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Transportes: reajuste de tarifa não causa impacto na qualidade do serviço

Para especialistas, problema é com planejamento incompleto ou inexistente

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A falta de qualidade do serviço oferecido pelo Metrô Rio e SuperVia é unânime entre especialistas em transporte urbano. São Paulo, enquanto isso, oferece uma rede maior e a preço inferior ao cobrado em terras fluminenses, mesmo antes do reajuste. O argumento usado pelo governo do Estado para a necessidade do aumento da passagem, além da questão contratual, é sua importância para que as concessionárias invistam na qualidade do serviço. O que não convence os especialistas.

Alexandre Rojas, engenheiro de transporte urbano e mobilidade e professor da Uerj, acredita que o reajuste não deve garantir nenhuma melhoria nos serviço, já que a questão é estrutural. O reajuste apenas cumpre o que está previsto no contrato de concessão. Quando o reajuste foi anunciado, depois de Cabral afirmar que ele não aconteceria, o secretário da Casa Civil, Régis Fichtner afirmou que era preciso encontrar uma solução que atendesse à necessidade dos usuários por um transporte melhor e das concessionárias por recursos para investir em melhorias. 

>> Cabral rompe compromisso de não reajustar tarifas

"Durante a licitação ele previu o reajuste, então [o governo] está fazendo o que o contrato estabeleceu, não um é compromisso de melhorar a qualidade por conta do aumento. Não vai melhorar em nada a qualidade porque o problema é uma questão é estrutural", explica Rojas.

O acréscimo pode ainda ter um peso na inflação do país neste ano, conforme explica Heron do Carmo, professor de Economia da USP. O metrô teve um acréscimo de 9,37% e o trem de 10,34%. O aumento poderia ter sido maior, considerando a inflação acumulada nos dois anos, mas pode haver outro ainda em 2014, já que a Agetransp abriu processo para analisar os contratos com MetrôRio e SuperVia. A taxa de inflação neste ano já está se aproxima da do ano passado, em torno de 6%, sendo que em 2013 os reajustes em algumas regiões foram suspensos. 

O metrô de São Paulo cobra uma tarifa de R$ 3 aos usuários do transporte. A tarifa paulista foi congelada no ano passado e não deve sofrer aumento neste ano também. Em Brasília, a tarifa custa R$ 3 de segunda a sexta-feira e R$ 2 nos sábados, domingos e feriados. No Recife, o usuário desembolsa R$ 1,60 e em Belo Horizonte R$ 1,80. 

Rojas explica que a qualidade do serviço pode ser vista de duas formas. Uma delas pode ser medida por critérios como pontualidade e lotação, estabelecidos no contrato de concessão. Outra, que é a que está relacionada ao debate atual, é a qualidade percebida pelo usuário, que lida com fatores subjetivos. 

Como já está saturado, não tem como falar de qualidade do serviço do metrô, explica Rojas. Ele acrescenta ainda que percebe-se uma diferença de atendimento entre as diferentes regiões do Rio, e cita o serviço dos ônibus como exemplo. Na Zona Sul, as pessoas não têm do que reclamar. Fora deste núcleo, no entanto, têm que lidar com problemas diversos. Uma hipótese, sugere o professor, é que os moradores da Zona Sul têm voz mais ativa, ou seja, quando eles reclamam são levados a sério.

O metrô de São Paulo está igualmente saturado, mas tem muito mais usuários e uma rede "maior e melhor". A quantidade de passageiros por viagem, no entanto, se equivale à do Rio. "O serviço lá é melhor porque eu consigo ir para onde eu quero. Aqui, você só tem um caminho, que é único. Em São Paulo, a oferta é melhor, mas, paradoxalmente, as estatísticas mostram que o carioca anda mais de metrô que o paulista."

A linha 2, que vai até a Pavuna, melhorou o serviço temporariamente, mas criou uma limitação, porque tem que ter distância entre uma composição e outra, aponta. A saída para o professor da Uerj seria retomar a linha 2 como era no projeto original, e terminá-la até a estação Carioca. O projeto do metrô no Rio, então, está incompleto. 

"O serviço vai melhorar, talvez, quando o governo estrear os BRTs, quando a Linha 4 estiver em operação, porque melhora o tráfego da Barra até Ipanema. A expectativa é que melhore alguma coisa, mas não será a solução, porque a solução correta é o projeto original, fazer um projeto que seja uma malha, e não apenas uma linha. Todo mundo já fala isso há muito tempo, e ninguém ouve", esclarece Rojas. 

Eva Vider, engenheira de transportes, professora da Escola Politécnica da UFRJ, por sua vez, reforça que a qualidade do transporte aumenta mais devagar do que a tarifa. Para ela, é preciso aumentar a frota, terminar de fazer a Linha 4 e o trecho no Centro da linha 2, e criar uma rede de transporte integrada, já que as duas linhas interligadas do metrô carioca não configuram uma rede nem oferecem integração, apenas "ameaças de integração". 

