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Marielle Franco, representante de minorias, é silenciada

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Mulher, jovem, negra, da favela. Marielle Franco transformou essa difícil combinação de fatores no motor de sua luta, nas ruas, ou na Câmara dos Vereadores, e não deixou de levantar a voz contra o racismo, o machismo e os abusos policiais no Rio de Janeiro.

Nascida e criada na Maré, Marielle foi mãe aos 19 anos, e estudou em um curso de pré-vestibular comunitário até ser aprovada para cursar Sociologia na Pontifícia Universidade Católica (PUC). 

"A minha perspectiva era a da mulher favelada, era de pertencimento da Maré. E havia uma disputa daquele corpo que vai ocupar, sim, porque eu sou favelada, aquele lugar de ensino de qualidade, não é lugar de uma mulher negra favelada", disse a quinta vereadora mais votada da cidade, de 38 anos, nesta quarta-feira (15), em um evento chamado "Jovens negras movendo as estruturas", minutos antes de ela e o motorista serem assassinados na volta para casa, no Estácio. 

Incansável e sorridente, Marielle pode ser vista no carnaval distribuindo leques contra o assédio, fantasiada em meio à multidão, e, dias depois, na Câmara Municipal, criticando a violência policial nas favelas cariocas. 

"Era uma mulher sorridente, forte, segura, coerente e pé no chão. Olhava no olho das pessoas, nunca foi deslumbrada, ela sabia que era um corpo estranho no lugar que ocupava", disse à AFP a produtora cultural Marcela Lisboa, que se aproximou de Marielle quando ela começou a militância pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol). 

Ataques à polícia e à intervenção

A morte de uma amiga por uma bala perdida levou a jovem carioca à luta pelos direitos humanos, focada principalmente nas minorias negra, feminina e LGBT. 

A atuação policial foi um de seus principais focos e tema de sua tese de mestrado em Administração Pública na Universidade Federal Fluminense (UFF), sobre o fracassado projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) - "UPP: a redução da favela a três letras".

A longa carreira de ativismo de Marielle começou nas favelas, passando por organizações como Brasil Foundation e Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré.

Sua vida deu uma grande virada quando conheceu Marcelo Freixo, deputado do Rio de Janeiro. Ela começou a trabalhar como sua assessora, antes de decidir se candidatar a vereadora. 

Feminista, lésbica e mãe de uma jovem de 19 anos ela recebeu, em 2016, mais de 46 mil votos. 

"Era uma pessoa cheia de vida, cheia de gás, uma pessoal fundamental para o Rio de Janeiro, brutalmente assassinada", disse Freixo, abalado, na noite desta quarta, no local onde ela foi assassinada. 

Organizações como a Anistia Internacional exigiram uma investigação rigorosa do assassinato de Marielle, destacando que era conhecido por suas críticas frontais aos abusos policiais e à recente intervenção militar na área de segurança do Rio. Marielle tinha sido nomeada relatora de uma comissão da Câmara Municipal que vai acompanhar a intervenção.

Vestida completamente de preto, esperando ao lado de centenas de pessoas a chegada de seu corpo para um velório na Câmara Municipal, Tenka Dara, outra jovem negra e companheira de lutas de Marielle, chorava, inconsolável, pela morte de sua amiga.

"Ela era essa pessoa que estaria aqui liderando o movimento. Neste caos político, a morte política é a de uma mulher negra. Mataram Marielle, mas suas ideais são à prova de balas", afirmou.