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Desarmamento: muito além do estatuto  

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Desde 2003, o Brasil tem uma das mais rigorosas legislações para a comercialização de armas de fogo e munições. Entre outras restrições, a lei, que ficou conhecida como Estatuto do Desarmamento, limita o porte de armas a agentes de segurança pública, integrantes das Forças Armadas, policiais, caçadores e funcionários de empresas de segurança.

As exceções são os civis, maiores de 25 anos, que comprovem efetiva necessidade de adquirir armas de fogo, além de outros requisitos, dentre os quais prova de capacidade técnica e aptidão psicológica. Mesmo assim, a licença pode ser suprimida a qualquer momento, em caso de o indivíduo estar embriagado, por exemplo. Além disso, na maioria das vezes a licença não é dada para o porte, mas sim para a posse da arma no domicílio ou no local de trabalho. E há uma série de regras que limitam o transporte da arma de um local para outro.

Apesar dessa legislação restritiva, o Brasil, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), ainda é o sexto país do mundo em homicídios, metade dos quais cometidos por armas de fogo. Estas, na contabilidade do Ministério da Justiça, superam 16 milhões de unidades no país, sendo que mais de 47% circulam ilegalmente.

Esses dados demonstram: não é por falta de legislação que figuramos nesta triste estatística, próxima de uma epidemia que atinge, sobretudo, os jovens de 15 a 24 anos. O que nos falta, de fato, são medidas efetivas para aproximar a letra da lei inscrita no Estatuto do Desarmamento da realidade. Isto ainda não ocorre por uma série de razões. A primeira delas é que, em geral, a complexidade do problema só vem à tona quando uma grave tragédia, como foi o bárbaro assassinato de 12 adolescentes na escola do bairro de Realengo, no Rio de Janeiro, traz justa comoção na mídia e na opinião pública.

Mais efetivas são as campanhas de desarmamento que convocam os que possuem armas sem registro a entregá-las às autoridades, mediante indenizações. É auspiciosa, portanto, a decisão das autoridades de perenizar a campanha, de forma a retirar de circulação o maior número de armas possível. Campanhas como esta têm a propriedade de conscientizar a população na questão complexa que é a violência no país. Evidentemente, campanhas de desarmamento por si só não bastam. O próprio Estatuto pode ser aperfeiçoado, por exemplo, endurecendo ainda mais as penas de quem for pego portando ilicitamente armas de fogo.

Contudo, o caminho mais efetivo para retroceder drasticamente os altos índices de violência provocados por armas de fogo passa necessariamente pelo combate sem trégua às inúmeras facetas da criminalidade. O primeiro passo nesta trilha é assegurar o controle de nossas fronteiras. É por esta via que entra a maioria das armas clandestinas no país.

Assim, o controle de fronteiras não pode ser negligenciado se quisermos realmente combater a criminalidade armada. Como consequência, nada justifica cortes em recursos que limitem as atividades da Polícia Federal, instituição que hoje atua em nada menos que 16.400 quilômetros de fronteiras com nove países da América do Sul, do Amazonas ao Rio Grande do Sul.

Da mesma forma, os investimentos nas instituições policiais internas devem ser ampliados para assegurar um combate ferrenho aos criminosos que agem com armas clandestinas. Somente ações com essa amplitude garantirão que a letra do Estatuto se transforme em real desarmamento da sociedade brasileira.    

José Adir Loiola  é presidente do Sindicato das Empresas de Segurança Privada, Segurança Eletrônica, Serviços de Escolta e Cursos de Formação do Estado de São Paulo.