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Editorial: O preço de uma eleição no Rio de Janeiro é uma Cedae

O único destino ético e correto dos recursos obtidos pela venda da Cedae deveria ser a redução do endividamento do estado

Por EDITORIAL JB, [email protected]

Publicado em 28/08/2021 às 01:12

Alterado em 28/08/2021 às 07:27

O jovem cantor gospel parece um homem honesto, mas sua fé se apequena perto da ganância pelo poder. Buscando a reeleição, o governador Cláudio Castro já começou a distribuir, literalmente, cheques em eventos políticos no interior do estado, o que, aliás, o Ministério Público deveria proibir Foto: reprodução

Em campanha pelo interior do estado, o governador Cláudio Castro já começou a comprometer de forma eleitoreira os recursos obtidos com a privatização da Cedae. Com isso, o estado do Rio continuará inviável por conta da irresponsabilidade política e do mau uso do dinheiro público.

Não se discute a necessidade, ou não, de privatizar a única grande estatal carioca. No entanto, um ponto é certo: comprar empresas públicas monopolísticas é tão bom, que empresas estatais europeias estão aqui comprando o que for ofertado. Vide a Enel, estatal italiana que adquiriu várias usinas/distribuidoras estatais de energia do nosso país, fazendo do governo italiano, hoje, a maior empresa privada do setor elétrico brasileiro, atuando no setor de geração, distribuição e transmissão, com 17 milhões de clientes no país. Em resumo: ser estatal não é tão ruim assim... O capital adora monopólios.

Não se trata, portanto, de uma crítica ideológica à venda da Cedae, mas sim de saber as consequências nefastas dessa perda para o estado do Rio de Janeiro, pois em primeiro lugar, na realidade, não houve privatização. O que houve foi uma transferência de monopólio. Simples assim.

A Cedae é mais uma prova de lesa-pátria imposta por um estado anacrônico, assim como foi a privatização da Vale do Rio Doce e, mais recentemente, a da BR Distribuidora. E o mais grave: onde foram parar essas centenas de bilhões de reais das privatizações? Nos bolsos dos banqueiros (leia-se, principalmente, Itaú, Bradesco e Santander), via rolagem da dívida pública que só aumentou desde o governo FHC. Com as vendas das estatais, os recursos não seriam destinados ao pagamento/diminuição do endividamento do país? Pois a dívida decuplicou. E a miséria da nação só aumentou. O país perdeu seu patrimônio sem saber, agora, que destino terá com a extrema direita no poder, aliás, apoiada por Cláudio Castro.

Mais uma vez, não se trata de crítica com viés ideológico à privatização da Cedae. Se quisessem, mesmo, privatizar, por que não ofereceram as ações de forma pulverizada no mercado? Em outras palavras, no sistema capitalista de verdade, pouco importa quem é o dono do meio de produção. O que importa mesmo é a competição que o grande empresariado brasileiro, dominado pelos bancos, detesta. Nunca experimentamos o regime da livre empresa no Brasil. Aqui vivemos o “quem é quem” no governo sempre disposto a negociar.

Se o PT não privatizou quando governou o país por 14 anos seguidos, fez pior: entregou as estatais, sobretudo a Petrobras, a quadrilhas especializadas em lesar os cofres públicos.

Agora, no âmbito do estado do Rio de Janeiro, a sociedade, a verdadeira dona da Cedae, foi “privatizada”, caindo no colo de gente preparada, sim, para aumentar ao consumidor o preço de sua conta mensal.

Wagner Victer, ex-secretário de Energia e ex-presidente da Cedae, provou por números, de forma empírica, que a venda da estatal carioca só tem um vencedor: quem comprou e que vai impor, pelo monopólio, tarifas aumentadas e jamais vistas pelo consumidor. E um perdedor: o cidadão que irá pagar a conta.

E ainda mais grave. R$ 17 bilhões arrecadados pelo governo do Rio terão um só destino: custear de forma irresponsável a reeleição do governador Cláudio Castro - sem nenhuma cobrança de qualquer setor político do Rio, que permite tamanha atrocidade.

O atual governador do estado do Rio foi “eleito” com 10 mil votos. Sim, o sr. governador era vereador e teve pouco mais de 10 mil votos. Quis o destino que ele, tendo aceitado ser vice do “honesto” Wilson Witzel, se tornasse governador.

O jovem cantor gospel parece um homem honesto, mas sua fé se apequena perto da ganância pelo poder. Buscando a reeleição, o governador Cláudio Castro já começou a distribuir, literalmente, cheques em eventos políticos no interior do estado, o que, aliás, o Ministério Público deveria proibir, pois tais atos são claramente ilegais do ponto de vista eleitoral. E medíocres, do ponto de vista político-pessoal

Em resumo, Cláudio Castro, ao invés de agradecer a Deus por ter sido alçado ao cargo de governador, “sem legitimidade eleitoral”, e resolver uma vez por todas a caótica situação financeira do governo estadual, prefere fazer pacto com o diabo ao “torrar R$ 17 bilhões da Cedae” para se reeleger e deixar o Rio na mesma situação de sempre - na total insolvência.

O único destino ético e correto dos recursos obtidos pela venda da Cedae deveria ser a redução do endividamento do estado.

O futuro não cobra dos políticos. Tudo se esquece com o passar do tempo. Mas o aumento da miséria e a violência são as consequências.

Este será o legado do governador Cláudio Castro, um “homem de fé”.