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Mais um bebê morre durante parto na maternidade Maria Amélia. MPE inicia depoimentos de pais

"Me roubaram o direito de segurar o meu filho no colo, me entregaram ele morto", diz pai de bebê

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A procuradora Deise Barboza Passos Ribeiro, do Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro (MPE-RJ) começa a ouvir nesta segunda-feira (1/6) pais de bebês que morreram durante procedimento de parto humanizado na Maternidade Municipal Maria Amélia Buarque de Hollanda nos dois últimos anos, no Centro do Rio. No último dia 27, mais uma criança foi à óbito durante o parto na maternidade. 

O casal Tarcísio Vieira Chaves, de 32 anos, e Ana Paula do Nascimento Santos Vieira, 26 anos, acusa o hospital de erro médico e pretende registrar o caso na delegacia. "Levei meu filho para um matadouro. Me roubaram o direito de segurar o meu filho no colo, me entregaram ele morto. Ninguém nunca mais vai tirar esta dor do meu coração", desabafa o pai.   

Ana Paula realizou o pré-natal em um posto de saúde no bairro da Ilha do Governador. Segundo o casal, Ana Paula apresentava boa saúde no final da gestação e os batimentos cardíacos do bebê também estava normal. Ela foi encaminhada pela médica obstétra para fazer o parto na Maternidade Maria Amélia. "Fomos conhecer a maternidade um mês antes do parto e lá nos informaram que a minha esposa teria livre arbítrio para escolher o tipo de procedimento, então, deixamos claro que a preferência era cesariana", conta Tarcísio.

Segundo Tarcísio, a gestante começou a sentir os primeiros sintomas do parto no dia 14 de maio e procurou a maternidade. "Mas mandaram ela de volta para casa", conta. Dois dias depois, Ana Paula procurou a maternidade por três vezes, com fortes contrações, e foi dispensada pela equipe técnica de plantão. No dia seguinte, 17 de maio, a gestante foi internada. "Ela estava reclamando de muita dor e sentia sair um líquido, mesmo assim eles não fizeram a cesariana", afirma o pai. Uma ultrasonagrafia foi realizada na segunda-feira (18) e os pais informados que o bebê estava bem.    

Tarcísio conta que na terça-feira (19), Ana Paula sentiu o rompimento da bolsa por volta do meio dia. "Ela passou o dia inteiro com dores insuportável e forçaram demais para ela ter parto normal. Quando viram que não tinha mesmo passagem para o bebê, levaram ela para o Centro Cirúrgico para fazer uma cesariana, mas já era por volta das 20 horas. Ela chegou a desmaiar", conta Tarcísio. 

A criança, de acordo com os pais, nasceu por volta das 3 horas da manhã e o médico informou que ele estava saudável. "Depois o médico veio me explicar que ele teve um problema pulmonar decorrente de uma infecção da mãe. Isso é impossível, ela estava bem", conta o pai, acrescentando que para ele o caso foi de "assassinato". "Forçaram demais para um parto normal, contra a vontade da família", diz ele, anunciando que fará nesta segunda (1) um registro policial do caso. A criança morreu no dia 27 de maio. "A minha mulher ainda está com grande sequela emocional e esta semana ela vai passar por exames clínicos, para saber de, talvez, outras consequências disso tudo", salienta Tarcísio.

MPE vai apurar "possível lesão aos direitos da saúde"

Na intimação enviada pelo MPE aos pais, o órgão informa sobre a instauração do procedimento para apurar "possível lesão aos direitos da saúde".  No final do ano de 2013, um grupo de mulheres denunciou os supostos casos de negligência médica nas redes sociais. Na época, o MP do Rio confirmou a existência de processo criminal contra a maternidade, originado de um registro policial coletivo feito por pais cujos filhos morreram após o parto. As acusações contra a direção da maternidade foram de falsidade ideológica e homicídio culposo. Em entrevista ao Jornal do Brasil, as mães relataram um verdadeiro "diário do horror", como elas mesmas apelidaram.

Leia as reportagens sobre os casos:

>> Rio: mães denunciam mortes em partos humanizados de maternidade municipal

>> Denúncia envolvendo maternidade municipal divide opinião sobre parto humanizado

>> Mais uma criança morre no Hospital Maria Amelia. Comissão receberá denúncias

>> Maternidade Maria Amélia: médicos são pressionados a não prestar atendimento

No mês passado, a Secretaria Municipal de Saúde destacou em nota que a maternidade é referência na realização de parto humanizado no Rio, com mais de 13 mil bebês que nasceram na unidade desde a sua inauguração. "Com 9 mil metros quadrados e quatro pavimentos, a maternidade abriga 80 leitos obstétricos, 36 Unidade Neonatal (12 UTI, 20 Unidades Intermediárias, 4 Cangurus) e 6 suítes para partos. Em média, são realizados 400 partos e 1,2 mil atendimentos por mês. A maternidade integra a rede do Programa Cegonha Carioca, projeto pioneiro implantado em 2011 e que tem como objetivo humanizar e garantir o melhor cuidado para mãe e para o bebê, desde o pré-natal até o parto", destaca o texto da prefeitura.

Maternidade Maria Amélia esclarece os casos em comunicado oficial

"Não houve negligência no atendimento da Sra. Ana Paula do Nascimento Santos Vieira", garante em nota o diretor técnico da maternidade Maria Amélia Buarque de Hollanda, Wallace Mendes. Segundo a versão apresentada pelo hospital, a paciente foi internada no dia 17 de maio, na 40ª semana de gestação, com queixa de contrações. Ao ser atendida, foi constatado que não havia diagnóstico de trabalho de parto em fase ativa ou amniorrexe (rotura da bolsa) no momento da internação. 

"O inicio do trabalho do parto e o rompimento da bolsa só ocorreram no dia 19 de maio, às 16h55. No momento, houve saída de líquido amarelado sugestivo de corioamnionite (infecção do líquido e membranas amnióticas). Não havia sinais de sofrimento fetal e, após discussão do caso e consentimento da gestante, optou-se pelo acompanhamento do trabalho de parto e prescrição de antibiótico para a infecção, pois essa opção implicava em menores riscos", afirma a nota.

"Houve parada de progressão do processo expulsivo do trabalho de parto (dilatação total) e foi indicada cesariana no dia 20 de maio. O bebê nasceu às 3h03, banhado em líquido purulento com odor fétido, com asfixia moderada no 1° minuto e foi encaminhado à UTI Neonatal para tratamento antibiótico e suporte clínico avançado. Devido à gravidade da infecção precoce ou de origem materna, o recém-nascido não respondeu bem ao tratamento e faleceu no dia 27 de maio às 11h05", informa a maternidade.

Ainda de acordo com o comunicado do hospital municipal, a infecção do bebê foi adquirida antes do parto, no útero, por este motivo denominada "sepse de origem materna", não havendo relação desta infecção com a via de parto, normal ou cesariana. "Todos os procedimentos foram realizados após informação e consentimento da família do bebê", garante o diretor técnico.