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Garantia de direitos para quem vive na rua

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Daniel*, de 25 anos, teve uma adolescência difícil, como ele mesmo faz questão de resumir. Perdeu a mãe cedo, quando tinha ainda 14 anos, e, por ter um pai ausente, passou a ser criado pela irmã mais velha. As dificuldades de lidar com a realidade dolorida que a vida lhe impôs fizeram com que o então menino se entregasse às drogas e resolvesse sair de casa para viver na rua. 

Ele conta que precisou de força de vontade e muita solidariedade para mudar a vida. Sem usar drogas desde 2013, Daniel foi um dos milhares de moradores de rua que a Casa Santo André acolheu desde que começou a funcionar, há dez anos. A sede do espaço, conveniado com a Secretaria de Desenvolvimento Humano e Social, fica no Gama e atende cerca de 50 homens. O lote tem quatro quartos, banheiros, áreas de convivência, área para assistência social, capela e refeitório.

O jovem continua na Casa Santo André, mas agora como funcionário de serviços gerais. O salário é suficiente para pagar o aluguel de onde ele garante ter dias mais felizes do que os dos três anos que passou vivendo em avenidas do Setor Leste da região. “Quando eu estava na rua, domingo era meu pior momento; via as famílias indo à igreja, passeando, e a solidão batia com mais força.”

A experiência também lhe deu a chance de ajudar outros com histórias semelhantes. Começou como voluntário, indo com as equipes da instituição fazer o trabalho de abordagem a pessoas que precisavam de assistência para conseguir o básico, como uma consulta médica. É esse profissional — o chamado facilitador — que faz o primeiro contato com os atendidos, para começar a criar o que talvez seja o passo mais importante para o processo de abandono da rua: a confiança. São 15 equipes de abordagem, com quatro funcionários cada uma, que atendem diariamente todo o Distrito Federal pelo projeto Cidade Acolhedora. São mais de 2 mil aproximações por dia.

Convênios

A Casa Santo André tem dois convênios com a secretaria: um para abordagem e outro para acolhimento provisório, que oferecem serviços básicos desde um banho para uma consulta médica a auxílio para tirar a primeira via dos documentos pessoais. A verba repassada pelo governo serve para custos operacionais, como aluguel e funcionários. Gastos com itens de uso contínuo são arcados pelo próprio local. Com dinheiro de doações, a instituição passa por reforma para ampliar um quarto e ter entradas e saídas que garantam acessibilidade.

Hoje são seis unidades: duas no Gama, duas em Taguatinga e duas em Sobradinho. Tem 220 vagas, que atendem, separadamente, homens e mulheres. O período de passagem pelas unidades é, inicialmente, de até três meses. No entanto, caso haja necessidade, esse tempo pode ser estendido. O trabalho da Casa Santo André está incluído na política de assistência social do governo, que tem como base a garantia de direitos a pessoas em situação de risco. Dados da Secretaria de Desenvolvimento Humano e Social mostram que cerca de 4 mil cidadãos vivem nas ruas de Brasília. No entanto, esse é um número instável, segundo a pasta.

Semelhante às seis unidades da instituição, existem outras oito entidades conveniadas à secretaria para acolher especificamente idosos e deficientes, por exemplo. Além disso, há três unidades estatais. Junto, todo o serviço de acolhimento institucional atende mais de mil pessoas. Para solicitar acolhida, os órgãos ou entidades que julgarem necessário o serviço devem entrar em contato com a Central de Vagas de Acolhimento, pelo telefone (61) 3223-2656. Lá, um funcionário informará como proceder, considerando o perfil da pessoa que será atendida. 

Já no caso do cidadão que quiser ajudar alguém que vive na rua, é preciso ligar para a Central de Atendimento de Abordagem Social e Emergencial pelo número 0800-8871577, das 8 às 20 horas.

Ajuda adequada

De acordo com Thaís Bento, gerente de Serviço Especializado de Abordagem, da secretaria, o atendimento prestado a esse público não se caracteriza por simplesmente retirá-lo de onde ele vive. “Tudo o que fazemos é baseado no desejo da pessoa, seja para garantir acesso à saúde, à educação ou a qualquer outro tipo de direito.” Para ela, é necessário que quem quiser ajudar procure maneiras adequadas, que não incentivem a permanência dessa população no estado em que se encontra. “Se quiser contribuir, deve evitar doar dinheiro, cobertor ou comida a quem está na rua. É preciso que isso seja doado a uma instituição de assistência social.”

Ainda há dois centros de referência especializados para moradores de rua (Centro Pop) — um em Taguatinga e outro no Plano Piloto —, onde ficam disponíveis espaços para higiene, lavagem de roupas, convivência e acompanhamento especializado por assistentes sociais, psicólogos e educadores sociais. Juntos prestam, em média, 130 atendimentos por dia.

*Nome fictício para preservar a identidade do entrevistado

FONTE: AGÊNCIA BRASÍLIA