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A crise da representatividade

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A crise mundial do capitalismo que emergiu a partir de 2008 criou uma sensação de incômodo para as instituições democráticas. A observação do economista Luiz Gonzaga Belluzo (“A incivilidade da economia”, Jornal do Brasil de 14/08/2018) é um precioso convite para a reflexão dessa configuração. Segundo ele, “a crise não deve ser relegada às querelas dos economistas”. A globalização da crise expandiu uma onda que fragmentou o campo democrático no mundo ocidental. Nos EUA houve a emergência do Tea Party. Na Grécia, os neofascistas ganharam representatividade no parlamento. A Inglaterra aprovou o Brexit. Os partidos tradicionais foram praticamente pulverizados na França. Para não alongarmos em tantos exemplos, a atual situação política italiana está à beira de uma nova hegemonia da direita extremista.
O Brasil passou por um boom enquanto EUA e União Europeia começaram a perder força econômica. Nos tempos do chamado Milagrinho Brasileiro (2006 – 2010), houve uma significativa queda da desigualdade social, o que fez alguns analistas, equivocadamente, mencionarem sobre a formação de uma “nova classe média”. As camadas subalternas foram mobilizadas pelo incentivo ao consumo num momento de grandes investimentos públicos. Entretanto houve uma descontinuidade dessa política nos anos seguintes.
No livro de Monica de Bolle, “Como matar a borboleta-azul: uma crônica da era Dilma”, observamos o diagnóstico no qual a crise atingiu o país como resultado de sequências de escolhas políticas na área econômica de forma centralizadora. A contribuição dessa leitura deve ser acrescida de profundas interpretações em relação ao custo político da desoneração fiscal e outras medidas. Os descaminhos da política emergiram no momento que se criou uma expectativa de alta inflacionária, o que acabou por dar seus sinais nas manifestações de 2013. A representatividade política foi colocada em “xeque”, porém a velha política não foi nocauteada conforme observamos nas alianças e resultados eleitorais de 2014.
Os desdobramentos da crise econômica se articularam ao processo político como forma de reação à melhoria dos indicadores sociais do país que implica na redução da concentração de nossa renda. As forças conservadoras formaram uma unidade à medida que a inflação dava seus solavancos e o desemprego dava sinais de crescimento. Enquanto isso, o campo democrático não soube se abrir para os novos sujeitos sociais nas organizações partidárias. Assim, a democracia brasileira chegou a um ponto de estar sob a ameaça de uma falsa polarização extremista.
A proposta de desmonte do Estado de Bem-Estar no país vai agravar a precarização da qualidade de vida. Portanto, a qualidade do debate político na campanha eleitoral, que está em curso, precisa estar atenta para a corrosão dos mecanismos articuladores da participação do eleitor brasileiro. As forças democráticas devem reconquistar o eleitor que se afastou do desejo de manifestar seu voto com soluções para seu cotidiano, ou seja, incentivar a organização da sociedade nos bairros como início para superar a crise da representatividade.

* Mestre em Sociologia e professor de História