Ivan Camargo, Jornal do Brasil
RIO - A polêmica de Belo Monte, em sua essência, está relacionada à necessidade de usar o potencial energético dos rios da Amazônia.
O problema da expansão do parque gerador de energia elétrica é complexo. As dimensões sociais, ambientais e econômicas têm que ser levadas em consideração para se obter uma solução razoável. Convém, no entanto, comparar as diversas possibilidades de atendimento da carga para escolher a melhor. Não adianta eliminar, a princípio, uma fonte sem ter uma proposta concreta de garantia de suprimento.
Analisando o que vem ocorrendo no setor elétrico, observa-se como a sua característica mais marcante um enorme crescimento da carga. Ela vai continuar crescendo. O brasileiro ainda consome pouca energia elétrica. Se, como todos esperam, houver maior distribuição de renda, mais trabalho, mais educação, o consumo de energia elétrica vai acompanhar esse crescimento. Tudo indica que vamos precisar instalar cerca de 50 mil MW em novas usinas nos próximos dez anos.
A expansão, nos últimos dez anos, se deu da seguinte forma: 53% hidráulicas, 45% térmicas e 2% eólicas. Seria uma relação fantástica para qualquer país do mundo. Não é para o Brasil. Houve um incremento exagerado das fontes térmicas. O nosso parque gerador é invejável: quase 90% da produção de energia elétrica são renováveis. Para manter essa proporção na expansão temos que radicalizar no apoio às fontes renováveis.
Concordo com os ambientalistas que afirmam que a energia eólica produz menor impacto que a hidráulica. Seria razoável, portanto, um forte incentivo a essa forma de produção. Digamos, numa hipótese exagerada, que passemos dos 2% da década passada para 20% nos próximos 10 anos. A indústria nacional teria que instalar 10 mil MW em usinas eólicas. Nem esse enorme esforço hipotético seria capaz de atender ao aumento da carga.
Tanto do ponto de vista ambiental como econômico, é preciso tentar reduzir ao máximo a expansão das fontes geradoras que usam combustíveis fósseis. Além de caros, produzem uma quantidade enorme de gases de efeito estufa. A título de comparação, se a usina de Belo Monte não fosse construída, para gerar a mesma quantidade de energia usando carvão mineral, seria necessário queimar 45 mil toneladas de carvão por dia. Desta forma, mesmo sabendo que as usinas hidrelétricas causam problemas ambientais, a pergunta correta seria: qual usina causaria menor impacto?
Para manter a característica renovável da nossa matriz energética e garantir o atendimento da carga futura, temos que usar o potencial dos rios da Amazônia. Ninguém tem dúvida da importância estratégica da floresta nem da necessidade da sua preservação. O que se espera é um aproveitamento energético com o mínimo impacto ambiental.
A responsabilidade pelo planejamento energético do país é do governo. Se faltar energia, as organizações ambientais não serão chamadas para justificar o racionamento. É preciso que a discussão sobre a matriz energética seja mantida, mas isso não pode levar ao imobilismo.
Não tenho acesso a todos os dados do governo nem a todas as possibilidades de expansão. Se a opção for entre usinas térmicas ou hidráulicas, não tenho dúvida: eu fico com a segunda.
Ivan Camargo é professor do departamento de engenharia UnB.