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Marinha e comunidade quilombola de fecham acordo sobre demarcação

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A luta centenária pela regularização fundiária da Comunidade Remanescente de Quilombo da Ilha da Marambaia, no Rio de Janeiro, está próxima do fim. Nesta quinta-feira (27), será assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), costurado pelo Ministério Público Federal (MPF), entre os quilombolas, a Marinha – que administra uma base militar na ilha – e o governo federal. O documento assegura a permanência dos atuais 430 quilombolas e a continuidade das atividades militares, além de acabar com as disputas travadas entre as partes na Justiça nos últimos 12 anos.

Um dos principais articuladores do TAC, o procurador Daniel Sarmento explica que, com o acordo, os dois lados tiveram que ceder. A Marinha mantém o cais, fica com todas as áreas de treinamento e continua responsável pelo transporte na ilha, incluindo o de moradores e de visitantes convidados – pois é necessário convite para entrar no local. Já a comunidade terá mais facilidade para receber visitas, atracar os barcos de pesca mais próximos às moradias, reformar e construir casas - o que chegou a ser proibido em decisões da Justiça, a pedido dos militares.

O acordo, que também foi mediado pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), deixa de fora a Área de Proteção Ambiental (APA) Mangaratiba, reivindicada pela comunidade. Os moradores, no entanto, continuam podendo entrar no local e acessar fontes de água doce. “Havia preocupação com a superpopulação da comunidade que prejudicasse o meio ambiente”, explica o procurador. O mesmo cuidado a Marinha deverá ter durante os treinamentos, alerta ele.

O presidente da Comunidade Remanescente de Quilombo da Marambaia, Nilton Alves, comemora o fim do impasse. “O território foi dividido em áreas coletivas e específicas. Eles [militares] ficam com os locais de treinamento. Nós [quilombolas], com as moradias, áreas de plantio e pesca, de onde tiramos o sustento”, disse. Ele acrescenta que o acordo também deixa sob domínio da comunidade áreas históricas, como a antiga senzala. Antigamente, Marambaia servia de entreposto de africanos escravizados, que eram comercializados no Rio, à época capital do império.

A Marinha, por meio de nota, considerou o acordo um marco significativo. Esclareceu que o TAC conciliou três aspectos constitucionais: a titulação da comunidade quilombola, a preservação do meio ambiente e a defesa nacional. A força também se compromete a continuar oferecendo serviços de saúde, educação e transporte, pois a ilha só é acessível por barco.

“De uma certa forma, a presença da Marinha, inibe as grandes traineiras e viabiliza a pesca artesanal por nossos pescadores, que não podem ir muito longe”, acrescenta Nilton.

Para começar a valer, o procurador Daniel Sarmento esclarece que o TAC precisa ser reconhecido pela Justiça. A partir de então, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) tem 270 dias para emitir o título de posse coletiva, que não permite a venda.

O TAC substitui todas as ações entre as partes na Justiça. Em 2002, para garantir a titulação da comunidade, o MPF entrou com ação civil pública. Depois, a Marinha ganhou ações de reintegração de posse. Para o MP, por acabar com as divergências, a medida poderia ser usada para outras comunidades quilombolas, como a do Rio dos Macacos e de Alcântara, que convivem com bases militares da Marinha e da Aeronáutica, na Bahia e no Maranhão.