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O lobby vai virar lei: tendência é aprovar projeto substitutivo de Cristiane Brasil

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Com décadas de atraso, a tentativa de uma abrangente regulamentação do lobby no Brasil está ameaçada e pode não avançar como deveria na Câmara dos Deputados. A necessidade de deixar às claras como pode funcionar esse tipo de atividade é urgente, Há no país uma terra sem lei para o lobista que circula livremente, sem qualquer identificação e controle de sua atuação. Mas, a proximidade das eleições tem levado à resistência por parte dos deputados que não estão dispostos a tratar de um tema considerado tão árido neste momento. Isso porque a própria palavra lobby está carregada de conotação negativa, além de ser ligada à corrupção na perspectiva da sociedade, explica o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), autor do projeto de lei sobre o tema. 

O lobby é muito mais amplo e pode ser feito de forma legítima pela própria sociedade e entidades representativas, por corporações ou mesmo por empresários, influenciando desde a elaboração de políticas públicas, projetos em discussão ou até mesmo decisões de governo. Mas, quando se trata principalmente de compras e contratações, a atividade precisa ser regrada para evitar a prática de tráfico de influência e corrupção. Se o debate não avançar, Zarattini acredita que a tendência deve ser aprovar o substitutivo à sua proposta, relatado pela deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), que é considerado um texto mais fraco e sem as exigências necessárias para garantir transparência ao lobby. 

Na tentativa de resgatar pelo menos parte do projeto original, o deputado Zarattini articulou a apresentação de uma emenda aglutinativa no plenário, que atenda às recomendações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e, ao mesmo tempo, contemple alguns pontos das propostas da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), entidade dos profissionais do lobby. Mas nem isso foi adiante. Segundo Zarattini, diante da falta de acordo, seria menos pior votar o texto como está para não ir para o arquivo e ter que começar a tramitação do zero. “Estamos em um dilema, se é melhor aprovar uma lei fraca e corrigir na próxima legislatura porque  pelo menos colocaria o país em patamar melhor”, acrescenta. 

O texto de Cristiane Brasil regula apenas a profissão do lobby e prevê que qualquer pessoa, física ou jurídica, pública ou privada poderá exercer a atividade de lobista, chamado, na proposta, de agente de relações institucionais e governamentais. Para atuar, os lobistas poderão pedir seu cadastro para garantir, por exemplo, o direito de apresentar sugestões de emendas e substitutivos. Mas o substitutivo não exige, por exemplo, o credenciamento obrigatório dos lobistas, o que dificulta o controle e possíveis punições em casos de atuações indevidas. 

Dessa forma, uma vez que o lobista não é obrigado a fazer o registro, de nada adianta colocar no texto que o registro será negado ao agente que tenha sido condenado por ato de corrupção, tráfico de influência, concussão, advocacia administrativa ou improbidade administrativa, enquanto durarem os efeitos da condenação. Também não está prevista a prestação de contas aos órgãos de controle, mediante apresentação de relatórios online conforme prevê resolução da OCDE, de 2010, que recomenda que os países regulem o lobby de forma abrangente e com a adoção de regras e mecanismos de registro e controle das atividades com a exigência de prestação de contas públicas. 

Aprovar o texto substitutivo dessa forma seria uma regulamentação para inglês ver. É assim que avalia o consultor legislativo do Senado e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Luiz Alberto dos Santos. Para ele, a própria definição de quem é lobista também é prejudicada no substitutivo que apenas disciplina a “atividade de representação de interesses nas relações governamentais” e limitando o escopo às relações entre Administração e administrado ou processos decisórios que impliquem sugestão, modificação, interpretação, revogação ou extinção de norma jurídica. 

O texto apenas tangencia o tema do lobby e exclui a regulamentação de todos os demais processos de tomada de decisão onde, segundo Luiz Alberto, o lobby é comum e forte, como no caso da formulação ou implementação de políticas públicas. O substitutivo ainda é falho ao não estabelecer regras para determinar que o agente público ouça um grupo de interesse específico e também um outro de vertente contrária. A atuação de funcionários que representam interesses órgãos públicos também fica sem qualquer regramento. O texto original tratava da atividade nos três poderes. Na versão da relatora, o Judiciário ficou de fora. 

Segundo Luiz Alberto, o Brasil já avançou em alguns temas que complementam o sistema de controle dos efeitos nocivos do lobby, como foi o caso da Lei de Acesso à Informação, de Conflito de Interesses, a Lei Anticorrupção e a proibição do financiamento empresarial nas eleições. Mas, regulamentar o lobby é fundamental para dar transparência nas relações públicas e privadas, principalmente diante dos episódios recentes de corrupção e tráfico de influência. A Abrig estima que cerca de 4 mil pessoas atua profissionalmente como lobistas no país, mas apenas 400 são associados.