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Descaso com vítimas: MPF de Goiás volta a pedir que governo e Cnen auxiliem vítimas do césio-137

Acidente aconteceu em Goiânia há 28 anos; órgãos não cumprem decisão judicial e recorrem há 15

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O Ministério Público Federal de Goiás requisitou que o governo do estado e a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) cumpram uma determinação judicial e prestem todo o auxílio necessário às vítimas do césio-137, em Goiânia. A cidade é marcada por um acidente radiológico que aconteceu há 28 anos e até hoje é considerado um dos mais graves do mundo.

No documento do MPF, divulgado na última sexta-feira (18), o procurador da República Ailton Benedito de Souza destaca que, em março de 2000, a Justiça Federal sentenciou que os dois órgãos tomassem várias medidas em relação às pessoas que, de algum modo, tiveram suas saúdes afetadas em decorrência do desastre. Entretanto, nenhuma ação foi tomada pelo governo ou pela Cnen desde então. 

Dentre as medidas sentenciadas pela Justiça Federal estão a garantia de atendimento médico até a terceira geração da vítima e a viabilização de transporte das pessoas em estado mais grave. O auxílio à população de Abadia de Goiás, onde os dejetos radioativos foram descartados, também figura no documento. Por fim, está a realização de um sistema de "notificação epidemiológica de câncer" entre os afetados pelo acidente.

Há 15 anos, governo e Cnen entram com inúmeros recursos para reverter a decisão da Justiça. Neste período, segundo informa o MPF de Goiás, algumas vítimas tiveram algum tipo de auxílio dos envolvidos, mas outras pessoas seguem sem qualquer ajuda. A requisição do Ministério Público tem prazo de 48 horas após a notificação e estipula multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento das determinações. Por fim, o órgão exige que o governo desenvolta, em até 30 dias, um programa de saúde especial para crianças que foram vítimas, direta ou indiretamente, da irradiação de césio-137.

Relembre o caso de Goiânia

O acidente de 1987 teve início no dia 13 de setembro, quando dois jovens catadores de materiais recicláveis abriram um aparelho de radioterapia em um prédio público abandonado no centro da cidade. O objeto, que pesava cerca de 100 kg e havia sido descartado de forma irresponsável, continha uma cápsula com césio-137, um metal radioativo.

Os catadores levaram o aparelho para casa  e, já no primeiro dia de contato com o material, os dois começaram a apresentar sintomas de contaminação radioativa. Eles sentiam tonturas, náuseas e vomitavam frequentemente. Após cinco dias, o equipamento foi vendido para o dono de um ferro-velho no Setor Aeroporto, Devair Alves Ferreira, também na região central da cidade. Lá, a cápsula foi aberta.

Devair, sua esposa Maria Gabriela Ferreira e outros membros da família também começaram a apresentar sintomas de contaminação radioativa. A primeira vítima fatal do acidente foi a menina Leide das Neves Ferreira, de apenas 6 anos. Ela se tornou o símbolo da tragédia e morreu depois de se encantar com o pó radioativo que brilhava durante a noite.

Posteriormente, o caso fez centenas de vítimas, mas o governo de Goiás e as autoridades envolvidas só se responsabilizaram por quatro das mortes. Na avaliação da Cnen, o acidente só não foi maior do que o registrado na usina nuclear de Chernobyl, em 1986, na Ucrânia. 

A tragédia ainda se alastrou pela cidade de Abadia de Goiás, para onde cerca de 6 mil toneladas de lixo radioativo foram levadas e permanecem até os dias atuais. Passados mais de 20 anos, os resíduos já perderam grande parte de sua radiação, mas, segundo especialistas, o risco completo de contaminação só deve desaparecer em pelo menos 275 anos.