A crise financeira que assola o país, em especial alguns estados como o do Rio de Janeiro, faz abrir os olhos dos governantes para questões básicas de sobrevivência em especial a saúde pública, uma das áreas que mais sofrem durante uma crise. Nos últimos anos, o estado do Rio de Janeiro viveu grande epidemia de doenças causadas pelo mosquito Aedes Aegypti (Zika, dengue e chikungunya), muito graças à inaptidão e ineficiência das pessoas que estavam à frente da saúde pública no estado, e as preocupações em relação à proliferação do mosquito aumentam durante o verão.
Ainda no final do ano passado, as autoridades já previam que em 2017, a grande preocupação seriam os casos de chikungunya. Atento a isso, o recém empossado secretario de saúde do estado, Luiz Antônio Teixeira Júnior, que herdou a saúde estadual em estado crítico, promoveu no último dia 10 um seminário sobre a chikungunya, que contou com a presença de cerca de 150 representantes das áreas de vigilância sanitária de diversos municípios fluminense.
Durante o seminário, o secretario reforçou a importância das ações promovidas pela secretaria, principalmente nesse momento de verão (época de maior proliferação do mosquito) e durante a troca de comando nas prefeituras. “A Secretaria de Estado de Saúde tem a atribuição de fornecer orientações técnicas às prefeituras, para que elas possam subsidiar suas ações de combate ao vetor e de atendimento à população. Essa mudança nas prefeituras com as novas equipes assumindo as respectivas pastas fez com que realizássemos um seminário sobre a chikungunya para levar conhecimento de casos para as vigilâncias sanitárias dos municípios”, explicou o secretário.
Luiz Antônio Teixeira Jr. mostrou-se atento ao problema e lembrou que todas as ações de combate ao vetor só conseguem atingir o sucesso se forem feitas em parceria total com a população. “Trabalhamos em conjunto para vencer as doenças transmitidas pelo Aedes, produzindo um protocolo único para o tratamento das doenças, especialmente a chikungunya. Este seminário foi fundamental porque além de abordar as terapias, focou no controle ao vetor. Só conseguiremos vencer esta batalha com o engajamento de toda a população”, disse.
A preocupação do secretario aumenta devido à situação em que os municípios do estado se encontram. Para se ter ideia, o número de casos suspeitos de chikungunya aumentou drasticamente no ano de 2016 se comparado aos do ano anterior. De janeiro a dezembro do ano passado, foram registrados 5.265 casos suspeitos de chikungunya, com 10 mortes, contra 105 casos da doença sem nenhuma morte em 2015. O aumento também foi registrado nos casos de dengue, em 2016 foram 82.166 casos suspeitos e 14 mortes, contra 71.791 casos suspeitos da doença e 23 mortes, em 2015.
A preocupação, em especial com o chikungunya, se explica devido à falta de informações sobre o vírus, relativamente novo e desconhecido. Quem falou sobre o assunto foi Alexandre Chieppe, subsecretario de Vigilância em Saúde. “O chikungunya é um vírus novo, por isso, a maior parte da população está suscetível a doença. Estamos reforçando essa campanha de mobilização para que os moradores intensifiquem a fiscalização de novos criadouros e ao mesmo tempo estamos buscando agregar novas tecnologias para evitar a proliferação do vetor”, comentou Chieppe.
Em dezembro do ano passado, um boletim divulgado pelo Ministério da Saúde mostrou um aumento de 15% nos casos fatais de chikungunya em relação a 2015. Foram registradas 159 mortes e mais de 263 mil casos suspeitos da doença no Brasil. O Zika Vírus foi responsável por quatro mortes no estado do Rio, que foi líder nacional no ranking de suspeita da doença, com 67 mil casos registrados. Uma média de 407 casos a cada 100 mil habitantes.
Além da gravidade das doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, a atenção precisa ser redobrada pelas consequencias que esses vírus causam, como por exemplo o desenvolver de novas doenças como a microcefalia, a síndrome de guillain-barré, e outras doenças neurológicas que podem atingir os pacientes.
O Jornal do Brasil entrou em contato com o Dr. Osvaldo Nascimento, professor titular de neurologia da Universidade Federal Fluminense (UFF) e presidente do capítulo do Rio de Janeiro da Academia Brasileira de Neurologia, que explicou um pouco sobre as complicações neurológicas causadas pelas doenças chamadas de arboviroses (transmitidas por mosquitos como o Aedes aegypti). Para o Dr. Osvaldo, apesar das quedas nos números de casos de dengue, a doença ainda deve ser a que causa mais preocupação por ser a com maior taxa de mortalidade. Porém, ele lembra que, quando a pessoa se cura da dengue, ela raramente desenvolve problemas neurológicos graves, como no caso de quem contrai Zika vírus e chikungunya.
