para Mourão. Quem perde é o vice, seja ou não por conta de suas falas divergentes, por sinal muito sensatas.

Cerco

Lula foi denunciado mais uma vez pelo Ministério Público. Ninguém se iluda. Antes mesmo da posse do novo governo, a Lava Jato já entrou em fase de recrudescimento. Mais petistas devem ser denunciados e presos. O inverno ainda nem começou.

A bomba

E Temer sancionou o aumento do Judiciário, mesmo sabendo de seu impacto sobre o deficit. Deve ter pensado: Se o futuro governo não se mexeu para evitar a aprovação no Senado, porque irei eu, tão encalacrado, contrariar o Judiciário?