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Saída é renegociar dívida

Candidato do DEM ao governo do Rio quer repactuar acordo fiscal com a União

José Peres -
Eduardo Paes
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No fim do ano passado, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro condenou o ex-prefeito Eduardo Paes, então do PMDB, por abuso de poder político-econômico e conduta vedada a agente público nas eleições de 2016, que o tornou inelegível por oito anos. No último mês de maio, uma liminar do TSE, que ainda será julgada, suspendeu a decisão do TRE-RJ. Dois meses depois, Paes se lançou candidato ao governo do Rio pelo DEM, partido a que está filiado desde abril. Ele já foi dos quadros do PV, PFL, PTB, PSDB e PMDB. Se eleito, pretende ir ao novo presidente da República para repactuar o acordo de recuperação fiscal e pedir que o governo federal permaneça com suas tropas, no Rio. A entrevista para o JORNAL DO BRASIL foi feita na sede do jornal, no Centro da cidade, a pedido do candidato.

Ao ser perguntado sobre uma sugestão de passeio pelo estado, ele preferiu ficar pela cidade do Rio, mesmo, e cravou Madureira: “O bairro tem uma produção cultural, centralidade, uma mistura de gente, o samba que é minha paixão. Tem boa comida a cada esquina, tem a feijoada da Surica e bons botecos”, afirmou.

Macaque in the trees
Eduardo Paes (Foto: José Peres)

Terminada a prefeitura, o senhor passou um ano nos Estados Unidos. Como foi esse período?

Eu tinha um convite para ser professor visitante na Universidade Columbia [em Nova York] e consultor do Banco Interamericano de Desenvolvimento [em Washington]. Fui apresentado pelo [Mike] Bloomberg, ex-prefeito de Nova York, para o maior fabricante de carros elétricos do mundo, uma empresa chinesa que tem fábrica na Califórnia. Virei vice-presidente para América Latina dessa empresa. No dia 23 de janeiro, estava no BID, já como consultor. Em fevereiro, assumi o trabalho na BYD. Fiquei morando em Washington. Minha rotina era, toda a semana, ir para algum lugar na América Latina. Passei um ano inteiro vendendo empilhadeira, carro, caminhão, trator elétrico e painel solar.

O que o fez retornar?

Cumpri meu programado. Voltei e abri um escritório da empresa aqui. Comecei a receber muita pressão para ser candidato a governador. É óbvio que eu também queria. Gosto de fazer política.

Por que mudou de partido?

Por motivos óbvios. O PMDB viveu um processo de muita deteriorização da sua imagem. Eu tinha que dar um sinal para a sociedade que eu não compactuava com tudo o que se revelou ali [na Lava Jato]. Essa foi a minha sexta mudança de partido.

Mas as pessoas das quais quis se afastar são seus aliados agora. Não é contraditório?

Eu disse que entendi que tinha que sair do PMDB para dar uma mensagem clara para a sociedade que eu não compactuava com isso, não quis me afastar de ninguém. Até porque nunca estive próximo de ninguém.

Sua candidatura está apoiada em uma liminar do TSE. Isso não gera instabilidade?

Em mim, não. Era bom que julgassem logo. O TRE chancelou minha candidatura sem contestação. Só para lembrar, essa situação é fruto do planejamento estratégico que nós fizemos na prefeitura. Não é uma condenação em segunda instância por ato criminal ou corrupção. O Pedro [Paulo] quando se candidatou [à prefeitura, em 2016] usou esse planejamento como base para o plano de governo, o que era o óbvio, porque ele era o candidato do governo e era um plano aberto. A alegação é que eu teria privilegiado o candidato.

Eleito, qual será sua primeira providência?

Antes de tomar posse, ainda na transição, vou pedir uma audiência ao futuro presidente da República para repactuar o acordo de recuperação fiscal e, de outro lado, pedir que, após o fim da intervenção militar, que termina no dia 31 de dezembro, que o governo federal permaneça com suas tropas, no Rio, sob meu comando, usando nova estratégia.

Qual seria essa nova estratégia?

