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Wikileaks: Serra pediu ajuda aos EUA contra Primeiro Comando da Capital

Em 2007, o então governador de SP enfrentou ataques do PCC

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Novos documentos coletados pelo WikiLeaks foram divulgados pela agência A Pública na madrugada desta quarta-feira. Segundo o material veiculado, o ex-governador de São Paulo José Serra teria pedido ajuda aos Estados Unidos para lidar com "facção criminosa", que vinha promovendo ataques terroristas nas redes de metrô e trens.

Assim que assumiu o governo do Estado, em janeiro de 2007, Serra, segundo os documentos do WikiLeaks, procurou o embaixador dos Estados Unidos no Brasil Clifford M. Sobel para pedir orientações sobre como lidar com os ataques, à época atribuídos ao Primeiro Comando da Capital (PCC). Ainda conforme o material coletado, Serra demonstrou muita preocupação com o desenvolvimento do PCC nas cadeias paulistas.

O encontro foi o primeiro de uma série em que Serra buscou parcerias na área de segurança pública, negociando diretamente com o Consulado Geral dos Estados Unidos, em São Paulo, sem comunicar ao governo federal, conforme apontam os relatórios enviados à época pela representação diplomática a Washington, e divulgados agora pela agência A Pública, em parceria com o grupo Wikileaks.

Após tomar posse como governador, a primeira reunião de Serra com representantes dos Estados Unidos, realizada em 10 de janeiro de 2007, é descrita em detalhes em um relatório no dia 17:

"Na conversa, que durou mais de uma hora, Serra apontou a segurança pública como prioridade de seu governo, em especial na malha de transporte público, disse o Estado 'precisava mais de tecnologia do que de dinheiro' para combater o crime e indagou sobre a possibilidade de o DHS (Departament of Homeland Security) treinar o pessoal da rede de metrô e trens metropolitanos para enfrentar ataques e ameaças de bombas", relata Pública/Wikileaks.

Semanas antes, três bombas haviam explodido, afetando o sistema de trens, conforme noticiado à época.

Em 23 de dezembro de 2006, um artefato explodiu próximo da estação Ana Rosa do Metrô. No dia 25, outra bomba explodiu dentro de um trem da CPTM na estação Itapevi, matando uma pessoa, e uma segunda bomba foi encontrada e levada para um quartel. Em 2 de janeiro de 2007, um sargento da Polícia Militar morreu tentando desarmar o dispositivo.

O documento diplomático dizia: "Membros do governo (de São Paulo) acreditam que o Primeiro Comando da Capital (PCC) pode ser o responsável pelos episódios recentes".

Ainda conforme o relatório, o secretário de Transportes Metropolitanos, José Luiz Portella, chegou a entregar uma lista com questões sobre procedimentos adotados nos Estados Unidos e manifestou interesse em conhecer a rotina de segurança do transporte público de Nova York e Washington.

Também participaram desse primeiro encontro o chefe da Casa Civil, Aloysio Nunes Ferreira, o secretário de Segurança Pública, Ronaldo Marzagão, o secretário de Transportes, Mauro Arce, o coordenador de segurança do Sistema de Transportes Metropolitanos, coronel Marco Antonio Moisés, o diretor de operações do Metrô Conrado Garcia, os assessores Helena Gasparian e José Roberto de Andrade.

"Grande fanfarra" no metrô

As conversas sobre as possíveis parcerias entre o governo de São Paulo e os Estados Unidos na segurança da rede de metrô e trens metropolitanos continuaram na semana seguinte, quando Portella se reuniu com o cônsul-geral em São Paulo, o adido do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos (Departament of Homeland Security - DHS) no Brasil e o responsável por assuntos políticos do consulado. O relatório gerado dia 24 de janeiro de 2007 a respeito do encontro na semana anterior diz que o projeto da linha amarela foi lançado em meio à "grande fanfarra".

Portella falou sobre os episódios anteriores de bombas e ameaças no metrô e "respondeu a uma série de questões preparadas pelo adido do DHS sobre a estrutura da rede". O então secretário disse também que depois de reforçadas as inspeções, por causa das ameaças de bomba, mais pacotes suspeitos foram encontrados, e que mesmo "um saco de bananas ou de roupa suja" têm de ser examinados, o que provocava atrasos e paralisações no metrô.

Nesta ocasião, novamente o PCC é mencionado: "Autoridades acreditam que a organização de crime organizado Primeiro Comando da Capital (PCC) pode ser responsável pelos ataques e relatam a prisão de um membro do PCC responsável pelo assassinato de um juiz em 2002".

No final, Portella designou, então, o coronel da Polícia Militar José Roberto Martins e o diretor de Segurança do Metrô Conrado Grava de Souza para dar continuidade à parceria proposta.

Itamaraty

Nos meses seguintes, Serra voltou a se encontrar com representantes dos Estados Unidos e insistir em parcerias para lidar com o PCC, como relata Pública/Wikileaks:

- Em 6 e 7 de fevereiro, Serra conversou com o subsecretário de Estado dos EUA para Negócios Políticos, Nicholas Burns. De acordo com relatório de 1º de março de 2007, falou no encontro sobre a "enorme influência" que a organização tem no sistema prisional no Estado e pediu ajuda, incluindo tecnologia para "grampear telefones". Diante da sugestão de novas parcerias, o subsecretário Burns e o embaixador Sobel ressaltaram que seria importante obter aprovação do governo federal e destacaram que o Ministério de Relações Exteriores, o Itamaraty, "é às vezes sensível quanto a esses assuntos".

O relatório afirma que "o governo estadual talvez precise de ajuda para convencer o governo federal sobre o valor de ter os Estados Unidos trabalhando diretamente com o Estado". Serra disse que ele gostaria de falar com a mídia sobre a necessidade dessa ajuda.

Os documentos, classificados como "sensíveis" pelo consulado, são parte de um conjunto de 2.500 relatórios ainda inéditos e serão apresentados em reportagens ao longo desta semana.