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Aluno de faculdade descredenciada no Rio entrega monografia para porteiro

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William Bezerra Lopes, 22 anos, pagou 48 mensalidades, cada uma na faixa de R$ 600, e, no oitavo período do curso de publicidade e propaganda da UniverCidade, no Rio de Janeiro, tinha o sonho de obter a graduação e partir para o mercado de trabalho. Tinha, pois, assim como outros 9,5 mil alunos, incluindo os que estudavam na Universidade Gama Filho, viu seu sonho ser adiado por tempo indeterminado, após a decisão do Ministério da Educação (MEC) de descredenciar as duas instituições.  

“Estamos sendo punidos no lugar do grupo”, reclamou o estudante sobre o Grupo Galileo, mantenedor das duas universidades. “Fui até o prédio da unidade onde eu estudava, em Ipanema (zona sul do Rio), mas não havia professores, diretores, ninguém para receber a minha tese. Tive que deixar nas mãos de um porteiro na esperança de que algum professor passasse por lá”, lamentou, sem saber se vai conseguir se formar, mesmo já tendo concluído todas as matérias.  

Pela decisão do MEC, ambas as instituições estão descredenciadas e, além de não poderem receber novos alunos, terão que remanejar os já existentes para outras faculdades - a UniverCidade, segundo o presidente do grupo, Alex Porto, possui 4 mil alunos, enquanto que a Gama Filho, outros 5 mil. “É uma decisão esdrúxula”, contestou Porto, que, em coletiva de imprensa na tarde desta terça-feira, comunicou aos jornalistas que o grupo ingressará com ação no Conselho Nacional de Educação e na Justiça para reverter a decisão do ministério.  

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Descartando por ora um pedido de recuperação judicial, uma vez que “a gente não aventou essa possibilidade, pois o patrimônio das instituições é passível de pagamento, está estimado em torno de R$ 1 bilhão”, Porto alegou que, “quando assumimos as instituições há 12 meses, a gente visualizou um quadro de muita dificuldade. Mas estamos trabalhando nesse processo de reestruturação. A gente percebeu que essa questão bancária consumia grande parte dos recursos, e os empréstimos asfixiavam o fluxo de caixa”.  

Segundo o presidente do Grupo Galileo, a dívida acumulada hoje pelas instituições gira em torno de R$ 500 milhões junto ao passivo - estimado em cerca de três mil funcionários - , inclusos, neste caso, todas as ações trabalhistas, por exemplo. Os atuais docentes e administradores das duas universidades estão em greve desde o ano passado, sem receber os salários relativos aos meses de outubro, novembro e dezembro, além do 13º salário (os que ainda tem vínculo empregatício têm a receber cerca de R$ 33 milhões). Outros R$ 400 milhões provenientes de encargos trabalhistas elevam o valor para R$ 900 milhões.  

Ainda assim, o grupo acredita “que em cerca de 30 dias é possível reverter este processo por meio de uma capitalização via debentures, no valor de R$ 400 milhões, além da venda ou cessão por 40 anos de alguns dos nossos imóveis afim de que saldemos nossas dívidas e possamos nos reorganizar, mas nada disso é possível com esse descredenciamento arbitrário, que nos impede, por exemplo, de termos as certidões para vendermos os imóveis”, explicou Alex Porto.

Enquanto novos capítulos desta complicada novela não vêm à tona, os professores seguem desestimulados, e os alunos, sem previsão de quando vão se formar, ou se vão conseguir vaga em outra universidade. Guilherme Pereira, 29 anos, aluno do nono período do curso de direito da UniverCidade, do campus Gonçalves Dias, no centro do Rio, conta que “há dois anos que nós não temos aulas direito, já passamos por três greves. Foi tudo na base do professor finge que ensina, e a gente finge que aprende. É lamentável”. 

Ele reclama ainda que não existe um canal eficiente de comunicação com o grupo Galileo. “No sistema de telefone que eles nos passaram, a pessoa diz que as aulas estão normais e não se tem qualquer tipo de informação.” Pereira se diz abismado ainda pelo fato de que, “mesmo com um campus sujo, sem manutenção, onde os elevadores não funcionam, eles ainda me mandam a mensalidade de janeiro (no valor de R$ 653)”, disse, mostrando o boleto.  

O presidente do grupo pediu a compreensão por parte dos alunos das duas instituições, tendo em vista a greve por tempo indeterminado de docentes e funcionários administrativos. Alex Porto informou que todos os que quiserem pedir automática transferência para outras universidades devem fazer a solicitação pelo e-mail [email protected].  

“Não estamos nos eximindo da nossa responsabilidade, mas a inadimplência está sendo encaminhada para uma solução, que infelizmente não tem a velocidade que a gente necessita”, explicou, reiterando que uma força-tarefa de 15 funcionários foi montada para responder às solicitações. Ele não soube explicar como um grupo tão pequeno pode dar conta dos pedidos que devem ser muitos - principalmente se a decisão de descredenciamento do MEC não for revertida.  

Raíssa Bakker, 24 anos, aluna bolsista integral do curso de direito da UniverCidade, também no centro do Rio, vive o dilema de não saber se, via programa ProUni, conseguirá ser alocada em outra instituição. “O MEC tem que intervir nessa parte, mas é preciso que se crie mais vagas para que alunos bolsistas como eu não fiquem a ver navios”. Sobre o grupo mantenedor, ela desabafa: “a gente fica pensando se esse grupo existe mesmo, ou se é só um CNPJ para pegar o nosso dinheiro”.