Os encenadores alinhados com a investigação da linguagem e multiplicidade de meios expressivos submeteram suas ideias à liquidificação cênica-dramatúrgica. Assim foi com Devassa , com Otro , híbrido teatral de Enrique Diaz, que construiu uma alteridade performática, e com Tentativas contra a vida dela – 17 situações para o teatro , a visão de Felipe Vida para o jogo de desmonte do inglês Martin Crimp.
O que em 2009 foi uma característica dominante na cena carioca se repete um ano depois. A cenografia e os demais aspectos visuais tiveram papel integrante na composição dos espetáculos em cartaz nos últimos 12 meses. Mistério bufo se destacou pela cenografia de Sérgio Marimba, com vitrine que expunha a feira de tipos e a arca integrada à ação dramática. Os figurinos de Rosa Magalhães são outro destaque. O cenário de Aurora dos Campos para RockyAntygona imprime horizontalidade à cena, estabelecendo profundidades, planos e transparências de sofisticado impacto. Paulo Moraes e Carla Berri provaram, tanto em Antes da coisa começar quanto em Mente men tira , que têm ótima parceria no desenho de cenários.
Flávio Graff foge do realismo em O deus da carnificina , com a colorida mesa recoberta com peças de Lego. O inventivo cenário de Fernando Mello da Costa para Histórias de amor líquido utiliza, como poucas vezes se viu nos palcos, projeções com certeiro efeito dramático e qualidade técnica. Os vídeos, criados por Rico Vilarouca e Renato Vilarouca, são elemento fundamental para alcançar esse efeito. E André Cortez conferiu refinamento no visual de Restos .
Outra das tendências que se confirmaria este ano foi a presença cada vez mais numerosa de musicais, um sucesso de público, que fixa o gênero, artística e comercialmente entre nós. As grandes montagens como Hair e Gypsy trouxeram a marca de Charles Möeller e Claudio Botelho, que continuam a selecionar ótimos atores-cantores-bailarinos e a aclimatar as montagens da Broadway pela sensibilidade de seu profissinalismo. Além de A gaiola das loucas e de outros musicais de tamanhos diversos – É com esse que eu vou e Fascinante Gershwin –, e a direção musical de Jacques Morelembaum e Jaime Alem em Or feu referendaram a qualidade dos espetáculos e a adesão das plateias ao gênero.
E entre tantas propostas e diversificação de estilos, os atores tiveram oportunidade de exercer suas competências.
Mariana Lima reafirma a brilhante atriz que demonstra ser em Pterodátilos , ao lado do não menos competente Marco Nanini. Totia Meireles ganhou o protagonismo em Gypsy , enquanto André Dias se destacou em Era no tempo do rei . Julia Lemmertz revela ótimos momentos em Deus da carnificina .
Gustavo Gasparini e Solange Badim deixam seu perfil de comediantes na despretensiosa O pintor . Em registro oposto, o de tragicidade contemporânea, Larissa Bracher foi uma Antí gona atualizada.
Dani Barros farsesca em Co chambranças de Quaderna e caricata em Maria do Caritó deixa imagens divertidas. Assim como Josie Antelo, em Doidas e santas . Zécarlos Machado exibiu a sua integridade interpretativa com maturidade e domínio de seus meios expressivos em Mente mentira .