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Só ricos e mídia têm a lucrar com impeachment, diz Requião

Em carta, senador alerta que 'Ponte para o Futuro' do PMDB é "pacto regressivo"

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O senador Roberto Requião (PMDB) afirmou em carta direcionada a políticos que o afastamento da presidente Dilma Rousseff radicalizaria a crise econômico-financeira em curso. O documento, assinado por ele e pelo economista José Carlos de Assis, intitulado Carta aos Governadores e Deputados Federais, diz que todos, menos os ricos e a mídia, pagariam pelo impeachment. Faz ainda uma crítica ao programa Ponte para o Futuro do PMDB, "um pacto regressivo" que, de acordo com o peemedebista, busca destruir direitos sociais básicos conquistados em 88.

Mais grave ainda que o projeto do PMDB para o país, argumenta Requião, é a política fiscal anunciada pelo senador José Serra (PSDB) em forma de projeto de lei, congelando o teto da dívida pública. O senador destaca que a proposta do tucano impede a realização de investimentos deficitários em tempos de recessão e depressão. "A consequência direta disso seria a quebra definitiva dos Estados, estrangulados que estão pela draconiana Lei de Responsabilidade Fiscal, que ele considera cláusula pétrea."

Para o senador, a derrota do impeachment daria à presidente Dilma Rousseff uma oportunidade de rever sua política conforme a demanda dos que manifestam apoio ao seu governo. A aprovação do processo de impedimento, contudo, "significará um aprofundamento do ajuste". 

"Nada será garantido. Ciclos sucessivos de depressão estrangularão as contas públicas em ajustes recorrentes, estrangulando gastos públicos e salários, inclusive de aposentados e pensionistas. Em suma, todos, menos os ricos e a mídia, pagaríamos pelo impeachment", alertou o peemedebista.

No início deste mês, o senador pelo PMDB há mais de 30 anos tinha destacado que um eventual governo do vice-presidente Michel Temer "seria um desastre igual ao que está sendo o da Dilma", em entrevista à BBC Brasil.

Confira a carta, na íntegra:

À margem de ideologias e de querelas político-partidárias, o governo ou governos anunciados para depois do impeachment prenunciam consequências econômicas e sociais desastrosas para a sociedade brasileira. Já vivemos a maior crise econômica de nossa história, com uma contração da economia de cerca de 8% em dois anos, e a perspectiva concreta de taxas de desemprego sem precedentes levando a um progressivo estágio de degeneração social com conflitos no campo e nas cidades, e de convulsões sociais generalizadas.

A maioria dos Estados está literalmente falida. Salários de servidores estão sendo cortados ou adiados, obras públicas estão sendo paralisadas, funções fundamentais dos governos estaduais tem sido canceladas. É preciso reconhecer com franqueza que a crise se deve sobretudo à política econômica adotada a partir de 2015 na forma de um ajuste fiscal absolutamente injustificável no contexto de uma depressão econômica. Embora involuntariamente, a operação Lava Jato também contribuiu para o agravamento da crise.

Mas o impeachment, isoladamente, não resolverá esses problemas. Da mesma forma a derrota do impeachment, sem outras consequências, não os resolverá. O fato é que temos uma estreita margem de manobra entre uma alternativa e outra. A derrota do impeachment dará à Presidenta Dilma uma oportunidade de rever sua política conforme a demanda universal daqueles que lhe dão apoio. A aprovação do impeachment, por sua vez, pela palavra de seus proponentes principais, significará um aprofundamento do ajuste depressivo.

A Ponte para o Futuro pregada pelo PMDB de Temer é um pacto regressivo que visa a destruir os direitos sociais básicos conquistados pelo povo brasileiro em 88. Mais grave ainda é a política fiscal anunciada pelo senador José Serra, sob forma de projeto de lei congelando o teto da dívida pública e portanto impedindo a realização de investimentos deficitários em tempos de recessão e depressão. A consequência direta disso seria a quebra definitiva dos Estados, estrangulados que estão pela draconiana Lei de Responsabilidade Fiscal, que ele considera cláusula pétrea.

A síntese da crise se manifesta na questão fiscal, ainda manejada segundo os cânones neoliberais, de interesse exclusivo dos especuladores financeiros. A desorganização orçamentária do Governo federal e dos Estados reflete a quebra da soberania nacional em questões financeiras. A política econômica brasileira, com exceção dos anos 2009 e 2010, renunciou voluntariamente ao crescimento. A despeito de recessão e da depressão, nos recusamos a recorrer ao investimento deficitário e ao aumento temporário da dívida, embora sabendo que, numa depressão, a única saída é recorrer ao déficit público temporário, até que a economia volte a crescer de novo.

Se essa posição ideológica prevalecer – e é certo que prevalecerá em caso de impeachment – o Brasil afundará numa crise sem precedentes, que arrastará Estados numa avalanche de desorganização fiscal e inadimplência, afetando profundamente o setor privado. Nada será garantido. Ciclos sucessivos de depressão estrangularão as contas públicas em ajustes recorrentes, estrangulando gastos públicos e salários, inclusive de aposentados e pensionistas. Em suma, todos, menos os ricos e a mídia, pagaríamos pelo impeachment.

Roberto Requião, Senador da República

José Carlos de Assis, Economista e professor