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Misericórdia e reconciliação

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Em artigo anterior, refletindo sobre o Evangelho do Pai Misericordioso, recordei a importância da reconciliação e do perdão como consequência do arrependimento. Continuo no mesmo assunto, que julgo muitíssimo importante para os tempos atuais.

 Em minhas reuniões com as foranias, uma das preocupações comuns é o atendimento das confissões nas paróquias e encontrar uma paróquia mais central e localizada, com fácil acesso, e com mais sacerdotes para atendimento em plantões diários das pessoas que procuram o sacramento da penitência.

 Celebrar a reconciliação é uma mudança importante em nossa sociedade e mesmo dentro da própria comunidade eclesial que, além de esquecer-se da prática sacramental da confissão, muitas vezes vive em clima de vingança e ódio. Acredito que a grande resposta a todos os ranços que existem entre as pessoas, e que muitas vezes se destroem entre si, será um povo reconciliado como sinal da misericórdia no meio da sociedade.

 Assim como somos chamados a viver a reconciliação no interior da Igreja, ocorrerá também que o sinal da misericórdia deverá aparecer em nossa sociedade tão marcada pelo ódio e rancor e achando que a solução para todos os males é retribuir o mal com o mal.  A confissão não é apenas para absolver dos pecados cometidos e assim ter uma melhor condição espiritual para receber a Eucaristia. É ela também de grande valor substancial e extraordinária eficácia no desenvolvimento da vida cristã.  Na teologia sacramental exprime-se que a graça nela obtida tem infinita capacidade de santificar os homens. Outro aspecto é que a extensão de seus efeitos é proporcional à disposição daqueles que recebem o perdão. A graça se coloca disponível num coração mais dócil à sua eficácia, como se expressa na Teologia Espiritual. 

 O perdão é difícil! A confissão da nossa fraqueza, mesmo que isso ocorra no mais absoluto segredo, nunca é fácil. Mas Deus nos pede para confiarmos a ele os nossos fardos. Ele quer se comprometer conosco para nos dar coragem. O Pai enviou o seu Filho para nos salvar e não para condenar. 

 Na confissão, começamos, sim, a nossa jornada rumo à misericórdia e à consolação que só Deus mesmo pode nos proporcionar, e que nenhuma força humana é capaz de fazer. O mundo que Deus criou por amor não quer conhecer a Deus. Há uma espécie de cegueira espiritual em que a humanidade está envolvida e mergulhada. Isso provoca uma grande escuridão espiritual, que nos causa confusão e dúvidas. 

 

 Tornamo-nos, assim, prisioneiros de nossos medos. Mas Deus nos demonstra o seu infinito amor através do sacramento da confissão. Tira-nos do marasmo espiritual e faz-nos ver a luz suprema, que é o Amor que supera todas as nossas imperfeições e nos completa por inteiro.  A atual crise de fé afeta principalmente a inteligência, quando não se quer conhecer o que é e o que não é pecado. Não devemos, porém, ver pecado onde ele não existe. Isso também é sinal de maturidade na fé. Mas devemos ser sinceros em ver o pecado onde ele realmente está.  

É importante, portanto, saber o que é certo em termos morais, e assumir o que Deus diz sobre a nossa vida no que é certo e no que é errado.  É certo, entretanto, que Deus não quer a nossa infelicidade, mas, completamente, o oposto. Devemos ir a ele com total confiança de que vamos encontrar a chave mestra de nossas questões mais íntimas e mais profundas.  

Seria bom recordar nossa iniciação cristã e as orientações da Igreja para se realizar uma boa confissão sacramental: 1) O Exame de Consciência. Nesta etapa colocamo-nos diante de Deus que nos ama e quer estar sempre ao nosso lado. Analisamos a nossa relação com ele e abrimos o nosso coração; 2) Contrição dos pecados e arrependimento. Aqui percebemos o nosso pecado e como ele nos distancia do amor de Deus. Percebemos que, se quisermos ser plenamente felizes, temos que aprender a fazer a vontade dele e não somente a nossa; 3) Propósito sincero de não mais pecar. Finalmente, devemos aceitar que Deus quer nos transformar através do sacramento e, por sua vez, nós nos determinamos a começar uma nova etapa. Se realmente amamos a Deus, então não queremos dele nos separar em definitivo; 4) Manifestar os nossos pecados. Não devemos ter receio e ter vergonha de assumir as nossas falhas. Devemos fazer isso de forma clara, sincera, despretensiosa; 5) Fazer penitência. Neste último ponto queremos nos redimir por completo. Isso por gratidão, por amor e não por força ou coação, mas com coração assumido no pleno amor. “Se dizemos que não temos pecado, nos enganamos a nós mesmos e a verdade não está em nós” (I Jo 1, 8).

 Quando nos confessamos, somos leais ao Senhor, que para conosco é sempre fiel. A sua fidelidade neutraliza a nossa infidelidade. Sua justiça purifica a nossa injustiça. O perdão do Senhor é completo, incondicional se a ele correspondemos com outra resposta de amor completo e incondicional. O Senhor sempre quer nos restaurar e nos trazer de volta ao seu amor.

 

 Por fim, queremos recordar o magistério catequético do santo padre Bento XVI, quando nos afirma que, “mediante o sacramento da penitência, Cristo crucificado e ressuscitado, mediante os seus ministros, purifica-nos com sua infinita misericórdia, restitui-nos à comunhão com o Pai Celestial e com os irmãos, nos dá o seu amor, sua alegria e sua paz (mensagem do Ângelus. fevereiro de 2009). 

 Nessa mesma mensagem, o papa concluiu convidando os fiéis a procurarem com frequência o sacramento da confissão, pedindo a redescoberta de seu imenso valor e de sua importância na vida cristã. Por isso tenho pedido sempre em nossos encontros com o clero para que facilitem ao máximo o atendimento das confissões de nossos fiéis. Todos os que buscam o confessionário têm consciência da necessidade de uma vida virtuosa e se colocam como autênticos discípulos-missionários de Jesus Cristo.

 E quanto mais caminharmos na direção dessa experiência misericordiosa, mais poderemos ser sinais desse amor de Deus à humanidade, tão machucada e ferida.