Ainda hoje, no veículo mais abrangente do país, o Ministro Luís Roberto Barroso, em entrevista à página 5, do Caderno País, reprova o modelo político atual, com a especial assertiva de que “incentiva o pior nas pessoas ” Dentre outros pensamentos esboçados na matéria, merecem destaque:
“...não vamos mudar o patamar da política no Brasil. Ela vai continuar não representativa...”
Há de haver outros motivos e causas para esta consequência anticonstitucional. Uma delas: “Em tempos recentes, a intrusão no assim chamado setor público pelo setor ostensivamente privado tornou-se lugar comum. Através do mais completo domínio da administração corporativa, é natural que estenda seu papel à política e ao governo. ” (1 – Galbraith- pág. 35/36) A superposição do regime representativo, em base ampla, a essa inadequada estrutura econômica e social..., incorporado à cidadania ativa um volumoso contingente de eleitores incapacitados para o consciente desempenho de sua missão política, vinculou os detentores do poder público, em larga medida, aos condutores daquele rebanho eleitoral. ” (2 – Nunes – pág. 278/279).
“Todas as pessoas trazem em si o bem e o mal. O processo civilizatório existe para reprimir o mal e potencializar o bem. ”
O ponto de partida da ética de Aristóteles é a tese de que todas as técnicas, todas as investigações científicas, todas as escolhas e todas as ações têm por objetivo a realização de algum bem, definindo o bem como aquilo para que todas as coisas tendem... A ciência que investiga o fim último das ações humanas é a política, a quem cabe dizer-nos o que devemos ou não fazer (política no sentido amplo) (3 –A.A. Munhoz- in Curso de Filosofia Política – pág.134).
“O modelo incentiva o pior nas pessoas... É impossível alguém achar que esse (sic) sistema é (sic) bom. ”
Há ainda os favores pessoais de toda ordem, desde arranjar emprego público até os mínimos obséquios. A precariedade das garantias da magistratura e do ministério público (ou sua ausência) e a livre disponibilidade do aparelho policial sempre desempenharam a este respeito saliente papel, de manifesta influência no falseamento do voto, e esta prática -atenuada, é certo – ainda subsiste. A utilização do dinheiro, dos serviços e dos cargos públicos, como processo usual de ação partidária, também se tem (sic) revelado de grande eficácia na realização dos mesmos objetivos. (4 – Nunes – pág.60 e 280).
“A venda de uma medida provisória ou pedir participação na desoneração ou num financiamento dado pelo BNDES, pedir propina, isso não é criminalização da política. Isso é crime mesmo! ”
O cinismo, nesses últimos tempos, chegou ao grau inimaginável da defesa do denominado Caixa 2, nada mais nada menos que fraude escritural de que saem as fantasias sonegatórias e as práticas do financiamento político ilegal. É público. É notório. É humilhante.
“Ele - ao referir-se ao Procurador Geral - não participa do pacto do compadrio que sempre caracterizou a classe dominante brasileira. ”
Menos de metade de página de um jornal. Um instigante resumo de toda a nossa história sociopolítica, como se extrai dos textos complementares em cotejo, extraídos das obras abaixo mencionadas. Um oportuno exemplo de ética, com o silêncio sobre comportamento de pares.
O despreparo do eleitor brasileiro começa pela mais decepcionante inconsciência do papel que pode desempenhar no processo de estruturação do poder. Esta circunstância, como já se vê há muito, vem a reboque de um sistema educacional trágico. As faculdades se multiplicam pelas esquinas da falsidade pedagógica, enquanto o ensino básico destrata o docente e o discente, relegando-os à mais cruel indiferença.
Victor Nunes Leal, nas últimas palavras de sua obra, adverte: Com esta singela contribuição ao estudo do “ coronelismo”, não tivemos o propósito de apresentar soluções, apenas nos esforçamos por compreender uma pequena parte dos nossos males. E exorta: Outros, mais capacitados, que empreendam a tarefa de indicar o remédio.
É axiomática a importância do ensino fundamental, mas a solução, antes, simples, é hoje complicada, voluntariamente, pelos que desejam manter a população na ignorância, como se fazia com o escravo, proibido de se alfabetizar.
A história do recadastramento eleitoral que o TRE do Rio de Janeiro empreendeu pelas mãos do Desembargador José Joaquim da Fonseca Passos, na década de oitenta, tem a notabilizá-la o imediato impedimento da falsificação do exercício do voto do eleitor morto, impedido, inexistente. Ofereceu-se, na ocasião, uma varrida de largas proporções na desgraça da fraude eleitoral. A tentativa de exigir vida pretérita imaculada para o candidato a representante do povo, em meados do início do século XXI, só foi implementada pela LC nº 135/2010, de iniciativa popular, para exigir o óbvio sobre a obediência do princípio da moralidade, escancarado no art. 37 da CRFB.
Com o desenvolvimento da economia brasileira, os coronéis do império ruralista foram sendo substituídos pelos empresários de toda ordem, inclusive os do campo, mas já sem o título cuja história está no livro de Nunes Leal, hoje, reservado à patente militar de muito maior nobreza e significado.
O intuito destas linhas é o de demonstrar o quanto de história se aninha em um pequeno fragmento jornalístico de grande dimensão sociológica, jurídica, política e ética, (os sete segundos de silêncio, ao final da entrevista, produzem mais alarido do que os foguetes juninos ou coreanos) com a demonstração do valor da literatura das entrelinhas, quando há interesse pelas coisas do país, como o demonstram os excertos das obras utilizadas em confronto.
1 – GALBRAITH , John Kenneth – The Economics of Innocent Fraud Ed. Houghton Mifflin Co. N. York, 2004.
2 –4 - LEAL, Victor Nunes Coronelismo, Enxada e Voto – Ed. Nova Fronteira -Rio de Janeiro, 1997.
3-MUÑOZ, Alberto Alonso, O Paradigma Aristotélico in Curso de Filosofia Política. Atlas, 2008