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"O prefeito podia colaborar com a economia", diz especialista

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Passada a euforia da Copa do Mundo, o Rio já se prepara para as Olimpíadas de 2016. As obras, que atrapalharam cariocas e turistas durante o Mundial, devem estar prontas para os jogos e os orçamentos continuam crescendo. Em seis meses, os gastos totais avançaram de R$ 5,6 bilhões para R$ 6,5 bilhões. O que causa estranhamento é que, tanto o prefeito Eduardo Paes quanto o governador Luiz Fernando Pezão demoraram para entrar em acordo com várias categorias, que entraram em greve. Durante a Copa, os feriados mostraram um Rio de Janeiro para inglês ver e, para isso, foram um grande trunfo. Os problemas foram os engarrafamentos e os prejuízos para o comércio. Então, como fica o Rio para as Olimpíadas? O Jornal do Brasil ouviu especialistas para responder essa pergunta.

Para Tatiana Rodrigues, coordenadora de projetos do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), “a impressão dos turistas que vieram para a Copa do Mundo foi uma grande zebra para quem acreditava em um evento fracassado. Os turistas saíram do Rio felizes e satisfeitos. A imprensa internacional manteve uma visão pessimista e colonialista. Ainda assim a Copa foi incapaz de fantasiar a vida do carioca porque as manifestações continuaram tomando as ruas e a polícia continuou reprimindo esses manifestantes. O Rio, assim como as outras cidades sede dos jogos, sofreu com a militarização, a conjuntura política tensa e a crise econômica”.

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Os feriados trouxeram grandes prejuízos para o comércio. Durante a Copa, o Jornal do Brasil ouviu algumas associações de comerciantes, que confirmaram a queda dos lucros em decorrência da quantidade de paralisações. De acordo com Adriano Pires, economista do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), além dos feriados, a concentração de pessoas na Zona Sul, deixou os outros bairros ainda mais prejudicados. Como as lojas fecharam, quem acabou lucrando mais foram os restaurantes e bares, principalmente em Copacabana onde teve a Fifa Fan Fest. Perguntado sobre a possibilidade de recuperação total após os prejuízos, o economista não foi otimista: “Acho difícil porque a economia está em um mau momento. Acredito que vai demorar”.

Sobre as possibilidades de minimizar os impactos durante a Copa, Adriano acredita que seja necessário organizar a cidade e concluir as obras, como a Linha 4 do Metrô. “Nas Olimpíadas, se houver essa quantidade de feriados, é possível que se repita esse impacto, mas eu espero que seja diferente. O prefeito decretou feriado porque ele sabe que a infra estrutura da cidade não suporta o grande fluxo de pessoas que o Mundial trouxe. O que chama atenção é que um jogo, no Maracanã, que reunia 70 mil pessoas virava feriado. Em nenhum lugar do mundo um jogo de futebol com 70 mil pessoas é motivo de feriado. Isso é inconcebível”, analisou o economista. Adriano finalizou com uma crítica a Eduardo Paes “O prefeito dá feriado, mas não reduz os impostos. Ele podia colaborar com a economia, disse.

Para o cientista político da Universidade Federal Fluminense (UFF), Marcus Ianoni, “ainda temos que avançar muito no país para se falar, substantivamente, em dignidade. Tratar a classe trabalhadora com dignidade passa por estabelecer comissões de negociação nos locais de trabalho, como há em vários países da Europa e passa por valorizar o servidor público. Não podemos mais conviver com o jogo em que todos perdem, o servidor ganha mal e trabalha sem motivação, o governo paga mal e não cobra o servidor, a população fica insatisfeita e reclama de ambos. O Estado precisa funcionar bem, é isso que as manifestações de junho de 2013 pediram”.

Sobre as greves, Ianoni acredita que “em 2014, a conjuntura favoreceu as greves, devido às eleições e à Copa do Mundo. Mas, em geral, as greves no país têm aumentado nos últimos anos em função de estarmos em um momento importante de regime democrático, de ingresso de novos sujeitos na participação política, no sentido amplo do termo. Houve aumento do índice de emprego, ganhos salariais e aumento do número de greves. Se a economia voltar a crescer, é possível que essa tendência continue”.

O cientista político também analisou as iniciativas de Eduardo Paes e Luiz Fernando Pezão para atender aos pedidos dos grevistas. “Creio que não houve uma boa política salarial e nem uma boa política de negociação. Por outro lado, não ignoro que as entidades representativas focam muito mais em seus direitos reivindicativos que em seus deveres para com o cidadão”, disse. Como sugestão para evitar novas greves, Ianoni acredita “que uma postura adequada a ser implementada por um futuro governo seria negociar com as representações dos servidores salário e condições de trabalho em troca de melhoria de desempenho. Nesse sentido, todos ganhariam, o governador ou prefeito, os servidores e a população”.

Em uma análise da conjuntura político econômica do Brasil Ianoni acredita que, “os estados e municípios, sobretudo as capitais, mas não só, não têm tido, em geral, uma condição financeira das mais favoráveis,  em função da renegociação das dívidas com a União, ocorrida no final da década de 1990 e também em função das restrições impostas pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Um montante significativo dos recursos precisa ser destinado para o pagamento da dívida pública, o que, inclusive, tem levado alguns entes federativos a questionar o indexador dessas dívidas, que é o IGP-DI, considerado inadequado à realidade atual. Algumas entidades da sociedade civil, como o Conselho Federal da OAB, têm apoiado essa causa dos estados e municípios”.

No caso específico do estado do Rio de Janeiro, e da também da prefeitura da capital, o cientista político analisa: “A informação que possuo é que há uma situação financeira que permite reajustes aos servidores sem que a margem permitida pela Lei de Responsabilidade Fiscal, em gastos com folha de pagamento, seja ultrapassada. Em ano eleitoral, como é o caso de 2014, a restrição aos reajustes é maior. Houve várias greves de servidores no último período, nas áreas de educação, saúde, corpo de bombeiros e garis, por exemplo. Além disso, houve greves em serviços públicos que são concessões para a área privada, como é o caso dos rodoviários. Aparentemente há dois problemas com as greves dos servidores do estado e da capital. Em primeiro lugar, a recomposição salarial poderia ter sido melhor. Em segundo lugar, não houve uma adequada política de negociação. Houve uma postura de criminalização das greves, como no caso da educação”.

*Do Programa de Estágio do JB