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Imprensa e cidadania responsáveis

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O noticiário político brasileiro é um estímulo à indignação, ao desânimo ou, na melhor das hipóteses, ao desinteresse pela vida pública, pois quase todo o noticiário, assim como os editoriais e os artigos transmitem a imagem de um ambiente em que todos são corruptos e se valem de seus mandatos eletivos ou dos cargos que ocupam na Administração Pública para obter vantagens pessoais, para favorecer pessoas e entidades beneficiárias da corrupção ou para expandir o ódio aos adversários mais bem sucedidos ou, ainda, para aliviar os efeitos de grandes decepções resultantes de derrotas mal absorvidas. 

Esse quadro intensamente negativo é apresentado como se fosse a expressão de tudo o que acontece no Brasil e que tem alguma importância. E um aspecto agravante dessa persistência na divulgação de imagens negativas é o fato de que entre os que são apresentados como praticantes e beneficiários da corrupção, os que degradam a vida pública brasileira, estão muitos que ostentam formalmente a condição de representantes do povo. Eles foram eleitos pela cidadania brasileira para cargos de representação, com a agravante de que entre eles há grande número de corruptos notórios, personagens que, por notícias e revelações já divulgadas, às vezes até com grande ênfase, ninguém pode duvidar que sejam praticantes de corrupção, que se apossam de dinheiro público ou fazem o seu desvio ilegal em proveito próprio ou de terceiros, ou obtêm outras vantagens ilegalmente.

Em vista desse quadro, são necessárias e urgentes duas mudanças de atitude. Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que os grandes órgãos de divulgação estão pondo de lado seu papel extremamente relevante de informantes e educadores da cidadania. Influenciados por vários fatores, puseram em absoluto primeiro plano apenas aspectos negativos da vida pública e social. Em sentido oposto e no tocante à vida pública, todos os dias e em muitas partes do Brasil estão acontecendo fatos positivos, obras que beneficiarão o povo estão sendo iniciadas e desenvolvidas, serviços de relevância pública estão sendo mantidos e desenvolvidos. Se houver imperfeições nessas obras e serviços é benéfico denunciar as falhas e cobrar sua correção, mas sem perder de vista os aspectos positivos dessas iniciativas.

Paralelamente a isso estão ocorrendo no Brasil muitos eventos positivos, que contribuem para a ampliação dos conhecimentos, o bem estar das pessoas e o aperfeiçoamento da convivência. E isso deveria ser posto em evidência, como reconhecimento da contribuição e para estímulo de novas iniciativas. Mas a ênfase excessiva, quase mesmo exclusiva, em acontecimentos negativos e na promoção pública de personagens que deveriam ser simplesmente denunciados ou desprezados não deixa espaço para a divulgação de acontecimentos positivos. E isso tem a gravíssima conseqüência de transmitir e alimentar a crença de que nada de bom está ocorrendo e de que seria ingenuidade e perda de tempo querer participar de algo positivo, merecedor de atenção e apoio.

Por tudo isso, pode-se dizer que os grandes meios de divulgação estão desperdiçando seu potencial de exercer boa influência, de contribuir para o aperfeiçoamento das condições de convivência e de estimular a formação e o desempenho de uma cidadania bem informada, conscientizada e responsável. E com isso cria-se um círculo vicioso: a cidadania mal preparada será envolvida ou enganada pelos corruptos e corruptores e no momento de manifestar sua vontade escolhendo um representante para algum cargo público estará desorientada e será facilmente levada a dar seu apoio a personagens que sabe que são corruptos. 

Na realidade, um ponto importante do atual noticiário político é a verificação de que grande número dos que são promotores ou beneficiários da corrupção e da degradação dos órgãos públicos são corruptos notórios, publicamente conhecidos e reconhecidos por práticas imorais e anti-sociais e, apesar disso, eleitos e reeleitos para cargos de representação. Uma conclusão, aparentemente absurda mas compatível com essa realidade, é que os eleitores gostam dos corruptos e admiram sua ousadia. Outra hipótese é que grande número de eleitores espera tirar algum proveito do apoio aos corruptos e por isso eles são eleitos e reeleitos, muitas vezes com elevado número de votos.

Outra hipótese que deve ser considerada - e aqui está presente, uma vez mais, o descuido da imprensa quanto à sua grande possibilidade de influência social e, consequentemente, à sua responsabilidade - é que grande parte do eleitorado é desinformado e não percebe que apoiando a corrupção prejudica a todo o povo de que ele faz parte. Assim, pois, é necessário e urgente o despertar dos responsáveis pelos meios de comunicação, para que percebam que a exploração dos desvios, a colocação em grande evidência dos praticantes e beneficiários da corrupção, está transformando tais acontecimentos e agentes como os fatos e pessoas que merecem maior atenção. E há o risco de que pessoas de boa fé e ingênuas fiquem deslumbradas com a grande publicidade e se disponham a participar dessa divulgação teatral e festiva para serem participantes da linha de frente.

Por tudo isso, faz-se necessário que haja mais comedimento e maior prudência no volume e na forma de divulgação dos fatos negativos e na promoção de seus personagens. Em sentido oposto, é também necessário que se divulguem com ênfase os acontecimentos positivos, inclusive reuniões e eventos que tenham valor cultural e contribuam para o aperfeiçoamento da cultura e da consciência da cidadania. Assim agindo, os meios de divulgação estarão correspondendo às expectativas dos que acreditam que o desenvolvimento e a ampla utilização dos potenciais de comunicação são fatores positivos para a construção de uma sociedade livre, democrática e justa.         

* jurista