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A interrogação

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Que rumo tomará a campanha depois da facada em Jair Bolsonaro? Esta é a pergunta que não cala e que ninguém pode responder agora. Ele poderia estar morto, mas sobreviveu, e retomará a campanha. Se não nas ruas, pelo menos no campo que domina, o das redes sociais. No seu caso, a TV conta pouco, pois dispõe de apenas oito segundo. E como voltará Bolsonaro? Raivoso, acusando os adversários e tocando fogo na campanha? Ou mais comedido e pragmático, tentando tirar proveito da condição de vítima que agora pode ostentar? E suas hostes, como irão se comportar?

A comoção é natural. No Brasil já aconteceram atentados e assassinatos de candidatos, mas não nestes 33 anos posteriores à redemocratização. Trata-se, pois, de algo sem precedentes na memória dos contemporâneos. Mas, pensando bem, houve uma escalada da violência política nos últimos anos, de pouca repercussão porque restrita ao plano municipal. Nas eleições de 2016, pelo menos vinte candidatos a prefeito e a vereador foram assassinados, sendo 14 no estado do Rio de Janeiro. Entre 2017 e 2018, 40 prefeitos e ex-prefeitos, vereadores e ex-vereadores foram mortos. Nesta conta está Marielle Franco, um caso que ganhou repercussão nacional e internacional por sua militância na área de direitos humanos e pela violência da execução, cujos autores ainda não foram identificados. Logo depois houve o atentado a tiros contra a caravana do ex-presidente Lula, também não esclarecido até hoje.

Do caldo fermentado pela radicalização dos anos recentes, temperado por ódios e ressentimentos, surgiu o próprio Jair Bolsonaro, agora vítima do extremismo que representou e pregou.

Vitimização e voto

Até aqui, foi Lula que cresceu na condição de vítima, como único réu importante da Lava Jato encarcerado e impedido de disputar a eleição. Os eleitores fazem as contas, vêm que os outros estão por aí, livres e candidatos. A mística do perseguido pegou, consolidou o favoritismo de Lula. Mas agora é Bolsonaro que emerge como vítima de outra natureza, como aquele que tentaram matar para que não se elegesse. Se ele já tinha votos para chegar ao segundo turno, agora será muito difícil evitar que chegue lá.

Neste sentido, quem mais perde é o tucano Geraldo Alckmin. Brigando pela vaga, nos últimos dias ele abriu fogo contra Bolsonaro, com sua fartura de inserções no rádio e na TV. O candidato do PSL perdeu no TSE a tentativa de proibir umas das peças mais agressivas da campanha do tucano. Ela reproduz vídeos em que ele aparece hostilizando a deputada Maria do Rosário e uma jornalista. Chama a primeira de vagabunda e a segunda de analfabeta. A peça se encerra com a pergunta: “Você gostaria de ter um presidente que trata as mulheres como Bolsonaro trata?” Se Alckmin não vinha conseguindo recuperar os eleitores tucanos que migraram para a extrema direita, depois do atentado pode ficar ainda mais difícil.

Mas pode sobrar também para o PT, na hora crucial em que trocará oficialmente Lula por Fernando Haddad e dará início ao esforço hercúleo para promover a transferência de votos. Bolsonaro cresceu cavalgando o antipetismo. No sábado, prometeu “fuzilar a petralhada do Acre”. A primeira reação de seus seguidores, nas redes sociais, foi acusar o PT. Na primeira hora, seu candidato a vice, general Hamilton Mourão, sem dispor de qualquer indício, disse ao repórter Eduardo Barreto, da revista de direita Crusoé: “Eu não acho, eu tenho certeza, o autor do atentado é o PT”. Deste veneno o PT já provou. Em 1989, após prender os sequestradores do empresário Abílio Diniz, a polícia difundiu na mídia a informação de que material da campanha de Lula fora apreendido no cativeiro, sugerindo envolvimento do PT no sequestro. Lula perdeu milhões de votos com a suspeita que foi desmentida depois da eleição.

A imprevisibilidade, marca desta campanha, agora foi turbinada.