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Pensar fora da caixa

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O discurso estrito de mais verbas para ciência e tecnologia está se tornando insuficiente para manter e ampliar o esforço do Pais em inovação. Na verdade, os recursos públicos nunca foram à altura das necessidades de alavancar uma nova economia, e agora escassearam. Os investimentos públicos caíram. Ou seja, hoje não há de onde remanejar sem canibalizar outras politicas publicas. Estamos presos a uma armadilha, a do corte como solução para manter a lógica financeira da economia. Exatamente por isso, uma fonte de recursos está intocada, a de juros. A renda do capital financeiro não produtivo. Apenas uma melhor repartição de impostos será uma alternativa.

Vejamos: o déficit fiscal do governo foi de R$ 159 bilhões em 2016 (BACEN). E tende a manter-se elevado devido à recessão suicida provocada pelo próprio governo ao querer baixar a inflação elevando os juros. O aumento do desemprego e a queda de arrecadação são alguns dos efeitos visíveis. Não há superávit à vista que possa ser utilizado nas políticas sociais. Essa intocável conta de juros no ano passado estava em R$ 318 bilhões. Apenas 1% deles seria suficiente para repor o orçamento do MCTIC em 2017. Um governo sem recursos gasta um bilhão de reais por dia com juros!

Uma pequena minoria vive de ganhos financeiros crescentes.  Entre 2010 e 2014, o lucro líquido dos 10 maiores bancos cresceu 22%, o PIB menos de 10% (BACEN).

O discurso de mais verbas não revela a causa essencial do problema. Ou seja, a de pagarmos despesas exorbitantes com os juros. O foco é a falta de prioridade do atual governo, o que não deixa de ser verdade. Mas não se aponta para a conta de juros a maior do mundo, a revelia da maioria da população e do futuro da nação.

Assim, deixa-se de atrair mais segmentos sociais prejudicados pela mesma causa que poderiam se engajar através de um discurso educativo e esclarecedor. Infelizmente tem-se optado por um discurso maniqueísta que tenta frear apenas a desídia das autoridades. Um discurso dentro da caixa...

É preciso com coragem enfrentar o âmago da questão. Enfrentar o modelo de economia periférica que não requer ciência, nem tecnologia, nem inovação, apenas servir de exportador de bens primários e consumidor de manufaturados.

Se a indústria é o motor da inovação e esta é uma corrida mundial, estamos perdendo essa corrida há décadas. Nos desindustrializamos precoce e aceleradamente. O PIB da indústria já foi 22% (1980), hoje está abaixo de 10%, similar ao de 1947 (IBGE). Éramos o 40º lugar em inovação em 2007, caímos para o 69º em 2016 (Global Innovation Index).

A nação precisa despertar para mudar esse modelo econômico que se esgotou. Ele já demonstrou ser incapaz de promover uma indústria de base tecnológica e suas politicas sociais. Optou pelo investimento financeiro, não pelo produtivo. O movimento contra os cortes de verbas para ciência tem condição privilegiada de enxergar essa realidade do País. O CONFIES, que reúne as fundações de apoio às universidades, já o fez.

Só assim poderá florescer uma indústria tecnológica que demande pesquisa e mão de obra qualificada. Aliás, enquanto puderem ser produzidos nas nossas universidades, afinal elas estão à beira de um colapso pela mesma falta de recursos.

Disso dependerá uma melhor inserção no mercado mundial, geração de empregos qualificados, renda e recursos para financiar a educação, pesquisa e inovação.

*Fernando Peregrino é Presidente do CONFIES e Diretor de Orçamento da COPPE