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"A corrupção na PM é sistêmica", afirmam especialistas

Para eles, as investigações destacam problemas mais profundos dentro da Polícia

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Os recentes casos de corrupção na Polícia Militar do Rio de Janeiro têm chamado a atenção por envolverem nomes da alta patente dentro da corporação. O mais recente, envolveu o comandante do 17°BPM (Ilha do Governador), Dayzer Corpas Maciel, e outros 15 policiais militares, presos na Operação Ave de Rapina, investigação da Secretária de Segurança do Ministério Público do Rio de Janeiro. Eles são acusados de envolvimento com grupos de venda de drogas da Ilha do Governador, na Zona Norte da cidade.

Em declaração nesta quinta-feira, o secretário de Segurança do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, informou que as investigações feitas pela Operação Ave de Rapina não atingem o comandante-geral da PM, José Luís Castro de Menezes, que se mantém no cargo.

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Entrevistados pelo JB,  especialistas lamentam que essa postura não seja uma novidade dentro da corporação e nem para a imagem que a polícia cultiva perante a sociedade. Para Marcus Bretas, Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e líder do Grupo de Pesquisa de História do Crime e da Polícia e da Justiça Criminal, as investigações e prisões dos policiais tem dois lados. “A corrupção nunca ficou tão evidente como com essas prisões e isso cria duas situações. Por um lado é bom ver que esses policiais estão sendo presos pelos crimes que cometeram, mas ao mesmo tempo é essa visão de que a polícia é uma organização frágil do ponto de vista criminal”.

Para Bretas, os casos de corrupção colocam em xeque a imagem da polícia dentro e fora da corporação. ”Isso tem um impacto sobre o comando da PM. Sem dúvida esses oficiais de alta patente colocam em questão o que esta acontecendo na polícia. No primeiro caso já houve uma balançada na hierarquia da Polícia”, afirma.

Apesar da declaração dada por Beltrame, o professor afirma que as investigações afetam sim o comandante geral da PM. “É claro que isso tem um custo para o comando geral. Ele esta associado aos comandantes e esses casos só mostram a falta de controle interno isso tem sido feito pelo Ministério Público, quem deveria pegar era a própria corregedoria da policia”.

Michel Missi, sociólogo e pesquisador do Núcleo de Violência Urbana da UFRJ, chama a atenção para a associação da imagem da polícia com a corrupção, que não é nenhuma novidade. “a existência da corrupção e sistêmica nas policias do Rio de Janeiro,  isso vem de décadas atrás, de questões históricas como as associações com o jogo do bicho e bordéis ainda na no período da República Velha.  Só que isso ganhou uma dimensão mais grave, a partir do momento que envolveu o tráfico de drogas e toda a rede de violência relacionada”, aponta.

“O que se verifica agora é que esta havendo um trabalho de descoberta de alguns casos. O que pode parecer um aumento da corrupção é na verdade um trabalho de investigação que esta permitindo que alguns desses casos venham à tona”, afirma o sociólogo.

Missi credita a descoberta da participação em casos de corrupção de policiais, que ocupavam cargos de alta patente, a existência de corregedorias e ouvidorias, criadas nos últimos anos. No entanto, segundo o sociólogo, é  importante frisar que ainda é pouco, que é preciso a existência de um controle externo da polícia.” Mesmo com essas investigações, o MP que tem  a atribuição de fiscalizar a polícia, não fiscaliza suficientemente. É preciso um papel mais ativo do Ministério nesses casos, por isso que é preciso ter um controle externo, com conselhos externos com pessoas da sociedade e especialistas que tenham acesso aos procedimentos adotados pelos órgãos policiais”.

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Para Elionaldo Julião, sociólogo e professor da Universidade Federal Fluminense, a corrupção, analisando de uma perspectiva mais ampla, está presente em diversas áreas e no cotidiano da sociedade. Contudo, ela se mostra mais impactante quando acontece no âmbito da segurança pública e chama a atenção para a necessidade de uma posição mais firme da Secretaria de Segurança. “A seleção dos profissionais que atuam no âmbito da segurança pública é frágil e não existe nenhum tipo de acompanhamento da situação social desses indivíduos, que, aliás, deveria se estender para todos os níveis da hierarquia policial”

Além disso, o professor alerta para mudanças que, em longo prazo, poderiam aumentar a credibilidade da polícia. “a necessidade de uma corregedoria e ouvidoria mais fortes e independentes, externas e sem representantes da policia que garantiriam uma legitimidade e autonomia das investigações”.

Elionaldo destaca que de nada adianta fazer investigações sem que a punição necessária seja feita aos membros da corporação. Segundo o professor, a maioria acaba ocupando cargos administrativos dentro da polícia e, em alguns casos, voltam a atuar nas ruas. “A grande questão é que o que tem acontecido são apenas mudanças de peças no tabuleiro. Não se tem uma investigação sobre a atuação dessas pessoas na polícia, como elas atuam dentro da corporação ao longo do tempo de profissão”.

Para ele, as denúncias sem que haja um acompanhamento dos casos são como “tapar o sol com a peneira. ”Isso mostra a fragilidade da segurança pública no Rio de Janeiro e uma maquiagem feita na organização. Até mesmo as UPPs se mostram frágeis na concepção, frágeis na implantação”, critica Julião. “Os moradores das comunidades olham para os policiais e enxergam os mesmos perigos que viam nos traficantes”.

*Do programa de estágios do JB