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Conversando com o pianista Miguel Proença

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A coluna conversa hoje com o pianista gaúcho Miguel Proença,um dos mais expressivos pianistas brasileiros que festeja a música clássica brasileira, fazendo gravações importantes de ciclos e integrais da literatura nacional para o piano. Vamos saber mais de Proença,casado com a também pianista Marly Proença e pai de três filhos e avô de dois lindos netos. 

Miguel, você fez seus estudos de aperfeiçoamento na Alemanha e como você utiliza a sua experiência de pianista e de professor na atualidade brasileira?

Após exercer o meu cargo de Professor Visitante na Escola Superior de Música de Karlsruhe, onde orientei uma classe internacional de pianistas que hoje fazem carreira internacional, retornei ao Brasil, onde continuo minha atividade de professor, trabalhado sempre com pianistas brasileiros e de outros países que me procuram para preparar repertório para recitais, concursos internacionais. No momento, estou envolvido com um projeto, na Fames, Faculdade de Música do Espírito Santo - o Núcleo de Excelência Pianística, idealizado por mim, onde sou orientador pedagógico e artístico. Este núcleo de excelência está atraindo o interesse de pianistas brasileiros e de outros países que agendaram participações nas aulas públicas que realizo mensalmente na Fames, em Vitória (ES).

Maiores detalhes sobre o Núcleo com a sua coordenadora, Paula Galamo: 027 - 36363608 (secretaria) ou com Erlon Paschoal:  <[email protected]>  

A música de câmara é uma realidade para poucos, saber construir um novo conjunto é uma dávida de sabedoria.Quais foram suas mais expressivas experiências como camerista?Tive grandes oportunidades para atuar como camerista ao lado dos maiores solistas e professore nacionais e internacionais. Atuei em concertos em recitais como camerista ao lado de Salvatore Accardo, Paul Tortelier, Leonard Rose, Boris Belkin, Arto Noras, Zvi Zeitlin, Yanos Starker, Maria Lucia Godoy, Aldo Baldim, Gaziella Ciutti, Jean-Pierre Rampal, Aurèle Nicolet, Yong Uck Kim, José Botelho, Quarteto Bessler, Zigmunt Kubala, Antonio Meneses, entre outros. Com estes grandes artistas, desenvolvi a arte da comunicação verdadeira entre dois ou mais músicos através do fraseado musical e da sonoridade,  interpretando as grandes obras do repertório camerístico. 

O Brasil era conhecido por exportar grandes pianistas como você,Nelson Freire,Arnaldo Cohen,Antonio Guedes Barbosa,Edson Elias,para falar somente da lista masculina. E agora? Onde estão os pianistas da nova geração? 

Os pianistas da nova geração estão ocupados com  seus computadores, escrevendo teses intermináveis de mestrado ou doutorado, orientados pela aridez acadêmica, que afasta os talentos da performance e do convívio com os seus instrumentos, impedindo-os de enriquecer seus repertórios para a performance e descobrir os segredos de sua relação com o instrumento (pois performance significa, acima de tudo, isso: conquista e descoberta subjetiva constante e renovada do instrumento e da sonoridade em troca com o outro), desenvolvendo as grandes qualidade que o público exige na hora de ouvir música. O público não deseja ouvir 'doutores' e sim os grandes talentos que nós sempre teremos, mas que agora estão cumprindo exigências acadêmicas pro-forma que hierarquizam as relações de saber, e que aparecem consequentemente como exigência de mercado (os títulos). Não tenho nada contra o estudo aprofundado da cultura musical em seus vários aspectos, mas a performance, do ponto de vista seco e intelectualista, está sendo, e sempre foi, neutralizada  e colocada em segundo plano pela academia. Mesmo em se tratando de "pesquisa", ela não é valorizada de fato, dou um exemplo pessoal desse espírito apequenado que muitas vezes pretende fazer do estudo da música algo parecido com um  exercício cartesiano, quero dizer, ao ponto de excluir a própria música, ouvida e tocada. Dou-lhe um exemplo pessoal:

Quando participei de um concurso para o cargo de Professor Adjunto para a UERJ, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, no item  "trabalhos publicados", apresentei o resultado de doze anos de pesquisa e registro musical em gravações: o lançamento de uma coletânea com obras para piano dos maiores compositores brasileiros nomeada "Coletânea Piano Brasileiro" (Biscoito Fino) e que recebeu o prêmio da UNESCO como "Patrimônio da Música Brasileira". Curiosamente, esse trabalho não foi aceito pela banca, pelo simples fato de não ser trabalho escrito na forma de artigo ou livro! Isto me parece uma inversão, significaria jogar fora, devastar, não reconhecer 90% do que produzimos aqui na forma de 'artes performáticas'. Dentro dessa perspectiva pobre, a obra de um Chico Buarque de Holanda, por exemplo, iria automaticamente para o lixo.

 Muito obrigada pela conversa Miguel.