"Precisam montar uma rede de infraestrutura o mais urgentemente, o que vem rápido, se quiserem. A rede de metrô tem um projeto pronto desde 1970. Tem que ser seriamente planejado. Não existe planejamento e nem integração neste planejamento", explica Eva.

Já o trem, acredita, já melhorou muito com mais de 200 km de trilhos e atendimento a 12 municípios, mas ainda tem que aumentar a oferta e oferecer maior integração com o metro. Ela alerta ainda para a necessidade de fazer uma linha de trem na Avenida Brasil, por onde passam 800 mil passageiros por dia, no lugar do BRT que está planejado. "Tem que ter outra modalidade de transporte, porque a demanda é muito alta e o sistema não tem capacidade suficiente", explica.

A questão, de acordo com Vera, é que o serviço de transporte público exige um planejamento permanente, e ainda a garantia de crescimento do serviço antes do crescimento da cidade. A cidade cresceu e a infraestrutura não acompanhou.

O MetrôRio informa, por meio de sua assessoria de imprensa, que o contrato original de concessão previa que a compra de trens e a expansão da linha seriam atribuições do Governo do Estado. Ao MetrôRio caberia a operação e manutenção do sistema (trens, estações e vias). A partir do aditivo contratual, assinado em dezembro de 2007, a Concessionária se comprometeu a fazer investimentos de R$ 1,2 bilhão no sistema, o que inclui a compra de 19 novos trens, que entraram em operação entre o segundo semestre de 2012 e março do ano passado (um investimento de R$ 320 milhões).

Além da compra dos novos trens, continua, foram feitos investimentos em infraestrutura, que incluem as estações Cidade Nova e Uruguai; modernização do Centro de Controle Operacional; modernização dos sistemas de segurança e sinalização; implantação de acessibilidade total para pessoas portadoras de necessidades especiais em todas as estações; a construção da conexão direta Pavuna/Botafogo, a compra de novos simuladores de condução; e construção ou ampliação de novas subestações de energia. 

A SuperVia, por meio da assessoria de imprensa, alega que ampliou a própria parte no contrato de Concessão com o Governo do Estado após conseguir um financiamento junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Com isso, a parte da concessionária no acordo foi recebeu R$ 900 milhões a mais, passando de R$ 1,2 bilhão para R$ 2,1 bilhões. O Governo do Estado é responsável por outros R$ 1,2 bilhão no programa de investimentos em parceria com a SuperVia, que inclui: a renovação da frota de trens; o reforço no novo sistema de sinalização, que permitirá a redução de intervalos entre as composições; o novo centro de controle operacional; um novo sistema de sonorização; a revitalização de toda a infraestrutura ferroviária (estações, via férrea, equipamentos), entre outros.

Desde 2011, quando a nova gestão assumiu, alega, já foram investidos R$ 600 milhões em revitalizações da frota e de infraestrutura, como a troca de cerca de 100 quilômetros de trilhos, instalação de 70 mil dormentes, substituição de 80 mil metros de cabos de rede aérea e reformas de estações. Os investimentos estão em curso, como na modernização da frota. Em 2012, alega, 30 trens chineses, adquiridos pelo Governo do Estado, entraram em circulação. Outras 60 composições chinesas, também encomendadas pelo Estado, tiveram o prazo de entrega antecipado e chegam ao Brasil partir de abril de 2014. Em paralelo, a SuperVia antecipou em quatro anos a compra de 10 trens, todos fabricados no País e inicialmente previstos para o período 2017-2020. A previsão é de que até 2016 toda a frota de trens seja totalmente refrigerada e renovada, passando a contar com 221 trens.

"Uma das prioridades da SuperVia é reformar todas as estações para que sigam os padrões internacionais de acessibilidade. As intervenções incluem a adaptação de bilheterias, instalação de elevadores, escadas rolantes, piso tátil, banheiros adaptados e rampas de acesso, que melhorarão o deslocamento de pessoas portadoras de necessidades especiais. Além dos padrões de acessibilidade adotados, a reforma também prevê a construção de cobertura nas passarelas e plataformas, recuperação dos pisos, nova comunicação visual e iluminação. As estações Bonsucesso, Manguinhos, Silva Freire, Corte 8, Piedade, Quintino, Cascadura, Vila Inhomirim, Fragoso, Iriri e Bananal foram as primeiras a serem contempladas. Magé, Maracanã e São Cristóvão estão em fase de reformas. Todas as estações serão aperfeiçoadas e o investimento previsto é de R$ 376 milhões até 2020".