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Ameaça dos robôs: especialista afirma que fake news se espalha mais rápido do que notícia

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As mídias sociais terão sua maior influência até hoje nas campanhas eleitorais do Brasil: os partidos e políticos poderão impulsionar o seu conteúdo nas redes. Com o limite de financiamento de campanha, elas serão ferramenta crucial para quem precisa de medidas alternativas para alcançar os seus eleitores. 

De acordo com o professor e coordenador do MBA em Marketing Digital da Fundação Getúlio Vargas (FGV), André Miceli, as notícias falsas, apesar de não serem novidade na disputa eleitoral, serão mais facilmente disseminadas através dessas ferramentas e os robôs podem representar um perigo para o debate eleitoral. “Vinte por cento do debate político na internet é feito por bots (robôs).”

O senhor acredita que as mídias sociais serão decisivas para o resultado das eleições de outubro? 

Nas majoritárias, não. No Brasil, 70% da população tem conexão com a internet. É um número bom, mas não sei se temos um movimento e interesse relevantes nas redes que sejam determinantes para eleger um presidente. Já proporcionalmente pode ser decisivo, porque uma campanha bem feita nas redes pode conseguir 20 mil votos, e isso é suficiente para eleger um deputado. 

Como as fakes news podem in?uenciar no debate eleitoral? 

A sua timeline é construída automaticamente de acordo com o que você interage. E nela vão ter notícias verdadeiras ou falsas, mas que corroboram a sua opinião. O perigo está aí. Vinte por cento do debate político na internet é feito por bots (robôs). Ou seja, vamos supor que tenha um post sobre cachorrinhos doentes, e aí aparece um comentário “é melhor Jair se acostumando com cachorrinhos doentes”. Esse post é um robô. Ele pega um todo e faz um comentário randômico sobre determinado partido ou político. E isso faz com que as pessoas comecem a discutir em cima daquele tema sem ter ideia de que quem começou foi um robô.

Quem controla esses robôs? 

Os partidos, os políticos e as pessoas entusiastas desses políticos.

Não existe uma medida para punir quem controla esses robôs? 

Não. Você pode desqualificar a notícia, denunciar a pessoa, mas não existe uma lei para punir a pessoa por fazer isso. Você pode até denunciar o perfil, mas esse cara que fez esse post tem outros vários perfis falsos fazendo o mesmo. Não tem muita solução.

Como reduzir o efeito da notícia falsa depois da divulgação? 

Uma fake news se espalha, em média, cinco vezes mais rápido do que uma notícia normal e verídica. Muito provavelmente porque ela carrega dentro de si um componente inusitado. Quando se trata de uma retratação ou esclarecimento, o alcance é de 20% ou 30% de uma notícia falsa. De alguma maneira, esse é o mesmo efeito da errata de um jornal ou revista. Tem outra questão: é no grupo de famílias do whatsapp que a fake news reverbera mais forte. E é muito difícil que as pessoas que descobrem que estavam erradas se retratem. Isso certamente não vai acontecer. 

Uma pessoa que sente afetada pela fake news tem direito de resposta? 

Se alguém se sentir ofendido, vai poder recorrer para que tenha direito de resposta, ou para que o partido desminta. É claro que existe uma linha tênue entre uma fake news e uma notícia tendenciosa. Certamente o que a gente vai ver são partidos policiando muito as redes de outros dizendo que tudo é fake news, para que, de alguma maneira, eles consigam acabar com a notícia que não lhes convém. 

Notícia falsa sempre houve em eleições. Qual a diferença deste ano, com as redes sociais? 

As notícias falsas provavelmente já ajudaram a eleger outros presidente no Brasil e fora dele. Atualmente, o que existe é um contexto político diferente. O engajamento vai ser maior, muitas vezes para que o indivíduo prove o seu próprio ponto de vista. As redes são viabilizadoras desse processo de capilarização em larguíssima escala. Hoje, está todo mundo a dois, três, cliques de distância no celular. 

Até que ponto o uso da tecnologia poderá impactar na escolha dos candidatos? 

Essas informações estão associadas a um posicionamento que ameaça as pessoas de alguma maneira. Em 2001, quanto mais as pessoas diziam que iam votar no Lula, mais o dólar subia. Quando ele deu a resposta que o mercado queria, houve uma descolagem do preço do dólar e da intenção de voto. Esse tipo de coisa determina o voto das pessoas: aborto, aposentadoria, desarmamento, etc. A partir daí, tanto os partidos vão ter que medir sobre o que está acontecendo, quanto as pessoas vão ter que verificar se não estão tomando decisões por motivos errados.

As redes con?rmam as posições. 

O Facebook é muito restritivo na construção de uma bolha de informação. Para você melhorar a sua experiência de navegação, ele privilegia aquilo que você concorda, e os posts das pessoas que concordam com você. Para o Facebook, 150 reações são suficientes para que ele consiga prever a sua reação a um post de maneira mais precisa do que a sua mãe. 

Além dos candidatos, o jornalista vai sofrer pressão ao publicar matérias sobre determinados temas. 

Também não tem o que fazer. Há algum tempo o jornalismo de opinião era restrito a quem tinha muito alcance. Hoje em dia, todo mundo posta opinião nas redes. E mais, hoje eu consigo ter acesso ao jornalista pelas redes. O que daria para fazer é se excluir delas, mas também não é simples. A proteção da tela fala muito alto. 

O ministro do STF, Fux, a?rma que “pode ter anulação da eleição se ela foi objeto de massi?cação de fake news”. O senhor acredita nisso? 

É uma falácia. Ele está falando isso porque ele precisa se posicionar. Como você consegue definir o que você leu na sua vida e que tenha sido importante para você formar opinião sobre determinado assunto? Existirão fake news? Sem dúvida. Pró e contra o tempo inteiro e para todos os candidatos. Mas não tem como comprovar isso para que haja anulação do pleito.

Qual melhor forma de evitar isso? 

Esses integrantes de combate a fake news (fact checking) vão alertar aos veículos de que algo está acontecendo, e esses veículos irão checar a notícia. As pessoas vão ser responsáveis por validar aquilo que recebem e os grandes veículos vão ser responsáveis por facilitar o acesso para que essa validação aconteça. Agora, vamos precisar despertar nas pessoas o desejo de validação dessas informações.