“Nesse grupo das doenças provocadas por mosquitos (arboviroses) temos a dengue, a chikungunya, a Zika e a febre amarela, que são todas transmitidas pelo mesmo vetor, o Aedes aegypti. No caso da dengue, apesar da queda nos números da doença, a enfermidade ainda deve gerar uma preocupação pelo fato de causar mais mortes que as demais. No entanto, as complicações neurológicas relacionadas à dengue não são tão expressiva quanto as outras. Entre Zika e chikungunya, a primeira parece ser mais agressiva para o nosso Sistema Nervoso, principalmente para as crianças, pois uma mãe infectada pela doença durante os três primeiros meses da gravidez corre um grande risco de gerar um feto com microcefalia (uma atrofia no desenvolvimento do cérebro e do crânio da criança)”, explicou o neurologista.
Uma das grandes preocupações em relação a essas doenças é a faixa etária que elas mais atingem, Dr. Osvaldo Nascimento lamentou a maior incidência em jovens e adultos, pelo fato de pessoas nessa idade estarem começando a entrar no mercado de trabalho e uma complicação pode afetar a capacidade motora do paciente, e em casos mais graves pode até mesmo levar à morte.
“Uma preocupação que temos no mundo médico, é que atualmente o grupo que mais contrai as doenças causadas pelo Aedes aegypti são os jovens. Essa preocupação ocorre pois esse grupo de pessoas está em idade de começar a produzir, entrar no mercado de trabalho, e as decorrências neurológicas de doenças como o Zika vírus e o chikungunya podem prejudicar as capacidade dessa pessoa”, comentou o professor, que completou: “Síndromes como a de guillain-barré, causam fortes dores articulares que podem durar longos períodos, evoluir e atingir até mesmo o sistema respiratório do paciente. A síndrome é mais comum em pacientes com Zika vírus, porém também pode ser encontrada em enfermos que sofreram com o chikungunya. A consequência mais comum dessas patologias é o surgimento de encefalites, infecções no cérebro, que em alguns casos pode ser fatal”, disse.
Outra grande preocupação em relação à proliferação do Aedes aegypti é o crescimento recente dos casos de febre amarela, principalmente em Minas Gerais e Espírito Santo, locais que foram afetados pela tragédia do rompimento da barragem da Samarco, em Mariana (MG). A infecção por febre amarela acontece quando uma pessoa que nunca tenha contraído a doença ou tomado a vacina contra ela (que tem duração de dez anos) é picada por um mosquito infectado. O surgimento de casos da doença foi lamentado pelo neurologista, já que, em 1903, o sanitarista Oswaldo Cruz, conseguiu erradicar a doença no país. Mais de um século depois, a doença retorna devido ao descaso e à falta de cuidado de autoridades e população.
“A febre amarela desapareceu há anos atrás, e é lamentável estarmos vendo o retorno dessa doença. A preocupação é grande por ser uma doença transmitidas por mosquitos de hábitos diurnos, que são facilmente levados para outros locais. Não apenas isso. Caso uma pessoa seja infectada durante uma viagem à lugares onde está ocorrendo surto da doença, basta que um mosquito pique essa pessoa para contrair o vírus e espalhá-lo para outras pessoas, criando assim um círculo de infecção, de onde surgem as epidemias. No Rio ainda não tivemos casos de febre amarela recentes, porém casos em Minas Gerais e no Espírito Santo começaram a surgir, e isso liga um alerta devido à proximidade com esses locais. Hoje, eu aconselharia as pessoas a se vacinar contra a febre amarela. A vacina está disponível nos postos de saúde e tem validade de dez anos”, explicou Dr. Osvaldo.
Devido aos recentes casos da doença, o neurologista alertou a comunidade médica para os diagnósticos. Como a doença havia sido erradicada, quando um paciente apresentava cor amarelada os médicos automaticamente consideravam a possibilidade de um problema hepático (no fígado), porém, para o Dr. Osvaldo Nascimento, com o surgimento de casos no Brasil, os médicos precisam voltar a se atentar para a possibilidade de febre amarela.
“Hoje, quando um paciente apresenta icterícia (cor amarelada), nós médicos pensamos automaticamente em doenças relacionadas ao sistema hepático, porém, com o aparecimento de casos de febre amarela, a comunidade médica precisa ficar atenta e começar a considerar a possibilidade da doença”, alertou.
Para se evitar a proliferação da febre amarela, além das medidas já conhecidas para evitar o nascimento do vetor, a pessoa deve se vacinar contra a doença. A vacina está disponível no SUS e possui validade de dez anos. A pessoa que tomar a vacina estará protegida da doença após um período de dez dias, quando o vírus inativo tiver agido no organismo do paciente. Uma preocupação das autoridades é a chegada da febre amarela nos presídios, pois é um local de difícil controle de proliferação do mosquito e, após um detento se infectar, a chance de outros contraírem a doença é grande, devido ao fato de a vacina levar dez dias para fazer efeito.
“Atualmente, a oferta da vacina por parte do governo é capaz de suprir a demanda. Geralmente as pessoas que buscam a vacina o fazem pelo fato de estarem indo viajar para locais que exigem a medicação para entrar, porém, com um surto iminente da doença a demanda pode aumentar, e a vacina pode acabar.” Encerrou.