Carlos Thadeu de Freitas, Jornal do Brasil
RIO - Na medida em que o círculo vicioso entre setor financeiro e economia real se intensificou, as análises prospectivas mais pessimistas para a economia americana e global se tornaram realidade e as projeções para o crescimento econômico nos próximos anos são revisadas novamente para baixo.
Até o último trimestre de 2008, a crise estava localizada no setor financeiro de alguns países, como alguns efeitos adversos sobre a economia real localizados nos países mais ricos, devido a restrições no mercado de crédito, mas sem afetar seriamente os países emergentes. A partir de setembro do ano passado, o mercado financeiro entrou em colapso, a crise financeira evoluiu para uma crise de confiança e ganhou proporções globais.
Países emergentes, até então vistos como um porto seguro em meio às turbulências, começaram a ser atingidos pelo aumento da aversão ao risco e pela desalavancagem das grandes instituições financeiras internacionais, através da redução dos capitais externos disponíveis e pressões nos mercados de câmbio.
No Brasil não foi diferente. Antes da intensificação da crise, as projeções dos analistas coletadas pela pesquisa Focus do Banco Central para o crescimento do PIB em 2009 registravam média de 4%. Desde então, as projeções estão sendo constantemente revisadas para baixo. Em dezembro de 2008, a mediana esse indicador era de 2,35%. No final de março passou a ser negativa. Em 17/04, atingiu o seu nível mais baixo: -0,49%. Na última semana, as projeções voltaram a subir, registrando -0,16 na mediana.
Recentemente, o FMI divulgou o World Economic Outook, publicação trimestral que representa um raio X da economia global, na qual a conjuntura da economia mundial é avaliada e análises sobre questões e desafios do momento são feitas. As conclusões da publicação não são nada animadoras. Para a América Latina, o relatório ressaltou que, comparado ao o que ocorreu em turbulências passadas, a maioria dos países estão enfrentando a crise relativamente bem. Mesmo assim, o PIB da região deve se retrair 1,5% em 2009. O Brasil, de acordo com o relatório, terá desempenho acima da media da região, com queda de 1,3%.
No passado, o país apresentou grande vulnerabilidade a choques externos. A dívida publica foi fortemente indexada ao dólar e a necessidade de financiamento externo, elevada. Hoje, acumulamos reservas e somos credores em dólar, e apesar da queda das receitas com exportações, as importações apresentaram recuo maior e o déficit em transações correntes caiu em relação ao ano passado.
Além da redução do passivo externo, hoje a dinâmica da dívida pública federal é benigna. Ao contrário de crises passadas, a dívida líquida do setor público em relação ao PIB caiu com a alta do dólar. Ao mesmo tempo, com a Selic em queda, os juros incidentes sobre a dívida serão menores. Esses fatores tornam o efeito da provável redução do superávit primário proveniente da queda da arrecadação fiscal menos nocivo.
A dinâmica do atual ciclo econômico está na demanda doméstica. Apesar do crescimento das transações de comércio com o resto do mundo, o fluxo de comércio internacional como proporção do PIB é baixo, quando comparado a outros países emergentes. Desta forma, o impacto da redução da demanda externa por produtos brasileiros e da queda dos preços das commodities será amortecido pela demanda interna ainda robusta. Apesar do tombo da indústria e da queda de investimentos, o consumo apresenta desaceleração moderada. Os setores de varejo e serviços pessoais foram menos afetados, salvo aqueles fortemente dependentes do crédito.
E por último, o rápido aumento do excesso de capacidade ociosa e ajuste dos estoques reduzem as pressões inflacionárias enquanto a demanda interna estiver em desaquecimento, dando mais folga para a política monetária.
* Carlos Thadeu de Freitas é economista.