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'Le Monde': Um mergulho no “laboratório do horror” chamado Cracolândia

Francês especialista no PCC conta como sobreviveu a incurção à Cracolândia

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Arma na cabeça, gritos, e a tentativa de explicar o que estava fazendo ali: assim começa o texto do professor francês Bertrand Monnet, publicado neste domingo (28) pelo jornal Le Monde. Ele conta sua experiência após ter sido pego na Cracolândia por 15 criminosos do PCC (Primeiro Comando da Capital), que suspeitaram que ele e seu tradutor fossem policiais. 

Com um milhão de consumidores, o Brasil é o primeiro mercado mundial do crack, fumado em todo o país. O “laboratório do horror” é a Cracolândia, que Monnet descreve como um “concentrado do inferno em um quilômetro quadrado. Um aglomerado de barracas cheias de homens, mulheres e adolescentes em estado de higiene precária. Em frente, “zumbis assexuados, sem idade, descarnados, e metade nus se ajoelham, uns sobre os outros, com coberturas sujas sobre os ombros, muitos caídos no chão, em cima do lixo, completamente drogados”.

Artigo descreve como o professor francês de Gestão de Riscos Criminais da escola de Administração de Empresas Edhec, em Lille, no norte da França, estava na Cracolândia realizando uma pesquisa quando foi detido por membros da facção criminosa PCC.

O longo editorial afirma que por muito pouco Bertrand não conseguiu sair vivo. Agredido e “julgado” por um chefe da facção criminosa, ele acabou sendo liberado. A experiência, como ele mesmo diz, é a perfeita tradução da influência do grupo no país e, mais recentemente, no exterior.

Monnet aponta que embora a polícia tenha deflagrado uma operação de “limpeza” da Cracolândia, prendendo 38 traficantes e milhares de dependentes químicos "eles sempre acabam voltando".

O professor explica que para entender o crime organizado no Brasil é preciso entender o PCC, a máfia mais poderosa do país. Criada nas prisões brasileiras, nos anos 90, a organização é chefiada pelo traficante Marcola, da cadeia. O pesquisador lembra que seus 4 mil integrantes encarcerados enfrentam seus inimigos do Comando Vermelho e da Família do Norte dentro das próprias penitenciárias, mas é no resto do país e no exterior que o PCC faz fortuna com a venda de toneladas de cocaína, maconha e crack.

Bertrand afirma com todas as letras que o PCC é uma multinacional do crime e seu modelo econômico é muito simples. "Primeiramente, ele é baseado na compra da droga dos produtores bolivianos e paraguaios, através de representantes das organizações presentes nos dois países”, descreve. 

“Além disso, possui também uma posição dominante na revenda no mercado brasileiro. Inclusive as máfias concorrentes são obrigadas de comprar do PCC, que se transformou em um fornecedor central.”

Monnet diz que a organização também se expande para outros continentes, fornecendo droga para a máfia italiana Ndrangheta, da Calábria, o primeiro importador de cocaína da Europa. O PCC envia o produto para Anvers, na Bélgica, e Roterdã, na Holanda, escondido em contêineres despachados do porto de Santos, no Estado de São Paulo.

“Mas o paralelo com a economia formal para por aí. O que o PCC vende é o vício e a morte. Um dos principais produtos é o crack, uma das drogas mais pesadas do mundo”, lembra o pesquisador.

> > Le Monde