A política de segurança pública é uma coisa muito complexa para se explicar em uma entrevista, precisava de uma palestra. Mas eu diria algumas prioridades: atacar imediatamente essa coisa da violência nas ruas, aumentando o policiamento ostensivo. Precisa agir com mais inteligência. Tem que criar uma corregedoria independente, ligada ao gabinete do governador e usar as forças armadas como elemento importante na dissuasão de conflito entre facções criminosas, na retomada de territórios e para impedir que territórios sejam expandidos.

E a verba para isso?

O estado, com o acordo de recuperação fiscal, já recebeu um alívio grande, recuperou a capacidade de pagar seus servidores. Há um espaço, não no campo das despesas, mas das receitas, para se ajustar as contas do estado. Tem um conjunto de privilégio fiscal — não estou me referindo ao incentivo fiscal, mas de gente que se utiliza do incentivo fiscal para se dar bem. Você tem uma sonegação enorme, uma administração tributária arcaica que pode ser modernizada. Na prefeitura do Rio, mostrei que sei administrar as finanças.

O atual prefeito diz que encontrou um rombo maior do que o previsto: obras não foram concluídas e fornecedores sem pagamento. O que diz?

O Tribunal de Contas do Município já desmascarou o prefeito. É normal ficar seis meses culpando o antecessor. O relatório do TCM desmente essas afirmações e tem uma coisa concreta: a dívida que eu deixei é muito menor do que a que eu peguei.

Quais os números?

Mais ou menos, em valores atualizados, passamos de R$ 14 bilhões para R$ 10 bilhões.

Qual o principal ponto a se atacar para o Rio voltar a ser um estado economicamente pungente?

Se a gente recuperar as finanças do estado e avançar na segurança pública, se recupera uma credibilidade institucional que vai ajudar o estado a retomar o rumo. Para mim, crise é oportunidade. O Rio, em determinado momento, teve uma sensação de segurança e explodiu, no bom sentido.

O que aconteceu? Era só sensação?

Olha só, em determinado momento, os índices, de fato, caíram. Porém, a política pública implementada não foi suficiente para dar sustentabilidade a essa queda de índice.

É contra ou a favor das UPPs?

Isso não tem como ser contra ou a favor. As UPPs não são uma política de segurança pública, são um projeto de policiamento comunitário de proximidade que, em alguns casos, pode funcionar e, em outros, não.

Muito se falou que faltou implementar nas UPPs ações sociais e serviços que deveriam ser da prefeitura. Isso é fato?

Isso é desculpa de quem não quer fazer política de segurança pública. Ninguém vai ouvir esse governador aqui responsabilizando o prefeito por isso.

Um dos pontos que atrapalharam o Rio foi a dependência do petróleo. Como avalia isso?

Tem que ir na Petrobras e falar sobre Comperj, imediatamente. Tem que ir em cima da Petrobras, jogar muito pesado. Usar muito a força política do estado do Rio. Tem que sobreviver hoje, então, óleo e gás é fundamental, nosso grande motor de crescimento. Porém, em paralelo, tem que ir mudando a matriz econômica do estado. Mas isso não é coisa de um mandato ou dois.

O que vislumbra?

O Rio tem algumas vocações, como turismo e sociedade do conhecimento. Com investimento em logística, pode criar um parque industrial mais fortalecido. Tem potencial agrícola grande. Tem área de logística, como o Porto do Açu, que são possibilidades incríveis. Tem caminhos para o estado.

O que pensa em fazer com a Cedae?

Não privatizo de jeito nenhum. A Cedae é um ativo do estado, cumpre papel importante. A Cedae permanece estatal, produtora de água, e a gente faz concessões e PPPs em áreas.

Será que Maricá vai lhe perdoar?

Certamente. [canta trecho do samba que compôs em homenagem à cidade: não existem mais estrelas no universo do que no céu de Maricá]. Hoje, o estado inteiro está muito ruim, tirando Maricá e Niterói. O episódio de Maricá foi uma conversa privada [com o ex-presidente Luz Inácio Lula da Silva], de uma brincadeira que foi trazida a público, mas uma brincadeira, de muito mau gosto [chamou Maricá de “merda de lugar”], de que já me desculpei com a cidade publicamente, me desculpei lá pessoalmente. Não posso também me martirizar. O curioso na campanha é que as pessoas falam que são de Maricá, para mim.

José Peres - Eduardo Paes